Governo do PT aposta em propostas para taxar os mais ricos. O Imposto sobre Grandes Fortunas, porém, já foi testado e abandonado em países como Alemanha, Inglaterra, Bélgica, Itália, Holanda e Japão.| Foto: Unsplash
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A necessidade de arrecadar mais impostos para equilibrar as contas públicas tem feito o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, trazer à tona novas e antigas ideias de tributação. Além dos projetos já apresentados e enviados para o Congresso, analistas ouvidos pela Gazeta do Povo acreditam que o governo pode ressuscitar a ideia do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) – uma bandeira histórica da esquerda e de eficácia duvidosa, conforme indicam os exemplos de vários países que abandonaram esse tipo de taxação.

Entre as propostas já apresentadas para a segunda fase da reforma tributária, focada na renda e no patrimônio, estão a tributação de lucros e dividendos, de offshores (aplicações no exterior) e de fundos exclusivos, além da progressividade na tributação de heranças, de competência estadual. Todas as citadas miram os mais ricos, mas também podem afetar a classe média.

"O governo está passando o chapéu em busca de arrendação", diz a economista especializada em contas públicas Juliana Inhasz, do Insper.

O governo necessita, segundo especialistas em contas públicas, de um aumento de R$ 100 a R$ 130 bilhões na arrecadação para zerar o déficit primário até 2024, meta prevista no novo arcabouço fiscal, a ser aprovado pelo Congresso.

Para 2025 em diante, o novo arcabouço fiscal prevê superávits crescentes até chegar a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026, último ano de mandato.

É nesse contexto que representantes da esquerda intensificaram a defesa da criação do IGF. "O PT nunca desistiu da ideia [do IGF]. Agora tem mais uma justificativa", diz o deputado Gilson Marques (Novo-SC), referindo-se à necessidade de engordar os cofres públicos.

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Na terça-feira (8), uma parte das regras para tributação dos investimentos no exterior foi incluída na Medida Provisória 1172/23, que reajusta o salário mínimo e a tabela do Imposto de Renda.

Haddad promete enviar projetos de lei ou medidas provisórias sobre o tema ainda em agosto, mesmo antes da apreciação pelo Senado da primeira parte da reforma, sobre o consumo, já aprovada na Câmara. "O governo tem pressa", diz o deputado do Novo.

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Taxar fortunas é pauta recorrente da esquerda

Apesar de inúmeras tentativas frustradas de implantação, a ideia do IGF nunca saiu do radar dos setores mais à esquerda. A Constituição de 1988 prevê sua implantação por meio de lei complementar. Vários projetos nesse sentido já foram apresentados ao Congresso. O primeiro deles, de autoria do então senador Fernando Henrique Cardoso, no longínquo ano de 1989.

Desde então, parlamentares de esquerda apresentaram inúmeros outros, mas nenhum prosperou. O Psol chegou a entrar com uma ação no STF, argumentando suposta omissão do Congresso em sua instituição, mas o processo foi arquivado. O entendimento é que a Constituição prevê, mas não obriga a existência do Imposto sobre Grandes Fortunas.

O fracasso das tentativas, além da resistência natural do Congresso, se deve ao simples fato de que o IGF não é eficiente para o aumento da arrecadação. Nem a literatura acadêmica nem a experiência internacional conseguiram demonstrar incremento das receitas sem a fuga de capitais para outros destinos.

Alemanha, Inglaterra, Bélgica, Itália, Holanda e Japão estão entre os países que abandonaram essa tributação depois que seus milionários buscaram cidadania em outros países. Mesmo se não o fizessem, Rafael Lima, Gerente Sênior Tax da Mazars, aponta outras dificuldades.

"Os milionários são donos de empresas que geram empregos. Os custos do aumento dos impostos são repassados ao preço final dos produtos, e a sociedade toda paga por isso", diz.

Governo pode recuar, mas mantém ideia em pauta

Além de projetos sobre IGF já rechaçados pelos congressistas, existem outros na gaveta do Senado. O governo poderia reapresentá-los ou elaborar um novo, adequando às necessidades do momento e às dificuldades de aprovação no atual Congresso conservador.

Sem definição sobre a base de apoio no Congresso, por conta dos entraves da minirreforma ministerial, o governo sabe que enfrentará dificuldades para aprovar aumentos de impostos de agora em diante.

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O líder do PT na Câmara dos Deputados, Zeca Dirceu (PR), disse na terça (8) que a bancada do partido pode adira o aumento da taxação de milionários para aprovar as medidas. Mas advertiu que não irá desistir.

"A gente até abre mão, agora, de taxar os milionários. O que não dá para um país com tanta desigualdade não taxar, sequer, os bilionários. Haverá medidas nesse sentido. A Câmara vai cumprir o seu papel”, disse ao jornal "O Globo".

Governo pode criar imposto "mais brando" sobre os ricos

Para Juliana Inhasz, do Insper, além da falta de garantia de aprovação, o governo teria um "alto custo político" ao reapresentar o projeto sobre o IGF. "A probabilidade é que ele apresente um imposto mais brando", prevê.

A economista defende a progressividade dos impostos e acredita que a dificuldade do projeto se deve à subjetividade dos valores e critérios de renda. "Muitas vezes o governo acena com medidas que recaem sobre uma faixa que não é tão rica assim, explica. É uma classe média alta, que já paga muito imposto", explica.

Além disso, segundo ela, essa faixa de renda não está satisfeita com a qualidade dos serviços prestados pelo Estado: "Ninguém gosta de imposto, sobretudo, sem ver retorno".

A economista acredita, no entanto, que a sociedade concordaria com a taxação de faixas verdadeiramente altas, mesmo com sua pouca eficácia.

Governo fala para a base mais radical

A discussão sobre grandes fortunas é defendida no mundo todo pela esquerda como uma forma de combater a desigualdade e promover a justiça social. É um argumento duvidoso, porque nada garante a boa utilização dos recursos arrecadados pelos governos.

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Para Fernando Ulrich, da Liberta Investimentos, é uma discussão meramente ideológica, já que nada parecido com o Imposto sobre Grandes Fortunas vai ajudar o governo a "fechar as contas". "Sem se dispor a cortar gastos, não há como o governo atingir as metas fiscais previstas", avalia.

Ele acredita que o arcabouço fiscal precisará ser revisto em três ou quatro anos, independentemente das propostas a serem apresentadas ou aprovadas pelo Congresso.

"Com o IGF governo está falando para sua base mais radical. É um desejo da esquerda mundial, mais por ideologia do que por resultado ou potencial arrecadatório", analisa.

Para a esquerda, no entanto, a realidade parece importar menos do que os preceitos socializantes de seus ideólogos. Como do filósofo italiano Antonio Gramsci, que orientava os líderes comunistas a substituírem o confisco de propriedade privada à força pela sua tributação progressiva.