Você acha que é o dono dos seus dados bancários? A Justiça deverá responder a essa pergunta em uma disputa travada pelo Bradesco contra o GuiaBolso, uma empresa de tecnologia financeira (fintech) que oferece aplicativo para controle de gastos.
O caso levou o Ministério da Fazenda a entrar no processo como parte interessada, temendo que o crescimento de fintechs fique comprometido caso a Justiça decida que o Bradesco pode vetar o acesso aos dados de seus clientes.
Para prestar seus serviços aos atuais 5 milhões de usuários, o GuiaBolso solicita a senha de entrada à conta-corrente do usuário. Com isso, analisa suas movimentações financeiras -salário, gastos e investimentos.
Além de ajudar no controle das despesas mensais, o aplicativo oferece crédito de diversas instituições financeiras. A oferta de investimentos está em fase de testes com a corretora Órama.
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O Bradesco foi à Justiça e alegou que o acesso à conta representa um risco ao sistema de segurança do banco, que se considera guardião dos dados de seus clientes.
O banco se baseia no risco de quebra de sigilo. Afirma que não liberou o acesso às contas, nem foi informado pelos clientes da autorização para o GuiaBolso.
Com o impasse, a Fazenda pediu ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) a abertura de uma investigação contra o banco por suposto abuso de poder dominante. Esse processo está em curso desde julho.
O desentendimento entre o Bradesco e o GuiaBolso começou no final de 2014, quando o aplicativo dava os primeiros passos, o Bradesco considerou investir em sua expansão por meio de um programa de incentivo a startups.
Em troca, o GuiaBolso deveria oferecer aos usuários do app apenas produtos do Bradesco.
Os donos do GuiaBolso rejeitaram a oferta, optando pelo financiamento de fundos de investimento estrangeiros na tentativa de se manter independente.
Segundo pessoas que acompanharam as conversas, a recusa teria provocado a retaliação do Bradesco, que decidiu ir à Justiça em março de 2016.
Não é a primeira vez que grandes bancos investem sobre as fintechs com o objetivo de barrar a concorrência.
No ano passado, por exemplo, o Itaú fez uma oferta pelo controle da XP, corretora que tirou clientes dos bancos por ser um supermercado de investimentos com opções de diferentes instituições financeiras.
O Banco Central vetou a aquisição do controle pelo Itaú, em um sinal de que o governo pretende preservar a autonomia de novos concorrentes do mercado financeiro. O regulador só autorizou a compra de uma participação minoritária na XP.
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Desta vez, na disputa entre o Bradesco e o GuiaBolso, o governo quer que os bancos não tenham a exclusividade das informações de seus clientes -um dos ingredientes mais importantes para o negócio das fintechs.
No parecer que enviou à Justiça, a Fazenda ressalta que os dados bancários pertencem ao cliente e não ao banco. Tanto que enviou dois projetos de lei ao Congresso que dão mais liberdade aos usuários compartilharem seus dados bancários e, com isso, obter vantagens, como taxas de juros mais baixas em linhas de crédito feitas sob medida.
A Fazenda considera que, ao fazer referência à suposta insegurança trazida pelo GuiaBolso, o Bradesco atua contra a concorrência do novo rival em suas áreas de mercado.
Quando a ação foi movida, o GuiaBolso contava com 20% dos usuários que têm hoje. Somente de 2017 para cá, ganhou 1,5 milhão de novos clientes.
Por meio de sua assessoria, o Bradesco afirmou que “bancos são legalmente responsáveis pelo sigilo da movimentação das contas de seus clientes” e, por isso, “tem o dever de zelar pela proteção dos dados sigilosos”.
Para o banco, o contrato com seu correntista prevê que a senha de acesso é de caráter pessoal e intransferível.
O Bradesco informou que, em 2014, o GuiaBolso se inscreveu no programa que identifica startups que possam “ser utilizadas no desenvolvimento de produtos e serviços financeiros” da instituição. Mas disse ter vetado o GuiaBolso no programa por entender que “havia risco de segurança da informação e de quebra de sigilo bancário”.
O fundador do GuiaBolso, Thiago Alvarez, não quis comentar porque o processo corre em segredo de Justiça. Disse apenas que sua plataforma é “absolutamente segura” e acredita que isso será comprovado pela perícia que está em curso.
“Não estamos inventando a roda. Em países europeus e nos EUA o cliente é o dono de suas informações bancárias”, disse Alvarez. Para ele, a discussão na Justiça abre um precedente muito ruim para a expansão das fintechs.
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