A crise financeira internacional é a principal sombra que paira sobre o Fórum Econômico Mundial, com abertura prevista para a próxima quarta-feira (28).
Segundo analistas ouvidos pelo G1, a turbulência financeira a mais grave desde a Grande Depressão dos anos 1930 deve dominar o encontro, que reunirá personalidades econômicas e políticas na cidade suíça de Davos.
"O encontro deve ser totalmente focado na crise", diz André Nassar , diretor-geral do Instituto de Estudo do Comércio e Negociações Internacionais (Icone).
"O momento em que acontece essa reunião é interessante, porque estamos mergulhados numa crise que ainda não tem um contorno definitivo. Em que ponto estamos, até onde vamos chegar e como tudo isso se normalizará? Esses temas poderão ser mais esclarecidos", concorda Roberto Teixeira da Costa, conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
"O fato de a reunião acontecer logo após o agravamento de uma crise mundial é importante. Durante muitos e muitos anos, Davos foi uma espécie de glorificação da globalização mundial, que agora passa por um questionamento", analisa Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda e ex-secretário-Geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad).
"Ele tem potencial para ser um dos fórums mais importantes da história, porque terá que discutir a situação das grandes instituições financeiras internacionais", diz Mário Marconini, diretor de Negociações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
"O que acho que pode emergir como consenso é que os governos precisam atuar no mercado, como já estão atuando. Talvez a principal conclusão do encontro seja a de que é preciso mesmo colocar dinheiro na infraestrutura e nas áreas que gerem demanda, movimentem a economia", afirma Marconini.
Crise perfeita
Para Teixeira, do Cebri, o encontro ganha importância à medida que aumenta o que ele chama de "crise perfeita".
"Os consumidores não consomem, os bancos não emprestam, os investidores não investem e, no meio disso, o governo fica que nem barata tonta. Frente a isso, é importante discutir saídas", diz.
Segundo ele, o centro da crise ainda está no sistema financeiro, ou, mais especificamente, nos bancos.
"Temos várias indicações de que problemas aparentemente já resolvidos, como a situação dos bancos, ainda estão presentes.É como se vários cadáveres sepultados se levantassem e dançassem na nossa frente, mostrando que ainda estão bem vivos. Davos vai ter que discutir essa questão, obrigatoriamente", afirma.
Presenças e ausência
Para participar dessas discussões, haverá alguns peso-pesados entre os participantes do evento, como Jean-Claude Trichet, presidente do BC europeu, e Ban Ki-moon, secretário-general da Organização das Nações Unidas (ONU).
Também devem participar Pascal Lamy, diretor da Organização Mundial do Comércio (OMC), Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, além de políticos como o primeiro-ministro chinês Wen Jiabao, seu colega russo Vladimir Putin e o inglês Gordon Brown. A chanceler alemã Angela Merkel e o primeiro-ministro japonês Taro Aso também deverão estar presentes.
No entanto, o encontro terá também algumas ausência notáveis. A mais sentida deverá ser a do novo presidente dos EUA, Barack Obama, que não tem presença prevista no evento, segundo os organizadores do Fórum Mundial.
A delegação norte-americana deve ser representada por Lawrence Summers, conselheiro econômico de Obama, e por outros nomes como o do ex-presidente Bill Clinton e do ex-vice Al Gore.
Outra ausência deverá ser a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo a Presidência da República, até a última sexta-feira (23) não estava prevista a participação de Lula no evento. Ao invés de Davos, Lula deverá estar em Belém, onde participará do Fórum Social MUndial.
Na Suíça, a comitiva brasileira será encabeçada pelo chanceler Celso Amorim e pelo presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles. Quem também deve comparecer é o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB).
Reformas financeiras
Outro tema que deverá ser discutido no evento é a reforma de instituições globais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.
A idéia, já discutida nas reuniões do G20 - grupo que reúne países ricos e em desenvolvimento - é aumentar a representatividade das nações emergentes, de modo que essas organizações ganhem mais força para tomar medidas de alcance global contra a crise.
"Uma das coisas que deverão ser discutidas é a nova arquitetura do sistema internacional. Mas acho que, enquanto a hemorragia do sistema financeiro não acabar, não adianta falar em nova arquitetura. É como se a sua casa estivesse em chamas, e você estivesse conversando com o arquiteto para ver qual seria o novo desenho dela", compara o conselheiro do Cebri.
Também podem acontecer encontros para avançar nas negociações da Rodada de Doha as discussões para facilitar o comércio mundial, que se arrastam há vários anos sem chegarem a uma conclusão.
"Esse é um dos temas favoritos do (Celso) Amorim. Com certeza ele será discutido", diz Nassar.
"Davos é tradicionalmente um ponto de discussão nessa área. O próprio ministro do Comércio indiano já declarou que quer aproveitar Davos para negociar Doha, tentando negociar um acordo até o final do ano", concorda Ricupero.
Importância para o Brasil
Para o Brasil, a importância da reunião está na oportunidade de tentar provar que o país está em situação menos vulnerável que a maioria dos demais para enfrentar a crise.
"Nós dependemos muito do crédito externo. Se nessa reunião conseguirmos melhorar a imagem que os bancos internacionais têm de nós, podemos conseguir reativar tanto os investimentos estrangeiros quanto as linhas para investidores nacionais", diz Nassar.
"Num evento como esse, é importante que o Brasil tenha um reconhecimento de que ele se tornou muito mais maduro, que está razoavelmente bem na foto apesar da crise", concorda Marconini.
"Também podemos aproveitar para mostrar aos representantes do novo governo americano que podemos ser uma parceiro importantíssimo na busca por novas matrizes energéticas, como vem sendo ressaltado pelo Obama", diz.
No entanto, os analistas ressaltam que, mesmo com a importância das discussões, o Fórum pode terminar sem o anúncio de medidas concretas.
"O Fórum é uma oportunidade de debate entre pessoas da área do governo, economistas e empresários. Mas não tem as características de um fórum decisório. O principal palco para medidas conjuntas deverá ficar para o próximo encontro do G20 em Londres, marcado para março", analisa Ricupero.
"Das reuniões anteriores que eu participei, as pessoas saíam com a maior boa vontade, cheias de propostas. Mas nada se transformava materialmente em coisas concretas. Vamos ver se desta vez será diferente", diz Teixeira.
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