Contrariando a robusta demanda por imóveis, escassez ainda é a palavra que rege o setor imobiliário no Brasil. Escassez não apenas de mão de obra e terrenos adequados para construção, mas carência de estatísticas sobre um mercado que, há cerca de cinco anos, apresenta crescimento constante.
Após quase duas décadas em que esteve subvalorizado, o setor imobiliário passa a ter agora a necessidade de consolidar dados estatísticos em nível nacional e contar com indicadores oficiais, tanto de vendas quanto de preços, capazes de permitir prever e avaliar movimentos de estabilização, queda ou alta.
O primeiro entrave para se chegar a dados oficiais, na visão de quem acompanha o setor, esbarra no fato do setor ser formado, em grande parte, por empresas familiares, de porte menor, dificultando a obtenção de números confiáveis.
"No Brasil é muito complexo obter dados com precisão. O processo de levantamento de dados exatos exige ronda nos cartórios --e ainda existe ilegalidade em registros--, além da composição de todos bancos que têm carteira hipotecária", afirma o economista e professor de Finanças Ricardo Torres, da BBS Business School.
Diferentemente de muitos países desenvolvidos, que têm dados sobre a indústria imobiliária muitas vezes fornecidos pelo governo, no Brasil a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) vem buscando consolidar pesquisas dos principais mercados do país. Essas pesquisas, entretanto, são resultado de iniciativas isoladas de sindicatos e associações.
O Secovi-SP, por exemplo, sindicato que representa o setor na capital paulista, divulga mensalmente dados de vendas e lançamentos de imóveis residenciais novos na cidade de São Paulo. Os números, contudo, parecem conflitantes quando se comparam aos resultados das principais construtoras e incorporadoras do país, que têm forte atuação na cidade.
Para o analista Marcos Paulo Fernandes Pereira, da Votorantim, esse tipo de dado acaba por não refletir a realidade das empresas grandes. "São dados muito pulverizados, de associações. Por considerar empresas familiares e menores, representa uma base ruim de comparação para empresas listadas na bolsa e distorce a capacidade financeira das grandes".
Segundo o Secovi, no primeiro semestre deste ano as vendas de imóveis residenciais novos na cidade de São Paulo recuaram 31,3 por cento na comparação com igual intervalo de 2010.
Por outro lado, se considerados os dados divulgados pelas seis construtoras e incorporadoras que integram o Ibovespa, as vendas cresceram 13,6 por cento no mesmo período.
"As pesquisas têm margem de erro muito grande porque dependem de entrevistas com empresas, que podem ter interesses pessoais", acrescenta Torres.
O levantamento do Secovi, que inclui tanto imóveis na planta quanto prontos, depende, de fato, da colaboração das empresas --de todos os portes-- que não são obrigadas a fornecer os números regularmente.
"Imóvel não é um produto padronizado e uma série de fatores, como localização, área útil ou infraestrutura, dificultam as comparações", diz o gerente de economia e estatística do Secovi-SP, Roberto Akazawa. "Não existe nenhuma regra ou lei que determine aos Estados fazer essa medição."
Prova disso é que o Secovi no Rio de Janeiro, uma das capitais com mercado imobiliário mais aquecido, não contabiliza as vendas de moradias mensalmente, como ocorre em São Paulo.
Novos indicadores
A pedido do governo, institutos de pesquisa estão em fase de preparação de dois novos índices para acompanhar a valorização de imóveis residenciais.
Um deles está sendo desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), enquanto o outro vem sendo elaborado por Fundação Getulio Vargas (FGV) e Abecip, que representa as entidades de crédito imobiliário e poupança. Ambos não devem ser lançados antes de 2012.
"A Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) também está em contato com o Secovi para analisar a viabilidade de um indicador nacional para imóveis novos, mas ainda em fase inicial, sem previsão (de lançamento)", afirma Akazawa.
Atualmente, a Fipe divulga todos os meses um índice de preços de imóveis residenciais que considera apenas unidades anunciadas, na maioria usadas, em parceria com o Zap Imóveis. Já a FGV pesquisa a valorização dos imóveis comerciais trimestralmente.
"Essas instituições farão um bom trabalho, pela credibilidade que possuem, mas terão dificuldade em obter dados confiáveis", afirma Torres, que não acredita no lançamento de um indicador nacional oficial para o setor no curto prazo.
"É urgente a necessidade de um índice confiável para nortear o rumo do setor, evitando visões distorcidas e infundadas. Mas isso só vai acontecer com o movimento consolidado das instituições do governo", acrescenta ele.