O emprego cresce na indústria e rouba mão-de-obra do comércio, que está contratando em ritmo acelerado para repor os trabalhadores no momento em que o consumo está em franca expansão. A rotatividade da mão-de-obra do comércio aumentou neste ano especialmente em regiões onde há forte concentração de indústrias automobilísticas, siderúrgicas e sucroalcooleiras, atestam grandes redes de supermercados.
Com salários mais elevados e sem jornada regular de trabalho nos finais de semana e feriados, as indústrias atraem trabalhadores de outros setores.
Em julho, a população ocupada na indústria aumentou 5,8% nas seis principais regiões metropolitanas do País em relação ao mesmo mês de 2007, segundo o IBGE. A taxa de crescimento na indústria supera a registrada na ocupação como um todo no País , que foi de 4% no período. Já no comércio, a expansão foi de apenas 2,3%.
O comércio é tido como porta de entrada para o mercado de trabalho para muitos brasileiros, pois não exige muita experiência e abriga boa parte da informalidade. "Quando a economia melhora, a migração entre empresas e setores aumenta na medida em que as oportunidades de trabalho se ampliam", diz o professor do Instituto de Economia da Unicamp Cláudio Dedecca. " O comércio acaba sendo doador de mão-de-obra para outros setores".
Estudo feito pelo professor a pedido da Agência Estado, com base nos dados da Relação Anual de Informações (RAIS), do Ministério do Trabalho, mostra aumento na migração dos trabalhadores entre setores e empresas de 2003 a 2006 na Região Metropolitana de São Paulo.
De acordo com a RAIS de 2006, a última disponível, 8,8% dos trabalhadores que estavam empregados formalmente no dia 31 de dezembro daquele ano, e também no ano anterior, tinham mudado de emprego e de setor. O resultado de 2006 supera a taxa de migração registrada nos três anos anteriores - 6,2% em 2003; 5,6% em 2004 e 6,6% em 2005, nas mesmas bases de comparação. "Tudo indica que o fluxo de migração entre setores se acentuou em 2007 e hoje é mais robusto do que em 2006", afirma Dedecca.
Pelo estudo, 376,6 mil trabalhadores tinham mudado de empresa e de setor em dezembro de 2006. A indústria está entre os setores que mais tiraram mão-de-obra de outros setores. Cerca de 80,5 mil pessoas que chegaram naquele ano para trabalhar nas fábricas eram egressas de outros setores. Desse total, 31,6 mil vieram do comércio. No mesmo período, o comércio recebeu 62,4 mil trabalhadores de outros setores, dos quais 20,1 mil da indústria No resultado final, o comércio perdeu 11,6 mil pessoas para a indústria.
O que o economista observou nos números da RAIS, as grandes redes varejistas têm constatado na prática. O Wal-Mart, por exemplo, a terceira maior rede de supermercados do País em faturamento, registra aumento da rotatividade da mão-de-obra acima da média da empresa nas cidades onde enfrenta forte concorrência da indústria como empregadora.
"Em Curitiba, a rotatividade dos trabalhadores das lojas é hoje de 50%, enquanto em Porto Alegre, é de 40%", cita o vice-presidente de Recursos Humanos da empresa,Marcos Próspero. A rotatividade média dos trabalhadores da empresa em todas as lojas do País gira em torno de 30%.
No Paraná, a principal concorrente na disputa pela mão-de-obra é a indústria automobilística. No Rio Grande do Sul, a competição se dá entre as grandes redes varejistas locais, as indústrias siderúrgica, têxtil e de máquinas agrícolas. "É um trabalho de enxugar gelo", brinca o executivo, referindo-se ao alto custo de formação de mão-de-obra da rede e a migração para a indústria. Com 72 mil trabalhadores, a Wal-Mart deve abrir neste ano 7 mil vagas com a inauguração de 36 novas lojas. Metade das contratações já foram feitas.
"A disputa por mão-de-obra não está restrita a comércio e indústria", observa Claudia Elisa Soares, diretora-executiva de Recursos Humanos do Grupo Pão de Açúcar, segunda maior rede de supermercados. "Há uma forte competição por trabalhadores entre as próprias indústrias", Com 65 mil funcionários, o grupo deve abrir 9 mil novas vagas este ano.