Não foram apenas as notícias externas que desvalorizaram o real nos últimos dias. As medidas que o governo tomou nos últimos meses para conter a valorização da moeda brasileira como a cobrança de 1% de IOF sobre o saldo líquido de posições vendidas em dólar futuro, e a própria queda da taxa Selic podem ter potencializado o tombo da moeda brasileira.
"O rali do dólar acontece porque os investidores estão fugindo do risco e por isso eles correm para os EUA. O governo queria que o dólar não subisse, mas agora o problema é outro: o dólar está alto e a inflação vai ter impacto sobre a economia", analisa Mauricio Pedrosa, sócio da gestora de recursos Queluz.
Em "estado de alerta", como definiu ontem uma fonte oficial, o governo pode usar mais armas além daquelas à disposição do Banco Central. Já se especula que, além das operações do BC nos mercados futuro e à vista de câmbio, o governo pode vir a ajustar ou mesmo revogar uma de suas medidas mais polêmicas para conter a queda do dólar a taxação das posições vendidas no mercado futuro de câmbio, decretada em julho. "Remédio" para impedir mais prejuízos aos exportadores, a medida agora joga contra a estabilização da moeda norte-americana e, portanto, é vista como prejudicial ao controle da inflação.
A inflação não deve chegar ao bolso do consumidor na mesma velocidade com que o dólar disparou nas últimas semanas. De acordo com José Pereira da Costa Junior, membro do conselho consultivo do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-PR), o impacto inflacionário vai se espalhar aos poucos. "A farinha importada vai ter preço maior, o preço das commodities pode subir, e isso vai chegar ao consumidor", ressalta.
Costa Junior lembra que o dólar desvalorizado estava ajudando a manter os preços dos produtos em níveis mais baixos, aliviando a pressão sobre a inflação. "Com essa mudança, os produtos importados ficam mais caros e menos competitivos. Os produtores nacionais, que estavam balizando seus preços com base nos importados, agora vão ficar livres para realizar seus reajustes", pondera.
O ex-presidente do BC Affonso Celso Pastore estima que, para cada 10% de queda do real, o índice oficial de inflação do país (IPCA) fica 1,2 ponto porcentual mais alto em um prazo de até cinco meses. O economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, estima um impacto menor: 0,4 ponto porcentual. E o BC, segundo fontes de mercado, trabalharia com 0,3 ponto. Divergências de cálculo à parte, o fato é que o IPCA já está acima do teto da meta (7,23% nos últimos 12 meses, ante o máximo estipulado de 6,5%).