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Finanças

Novo cenário de juros abre espaço para investimentos mais arriscados

 | Marcos Santos/USP Imagens
(Foto: Marcos Santos/USP Imagens)

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) surpreendeu grande parte dos economistas este mês com um corte de juros maior que o esperado. A súbita redução da taxa básica Selic em 0,75 ponto, para 13%, fez com que todos os analistas voltassem às suas calculadoras. A conclusão foi unânime: os juros vão cair mais rapidamente do que se imaginava. Alguns analistas projetam uma Selic a 9% no fim do ano. Para especialistas em investimento, isso significa que acabou o conforto do rendimento de 1% ao mês sem riscos, tão caro aos brasileiros adictos da renda fixa. Enquanto as boas oportunidades em títulos públicos estão ficando escassas, os analistas afirmam que é chegada a hora de avaliar outros tipos de aplicação.

“Se o BC continuar mais agressivo na redução dos juros, aquela parcela do investimento tão concentrada na renda fixa pode começar a ser reduzida. Embora a rentabilidade desse segmento continue relativamente alta, ela perde atratividade, e o investidor deve olhar outras possibilidades”, explica Sandra Blanco, consultora da plataforma de investimentos Órama.

Antes da recente guinada do BC rumo a juros mais frouxos, Sandra recomendava que até 70% do patrimônio do aplicador estivessem investidos em renda fixa. Agora, ela vê esse limite em, no máximo, 50%. Sua recomendação é que a metade restante esteja dividida entre fundos que aplicam em ações (20%) e fundos do tipo multimercados (30%), que podem investir em qualquer tipo de aplicação.

“Os fundos multimercados navegam bem por esse tipo cenário. Contam com especialistas dedicados a explorar as mudanças na curva de juros”, diz Sandra. “Diversificar a carteira com fundos de ações e multimercados entregará maior rentabilidade. Mas muita coisa ainda precisa acontecer. Esse cenário se confirma completamente apenas se o BC baixar bastante os juros, se o governo conseguir implementar as reformas e se o mercado externo não trouxer surpresas ruins”, acrescenta.

Aposta no setor imobiliário

Para Marco Bismarchi, sócio da gestora de patrimônio TAG Investidores, a Bolsa de Valores tende a ficar mais atraente com a Selic menor, especialmente para quem está disposto a aplicar por mais de três anos. Este ano, até quinta-feira, a Bolsa já acumula alta de 6,2%. Um setor no qual os analistas veem impacto positivo direto da queda dos juros é o da construção civil, dependente tanto das condições de crédito quanto da saúde financeira dos brasileiros. Ele já reagiu: o Índice Imobiliário (Imob) da Bolsa, que concentra papéis ligados ao setor, avança 11,26% no ano. A PDG Realty disparou 158% no período, enquanto a Gafisa saltou 29%, e a Cyrela, 17%.

“Vamos entrar em um momento de procura maior por risco. O brasileiro tem sempre como referência na cabeça uma rentabilidade de 1% ao mês. Para atingir isso a partir de agora, não basta ficar seguindo o CDI (taxa de empréstimo interbancária que segue de perto a Selic). Ele terá que buscar também a renda variável”, afirma Bismarchi.

Mas ele ainda vê oportunidades na renda fixa. Embora juros mais baixos deprimam a renda fixa como um todo, quem se antecipa a esse movimento e aposta em títulos prefixados (que pagam juros determinados na hora da compra) e indexados à inflação (juros predeterminados mais a inflação do período) acaba lucrando com o afrouxamento monetário. Isso porque os papéis emitidos antes de os juros caírem se valorizam em comparação aos novos, que pagam menos por terem sido criados em um momento de Selic mais baixa.

“Os títulos um pouco mais longos, como os indexados à inflação vencendo após 2030 e os prefixados com prazo depois de 2021, têm ainda algum prêmio caso o ciclo de queda de juros de fato leve a Selic para abaixo de 10%”, afirma Bismarchi, que vê maior probabilidade de a taxa básica encerrar o ano em 9,5%.

Por isso, para o investidor de perfil moderado ou conservador, Bismarchi recomenda uma carteira diversificada: 25% do patrimônio em títulos do Tesouro indexados à inflação (Tesouro IPCA, antiga NTN-B), com prazos mais longos; outros 15%, em títulos prefixados com vencimento a partir de 2021; 20% podem ficar em fundos multimercados, que têm maior liberdade de alocação de recursos e que reagem mais rapidamente a mudanças na economia; 10% podem ser aplicados em Bolsa, mas sempre por meio de fundos de ações; os 30% restantes devem ir para aplicações pós-fixadas.

“O pós-fixado (que acompanha os juros da Selic), embora não ofereça a melhor rentabilidade, é necessário para fazer frente a uma eventual necessidade de liquidez. É uma margem de segurança”, explica Bismarchi.

Isso porque, diferentemente dos prefixados e dos atrelados à inflação, os papéis públicos pós-fixados oferecem risco zero de prejuízo quando resgatados antes do vencimento. Ou seja, se o aplicador precisar de recursos em uma emergência, não terá perdas significativas.

A economia precisa melhorar

Patrícia Pereira, gestora de renda fixa da Mongeral Aegon Investimentos, observa que aplicar em papéis prefixados só vale a pena para quem acredita que o corte da Selic será mais profundo do que indica a chamada curva de juros, que mostra como o mercado tenta prever a Selic no futuro.

“Desde que o BC fez o corte de 0,75, a curva já se ajustou. Olhando agora, o mercado está embutindo cortes que trariam a Selic para 10,25%. Mas se você espera que cairá abaixo disso, há ainda “gordura” para lucrar no prefixado”, diz Patrícia, que também recomenda títulos de vencimento mais longo, que têm mais espaço para se ajustar.

Outro tipo de aplicação que tende a se valorizar com a queda de juros é o fundo de investimento imobiliário (FII). Para Adriano Mantesso e Fernando Crestana, diretores do banco BTG Pactual, a tendência é que os FIIs absorvam investidores da renda fixa. Mas, segundo eles, a retomada da economia vai pesar mais que o corte da Selic.

“O mercado já antecipou essa queda de juros. O que está faltando é a melhora da economia”, afirma Mantesso. Vemos uma recuperação, mas será mais demorada. Ainda não vimos o fundo do poço na receita com locação, por exemplo. Ela só deve começar a se recuperar a partir do segundo semestre.

Mas, apesar de os especialistas afirmarem que é preciso buscar mais risco, vai ser difícil convencer os pequenos investidores a saírem da renda fixa.

“Por mais que a Selic caia, eu ainda vou ganhar mais que na poupança. Busco rentabilidade, mas também segurança econômica”, conta o escritor Alexandre Campos, de 33 anos, que aplica no Tesouro Direto e em Letras de Crédito Imobiliário (LCI). “Já consegui convencer minha namorada e minha mãe de que essa é a melhor forma de guardar dinheiro”, acrescenta.

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