Quem começa a investir em ações espera ansiosamente a valorização do papel escolhido ao longo do tempo, o que significará o aumento do capital aplicado. Mas, além da variação do preço, os investidores ganham também com a distribuição de dividendos, que é uma parcela do lucro dada a todos os acionistas. Olhar o quanto cada empresa distribui do seu lucro é uma estratégia recomendada por analistas a quem está começando na Bolsa de Valores, uma vez que esses papéis costumam ser menos voláteis.
“Montar uma carteira de dividendos é uma boa forma de entrar na Bolsa. O investidor vai garantir uma renda em cima das ações, por conta da distribuição dos dividendos, e, historicamente, essas empresas são menos voláteis”, explica Marco Saravalle, analista da XP Investimentos.
Toda empresa é obrigada a distribuir ao menos 25% de seu lucro aos acionistas. Esse dinheiro pode vir como dividendos (caso em que não há incidência de imposto para o acionista) ou juros sobre o capital fixo (onde há incidência de imposto). A composição dessa distribuição dependerá da política tributária de cada empresa. E já há companhias que são mais generosas e distribuem uma parcela maior, ou seja, o percentual pode ser bem acima dos 25%, recebendo o nome de payout. Em geral, a prática é adotada por empresas consolidadas em sua área de atuação e que não precisam mais fazer tantos investimentos. Dessa forma, é melhor remunerar o portador da ação a deixar o dinheiro em caixa.
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Entre as boas pagadoras, uma que anunciou recentemente mudanças que agradaram os acionistas foi o Itaú Unibanco. Na semana passada, o banco informou que seu payout passaria de 35% a 45%. Os acionistas ficaram satisfeitos, o que ajudou as ações a se valorizarem.
“Mas é preciso ficar de olho nessa carteira. A Vale já foi uma boa pagadora de dividendos. Mas, depois de 2014, com a queda do preço do minério de ferro no mercado internacional, seus resultados foram piorando, e isso se refletiu na distribuição de dividendos da companhia”, ressalta o analista da XP.
Periodicidade da distribuição de dividendos varia
Outra expressão muito utilizada por quem vai montar uma carteira de dividendos é dividend yield. Este é uma relação entre o valor do provento por cada ação e a cotação do papel. Se o dividendo foi de R$ 10 por ação e a ação vale R$ 100, esse índice seria de 10%. No ano passado, entre as ações que fazem parte do Ibovespa, a Cemig foi a que teve o melhor índice, 13,5%. Para 2017, a projeção é que a Metalúrgia Gerdau lidere esse ranking.
Sandra Peres, analista-chefe da Coinvalores, explica que, em geral, são as empresas do setor de energia e outras concessionárias públicas as que mais pagam dividendos. O investimento delas já foi feito, e essas companhias atuam em um mercado regulado, ou seja, não há muito para onde crescer.
As empresas de acúmulo de benefícios, como Multiplus e Smiles, e o setor financeiro também são considerados atraentes por quem gosta de dividendos. A Qualicorp, que faz a gestão de planos de saúde, por ter também uma baixa necessidade de investimento, é outra que distribui boa parte do seu lucro para os acionistas.
A esperada recuperação da economia pode ampliar um pouco essa gama de empresas. Sandra, da Coinvalores, explica que o crescimento significa, em grande parte dos casos, mais receitas e lucro para as empresas, o que pode ser revertido para o bolso do acionista. Isso se somaria à valorização que esses papéis poderão ter. “Os proventos são uma parte do lucro e, quanto maior o lucro, mais dinheiro vai ser distribuído. Se o cenário econômico tende a melhorar, mais empresas serão beneficiadas”, diz Sandra.
Esses dividendos podem ser distribuídos mensalmente, prática comum entre os bancos, ou trimestral, semestral e anualmente. De acordo com Sandra, o pagamento mais constante é uma opção para quem precisa ter uma renda proveniente dos investimentos, já que sempre terá algo “pingando” na conta corrente. Mas, se o investidor não precisar desses recursos para cobrir eventuais gastos, a indicação é usá-los para comprar mais ações.
Oi, um exemplo a não ser seguido quando o assunto é dividendos
Mas, embora essas ações sejam consideradas menos voláteis, elas também apresentam seus riscos. Phillip Soares, analista da Ativa, explica que o fato de uma empresa ter um payout elevado não significa que ela seja a melhor ação em termos de dividendos. Uma empresa endividada e que, ainda assim, decide fazer uma distribuição significativa de proventos aos acionistas pode complicar ainda mais a sua situação. O caso recente mais emblemático é o da Oi.
“Não é porque paga um alto dividendo que é boa. É preciso estudar como é a gestão de caixa dessa empresa, se ela tem condições de pagar tudo isso. A Oi já foi uma das grandes pagadoras de dividendos, e isso mostrou que não foi bom para as perspetivas de longo prazo da companhia”, explica Soares.
Victor Mizumoto, analista de investimentos da Spinelli Corretora, tem a mesma avaliação e acrescenta que, para algumas empresas, mesmo sem dificuldades de caixa, o melhor é não distribuir fatias tão grandes do lucro. Ele cita o exemplo da americana Apple, a fabricante do iPhone. “É uma empresa que, ao reter o lucro e investir no negócio, consegue gerar muito mais dinheiro, e, assim, suas ações se valorizam cada vez mais. É melhor que ela não distribua muitos dividendos. Mas, quando você olha para as empresas de energia, elas têm as tarifas controladas e poucas opções de investimento, então é natural que paguem mais ao acionista.”
Com relação às perspectivas para este ano, Mizumoto lembra que as empresas, devido à recessão, estão com uma capacidade ociosa elevada, ou seja, produzindo abaixo de sua capacidade. Quando a economia voltar a crescer, elas não precisarão investir de imediato. Com maior produção e vendas, sem expansão do parque produtivo, o lucro deve ser maior. Ou seja, em tese, os dividendos podem subir. No entanto, muitas companhias ainda têm dívidas elevadas, o que pode levar o Conselho de Administração a barrar grandes aumentos na distribuição de dividendos.
“A maior parte das empresas está muito endividada, então aumentar os dividendos é algo complexo. Isso pode ocorrer nos casos das empresas que não precisam de investimentos e também estão pouco alavancadas, ou seja, com pouca dívida”, explica Mizumoto.