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Fundador do Megaupload vai de preso a herói

 | Ilustração: Marcos de Mello
(Foto: Ilustração: Marcos de Mello)

No mês passado, Ben Gracewood, um desenvolvedor de software da Nova Zelândia, respondeu a uma postagem no Twitter do magnata da internet Kim Dotcom, fundador do site de compartilhamento de arquivos Megaupload, retirado do ar pelo FBI em janeiro.

Ele perguntou se "o que vocês fazem é andar em veículos elétricos modificados e posar para fotos", se referindo a uma imagem que Dotcom, de 38 anos, havia acabado de publicar, que mostrava três de seus sócios em carrinhos de golfe e uma Segway. "Eu poderia muito bem viver assim também", escreveu Gracewood.

Vinte minutos depois ele recebeu uma resposta surpreendente: "Vem para cá agora!". Então, ele pegou um amigo e foram para a casa mais cara do país – uma mansão no valor de 30 milhões de dólares neozelandeses, ou US$ 24 milhões, alugada por Dotcom, um cidadão alemão – para nadarem na piscina e comerem cupcakes. Usuários do Twitter de toda a Nova Zelândia assistiram fascinados ao grupo postando atualizações e fotos da visita.

Aquela noite, que teve continuidade no Twitter sob a "hashtag" #swimatkims ("nadando na casa do Kim"), foi apenas o mais recente de uma série de acontecimentos bizarros num caso que transformou Dotcom em uma espécie de herói desde que foi preso.

Em janeiro, dois helicópteros da polícia aterrissaram em seu quintal para uma batida policial na propriedade, localizada ao norte de Auckland. Naquela época, a maior parte do país sequer havia ouvido falar de Dotcom, apesar de sua riqueza e seu estilo extravagante. Durante os dois anos em que ele vinha morando neste país de 4,4 milhões de habitantes, ele manteve uma postura discreta.

A operação da polícia – executada sob o tratado de extradição que a Nova Zelândia mantém com os Estados Unidos – parecia ter sido planejada para chamar atenção. Ela foi acompanhada por comunicados estranhamente detalhados descrevendo a operação, incluindo o modo como os oficiais arrombaram a entrada de um quarto do pânico para prender Dotcom, que, segundo eles, foi encontrado sentado próximo a uma espingarda.

Dotcom – nascido Kim Schmitz e também conhecido como Kimble ou Kim Tim Jim Vestor – e três outros homens ligados ao Megaupload foram presos por conta de acusações dos EUA que envolviam violação de direitos autorais e lavagem de dinheiro.

Entre os itens apreendidos pela polícia em janeiro estavam 18 veículos de luxo no valor de 6 milhões de dólares neozelandeses – incluindo um Rolls-Royce Phantom Drophead Coupé e um Cadillac rosa ano 1959 –, computadores e cerca de 11 milhões de dólares neozelandeses em espécie.

Mau trato

Dotcom disse numa entrevista por e-mail que tem sofrido maus tratos pela polícia e governo neozelandeses, que ele acredita estarem simplesmente se dobrando às exigências dos EUA.

"Dois helicópteros e 76 oficiais fortemente armados para prender um homem acusado de crimes contra direitos autorais – pensem nisso", ele escreveu. "Hollywood está importando seus roteiros de cinema para o mundo real e envia forças armadas para proteger seu modelo de negócios ultrapassado".

Em fevereiro, a polícia de Nova Zelândia defendeu a operação, dizendo estar de acordo com a avaliação de risco e que havia somente "20 ou 30" oficiais envolvidos na batida na mansão.

Após um mês preso, Dotcom teve seu pedido de fiança concedido, apesar dos argumentos dos advogados de acusação de haver sérios riscos de fuga do réu.

Gavin Ellis, palestrante veterano sobre estudos políticos da Universidade de Auckland, disse que, com o tempo, o público tem dado cada vez menos apoio à operação policial que prendeu Kim Dotcom .

"Teve uma reação meio do tipo ‘vejam só’, inicialmente. ‘Nossa! Olhem o que a polícia fez, eles pegaram esse tal mestre do crime’", disse Ellis. "Mas, depois, conforme a percepção e a representação de Kim pela mídia foram mudando, essas coisas todas, em retrospecto, começaram a parecer exageradas".

Enquanto os advogados de Dotcom estão conseguido grandes progressos nos tribunais, Doctom tem ganho os favores do público. Uma manchete no site de notícias Stuff.co.nz em maio dizia, "Dotcom ganha os neozelandeses no papo". "Houve uma mudança clara na sua caracterização, de uma criminalidade presumida ou suposta, a herói", disse Ellis.

Falando por e-mail na segunda-feira passada, Dotcom disse que ele era um "personagem romantizado", mas disse que não buscava fama ou notoriedade. "As pessoas da Nova Zelândia receberam a mim e à minha família muito bem", ele escreveu. "Eles sabem que eu fui tratado de modo injusto. Eles sabem que o governo da Nova Zelândia faz tudo para agradar os Estados Unidos".

"Eu costumava respeitar os Estados Unidos e o sonho americano", ele disse. "Agora eu considero os Estados Unidos a maior ameaça à liberdade na internet e à paz no mundo". Até recentemente, Dotcom havia sido proibido de utilizar a internet sob as suas condições de fiança.

Após o tribunal lhe conceder o direito ao acesso on-line, ele começou a utilizar o Twitter em 19 de junho, ganhando mais de 46 mil seguidores em apenas 2 semanas. John Key, primeiro ministro da Nova Zelândia, tem cerca de 52 mil.

Dotcom se tornou um usuário prolífico de redes sociais, publicando fotos de sua família e ridicularizando a operação da polícia e o processo jurídico contra ele.

Ele também utilizou o Twitter e suas novas e mais frouxas condições de fiança para aumentar seu perfil público, publicando fotos de si mesmo num show, na apresentação de um programa de televisão e participando de uma marcha para protestar contra o fechamento de um canal de televisão financiado pelo estado.

Quando lhe perguntaram por que ele havia se tornado tão ativo on-line, Dotcom disse que estava utilizando o modo mais eficiente para responder a todas as mensagens de boa vontade que ele havia recebido.

No dia após a "hashtag" #swimatkims, Dotcom disse numa postagem do Twitter que o evento voltaria para "todo mundo". "Preciso de uma grande piscina pública", ele disse. "Um DJ legal. Som & iluminação. Quem topa?".

Tradução: Adriano Scandolara.

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