Brasil é sócio antigo
O acordo que levou à criação do FMI foi assinado em julho de 1944, em um luxuoso hotel em Bretton Woods, região montanhosa do estado de New Hampshire, nos Estados Unidos. O Brasil estava entre os 44 fundadores, todos aliados de EUA e Grã-Bretanha na Segunda Guerra. Desde então, o país teve sua política econômica influenciada pelo Fundo.
A má fama do FMI está atrelada às estratégias de estabilização que impôs em seus acordos, mas a verdade é que o Brasil nem sempre foi um aluno aplicado. Em 1958, o país tomou o primeiro empréstimo para, no ano seguinte, romper com a instituição. Novos contratos foram assinados na década de 60, mas sem retirada de dinheiro. Nos anos 80, quando veio a crise da dívida, os acordos foram suspensos porque o Brasil não cumpria o que assinava. Até que veio um rompimento, em 1987, que durou uma década.
O cumprimento das metas só foi perseguido após uma crise que atingiu a Ásia e a Rússia. Em 1998, o país tomou US$ 41 bilhões para estabilizar o câmbio, o que não evitou a maxidesvalorização de 1999. Quando o país começava a se recuperar, em 2001, uma nova crise global, seguida pela tensão nas eleições presidenciais de 2002, levaram o Brasil de volta ao Fundo. Nos dois anos, mais US$ 45 bilhões foram liberados. No começo de 2006, a dívida foi quitada.
A ajuda do Fundo foi necessária para que a economia fosse estabilizada, mas alguns erros de avaliação foram negativos para o país. O maior foi o aval para que o Brasil tomasse empréstimos de bancos privados na década de 70, o que desembocou no calote da dívida. Nos anos 90, o FMI também demorou para entender que o câmbio fixo era insustentável.
Nos últimos cinco anos, o Fundo Monetário Internacional (FMI) caiu no esquecimento. Não tinha para quem empurrar suas linhas de crédito, foi obrigado a vender 400 toneladas de ouro para pagar as contas e ainda demitiu funcionários. Lideranças de países emergentes, incluindo o Brasil, pressionaram para que a instituição fosse reformada, em uma discussão que beirou a irrelevância. A crise veio e, com ela, os bons tempos do Fundo parecem estar de volta. Três países Islândia, Ucrânia e Hungria fecharam empréstimos bilionários para evitar o colapso de seus sistemas financeiros. A diferença para pânicos anteriores é que o FMI terá de mudar para manter a influência.
Dois sinais de mudança de postura foram vistos nos últimos dez dias. Os três empréstimos liberados tinham valores muito acima do que as regras da instituição permitem e não trazem grandes exigências em um primeiro momento. A burocracia do Fundo foi rápida em anunciar a ajuda e parece flexível o suficiente para não sufocar os novos credores com suas condições. Na última quinta-feira veio outro anúncio: uma nova linha de crédito de curto prazo será oferecida para países com boas políticas monetárias, incluindo o Brasil. Nesses casos, o dinheiro sairá rapidamente, em contratos de até nove meses e com poucas demandas.
"Ficou claro nos últimos dias que a inexistência do Fundo neste momento seria pior, mesmo com os problemas que ele tem", afirma o economista Paulo Baía, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). "Como não existe um governo mundial, o FMI ainda tem uma posição importante na reação aos efeitos de crises financeiras." O Fundo tem a capacidade de canalizar recursos para seus 185 países-membros e, em tese, pode ajudar na criação de políticas que coordenem a superação de uma crise global.
A capacidade de mobilizar recursos está sendo colocada à prova neste momento. O FMI tem pouco mais de US$ 200 bilhões para oferecer. É pouco para uma turbulência cujo custo está na casa dos trilhões de dólares em ajuda estatal. Os ataques contra moedas enfraquecidas demandarão mais dinheiro. Logo, o Fundo terá de bater à porta dos países com dinheiro de sobra no caixa, como China e Japão.
Só os três empréstimos liberados até agora já somam US$ 35 bilhões e a lista de países em dificuldades é grande. A região com mais problemas é o Leste Europeu. Após o fim dos governos comunistas, no começo dos anos 90, as nações do lado de lá da cortina de ferro passaram por reformas que levaram ao surgimento de economias de mercado algumas delas, como a República Tcheca e a Eslovênia, indo muito bem e se aproximando do nível de renda de países ocidentais, como Grécia e Portugal. Neste processo, o capital estrangeiro foi fundamental.
"As economias do Leste são mais vulneráveis porque ainda estão em transição. Elas precisavam de capital para modernizar a infra-estrutura e suas indústrias, para treinar a mão-de-obra e alimentar o sistema financeiro", diz o economista Paulo Haddad, diretor da consultoria Phorum e ex-ministro da Fazenda. "No geral, essas economias estavam indo na direção certa e a operação de socorro tenta evitar um retrocesso." O risco maior é um desmoronamento político que enfraqueça o apelo da democracia.
Idéias
Se tem chances de passar como mobilizador de recursos, o FMI tem mais problemas para se manter como fonte de políticas para lidar com as crises. É fato inegável que o Fundo não fez nada, além de alguns relatórios inócuos, para evitar a crise atual. Agora, vai estipular as condições para quem procurar por suas linhas de crédito. "Por enquanto, o Fundo tem sido menos exigente que nos anos 90", diz o economista Nilson Maciel de Paula, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR). "Nas crises anteriores, ele pedia ajustes fortes e rápidos que eram um receituário válido para todos", completa.
Os efeitos do receituário básico do FMI tiveram resultados variáveis. A maior crítica foi na ação durante a crise asiática, quando países que precisavam resgatar seus bancos foram obrigados a cortar o gasto público. No Brasil, a instituição balizou um modelo de estabilização que deu parcialmente errado o câmbio fixo , mas tem o mérito de ter colocado o equilíbrio dos gastos no topo da agenda do país.
Que não se espere algo de muito novo desta vez: na Islândia, os juros dispararam, enquanto na Hungria já se fala em corte de déficit público. Se der certo, o FMI sairá fortalecido para liderar uma reforma no sistema financeiro global.
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