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O Brasil Contra a Crise

Exaustão do consumo reduz efeito do pacote

Se o carro foi comprado nos últimos dois dias e a nota fiscal ainda não foi emitida, consumidor poderá exigir preço com IPI menor | Elza Fiúza/ABr
Se o carro foi comprado nos últimos dois dias e a nota fiscal ainda não foi emitida, consumidor poderá exigir preço com IPI menor (Foto: Elza Fiúza/ABr)

O pacote de estímulos do governo federal tem aspectos positivos e deve provocar alguma reação na atividade econômica. Mas, segundo economistas consultados pela Gazeta do Povo, seu impacto será mais limitado que o de incentivos semelhantes concedidos a partir de 2008, depois do estouro da crise financeira. A principal razão para isso está na exaustão do modelo de crescimento da economia brasileira, que nas últimas décadas tem sido muito orientado para o consumo – em grande parte, via endividamento das famílias – e pouco para o investimento.

Embora o pacote anunciado na segunda-feira contemple a redução dos juros de algumas linhas de crédito do BNDES voltadas ao investimento, sua principal intenção é empurrar as famílias para as compras – por isso a redução de tributos que incidem sobre a venda de veículos (IPI) e o crédito (IOF) – e, assim, estimular a produção industrial. O problema é que a capacidade do consumidor de tomar (e pagar) novos empréstimos tem diminuído: hoje as dívidas correspondem a mais de 40% da renda anual das famílias brasileiras, segundo dados do Banco Central. Cientes disso, e do crescimento da inadimplência nos últimos meses, os bancos tendem a manter o rigor nas análises de crédito.

"Pacotes assim têm efeitos progressivamente menores. A cada novo pacote, o impacto diminui", diz o economista Cláudio Frischtak, presidente da InterB Consultoria Internacional de Negócios.

Segundo ele, o modelo de crescimento brasileiro gerou uma série de efeitos virtuosos, como a redução da pobreza e a ascensão de uma nova classe média, mas chegou a um ponto de exaustão. "E o pacote do governo não enfrenta isso. Pelo contrário, empurra a situação com a barriga", avalia Frischtak. "Além de boa parte das famílias estar muito endividada, há um ciclo de bens duráveis se exaurindo. Quem comprou carro há pouco tempo não vai comprar outro só porque ficou mais barato."

Outro problema, diz o economista, é que a nova classe média – cujo consumo puxou parte do crescimento recente do país – é muito vulnerável a "soluços" da economia. "Essas pessoas não têm um ‘backup’ financeiro. Se perderem o emprego, dificilmente podem contar com a ajuda dos pais, ou de outro parente, porque geralmente foram as primeiras da família a atingir uma certa condição de consumo."

Méritos

Felipe Queiroz, analista da agência de classificação de risco Austin Rating, considera as medidas do governo paliativas – "o ideal seriam mudanças estruturais, e não mais ‘puxadinhos’" –, mas as vê de forma favorável. Avalia que elas têm o mérito de estimular, ao mesmo tempo, o crédito, a demanda e a produção domésticos num momento em que não há espaço para crescer via exportação, dado o enfraquecimento da demanda internacional.

Para Queiroz, o governo acertou ao mirar o setor automotivo, pois ele tem uma grande "relação intersetorial" e, quando cresce, faz girar vários ramos da indústria e o próprio varejo. Ao contrário de Frischtak e outros economistas, o analista da Austin ainda vê espaço para uma ampliação do endividamento. "Se não houvesse renda e emprego em alta, teríamos um problema. Mas, no momento, creio que as condições macroeconômicas ainda sustentam uma expansão do crédito."

Compra feita antes do novo IPI pode ter preço "atualizado"

Renyere Trovão

Quem negociou o carro zero quilômetro nos últimos dois dias e não teve a nota fiscal emitida pela concessionária antes da queda do IPI poderá exigir da loja o novo preço de tabela. De acordo com Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), entidade que representa as concessionárias, o efeito da redução de IPI anunciada na segunda-feira foi imediato e, conforme acordo entre montadora e governo federal, todos os carros em estoque acabaram refaturados pelas novas alíquotas.

Algumas marcas até sinalizam cancelar notas fiscais já emitidas e faturar novas com o preço reduzido. "Deveremos compensar essa diferença de uma outra forma. Talvez na diminuição no valor das parcelas ou por meio de brindes", adiantou Antônio Carlos Altheim, diretor Comercial da Corujão Veículos, autorizada Volkswagen em Curitiba.

Quem visitar uma das autorizadas da Renault e JAC Motors já poderá sair de lá pagando mais barato. Até o fim da tarde de ontem, elas eram as únicas marcas que haviam divulgado a nova tabela de preços. As demais devem repassá-la aos distribuidores ainda hoje ou, no máximo, até amanhã. Nesse caso, o consumidor que procurar uma revenda nesta quarta-feira poderá fazer a negociação baseada nos novos preços.

Mais barato

A Ford revelou apenas o preço do Ka 1.0, que cairá 10%, de R$ 23.600 para R$ 21.240. Esse porcentual, previsto pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, na segunda-feira, também foi confirmado pela Renault. A média de preços da marca francesa para veículos com motorização de até 1 mil cilindradas – cujo IPI baixou de 7% para zero – ficou próxima de 10%, ou até mais que isso em alguns casos.

O preço do Sandero Ex­pres­­sion 1.0 16V, por exemplo, baixou de R$ 31.950 para R$ 28.720, uma diferença de quase R$ 3.230 ou 10,11%. O valor de fábrica do Logan Authentique 1.0 passou de R$ 28.610 para R$ 25.780, um decréscimo de 9,89%. Já para os carros com propulsores de 1 mil a 2 mil cilindradas, cujo IPI caiu de 11% para 5,5% na configuração flex, a variação de preços na Renault foi de 6,49% a 7,41%.

A chinesa JAC Motors aproveitou a queda do IPI – de 43% para 36,5%, para veículos importados com motores de até 2.0 litros – para reduzir os preços da sua gama entre 5,68% a 6,99%. O hatch J3 sai agora por R$ 34.990, ante os R$ 37.900 da tabela anterior, enquanto o sedã J3 Turin é vendido por R$ 36.990, contra R$ 39.900. Ambos são equipados com motor 1.4.

Descontos

Pelo acordo entre indústria automotiva e governo, além da desoneração da carga tributária, as montadoras também se comprometeram a dar descontos no preço de tabela dos carros. Os automóveis de motor até 1.0, por exemplo, terão redução de até 2,5% sobre a tabela anterior, enquanto os de motor entre 1.0 e 2.0 cairão em 1,5% e os utilitários, em 1%.

Esses descontos vão valer até 31 de agosto, assim como o corte do IPI. Haverá ainda a maior flexibilidade dos bancos na concessão de crédito, como também o prolongando no número de parcelas e a redução do valor da entrada e dos juros dos financiamentos.

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