Última fronteira da mineração mundial, o fundo dos oceanos esconde uma infinidade de riquezas ainda pouco exploradas pelo homem. Nos últimos anos, um grupo restrito de países e empresas privadas começou a estudar a viabilidade econômica da atividade. Áreas submersas com potencial de exploração estão sendo reivindicadas na Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (Isba, na sigla em inglês), órgão ligado às Nações Unidas e responsável pela administração de águas internacionais.
No início de julho, o Brasil recebeu permissão da Isba para prospectar uma área de 3 mil quilômetros quadrados no chamado Elevado Rio Grande, uma montanha submersa situada no Atlântico Sul, a 1.500 quilômetros da costa brasileira. Nos próximos 15 anos, o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) vai aprofundar os estudos sobre as jazidas no local e o possível impacto ambiental da retirada desses minérios.
No cenário atual, a demarcação de territórios submarinos é mais um movimento político do que econômico. Apesar do imenso potencial, a mineração em águas profundas é uma atividade incipiente existem apenas algumas experiências no Oceano Pacífico, com a exploração de nódulos de manganês. Mas, para especialistas, não há dúvidas de que a necessidade industrial e tecnológica por matérias-primas tornará a atividade viável em um futuro não muito distante.
"Uma hora os bens minerais em terra vão acabar e eles não serão repostos [pela natureza]. Os países vão precisar explorar o fundo do mar. Daí a necessidade de se fazer pesquisas. Hoje há um total desconhecimento, porque industrialmente nunca foi feito", afirma o geólogo João Carlos Biondi, professor doutor da Universidade Federal do Paraná. "A pesquisa é importante para aferir a potencialidade econômica. A forma como esses minérios estão determinará a viabilidade da exploração", diz Marcos Vitor Fabro Dias, geólogo e diretor técnico da Mineropar.
Urgência
Segundo eles, a demanda de cada país determinará se a atividade em alto-mar ocorrerá em curto, médio ou longo prazo. "O Japão, por exemplo, não produz nenhum bem mineral. Eles importam tudo. Já o Brasil está muito bem, não tem uma necessidade imediata", diz Biondi, que é autor do livro Processos Metalogenéticos e os Depósitos Minerais Brasileiros.
O pesquisador Eugênio Frazão, do Departamento de Geologia e Recursos Minerais do CPRM, explica que o interesse econômico no Elevado Rio Grande se concentra em crostas de cobalto e sulfetos polimetálicos, que podem conter ferro, níquel, manganês e cobre, todos com alto valor comercial. Também foram detectadas concentrações de fosfato, usado como fertilizante. "A autorização da Isba nos permite ampliar as pesquisas no Alto Rio Grande. Só depois de aprofundar os estudos, poderemos pedir uma permissão de explotação [retirada do minério]", explica ele, que esteve pessoalmente no local com um grupo de pesquisadores brasileiros e japoneses no ano passado.
Pacífico vai abrigar primeira mina submarina em breve
A primeira mina do mundo no fundo do oceano está prestes a se tornar realidade, segundo informações da BBC. A empresa canadense de mineração Nautilus concluiu um acordo com o governo de Papua Nova Guiné para começar a minerar uma área no "assoalho" do Oceano Pacífico.
A empresa ambiciona extrair minérios de cobre, ouro e outros metais valiosos de uma profundidade de 1.500 metros. Chamada de Solwara-1, a mina será escavada por uma frota de máquinas robóticas controladas a partir de um navio na superfície. O plano consiste em quebrar a camada superior do fundo do mar de modo que o minério possa ser bombeado para cima como uma lama.
Para quebrar as rochas e raspar o fundo do mar será empregada a maior máquina da mina, um triturador pesando 310 toneladas, que trabalhará 24 horas por dia.
Recuperação
De acordo com a Nautilus, a mina terá um impacto ambiental mínimo, o equivalente a cerca de dez campos de futebol e com foco em uma área que é suscetível de ser rapidamente recolonizada pela vida marinha.
Terras raras
Aproximadamente 97% das chamadas terras raras estão na Ásia, especialmente na China, que detém 2/3 das reservas globais e 87% do total comercializado no mundo. O geólogo João Carlos Biondi é pessimista quanto à presença relevante de terras raras no Elevado Rio Grande, embora as pesquisas feitas no local tenham apontado indícios disso. "Não há informação de que as reservas sejam grandes o suficiente para serem exploradas economicamente. A concentração é muito baixa."
Exploração deve ocorrer com auxílio de equipamentos de sucção
Os próximos estudos no Elevado Rio Grande devem determinar o tipo de tecnologia que será empregada na extração comercial dos metais. "Se o minério estiver associado à rocha, aí vai ser como na mineração convencional, muito mais dificultosa, porque vai ter que tirar a rocha, moer e retirar só aquilo que interessa", explica o geólogo Marcos Vitor Fabro Dias, da Mineropar.
Se o material estiver solto no "assoalho" do elevado, o mais provável é que a extração seja feita por sucção. "Uma draga literalmente aspira esse material por um tubo até a superfície", diz João Carlos Biondi, da UFPR. "É a técnica ideal do ponto de vista econômico porque o custo é baixo e evita detonação, galerias e pessoas lá embaixo", completa o professor, que descarta qualquer vantagem competitiva ao Brasil pelo fato de o país dominar a tecnologia de exploração de petróleo e gás em alto-mar. "A gente parte do zero no caso da mineração", opina.
Biondi também não acredita na participação de empresários nos estudos de viabilidade econômica. "A iniciativa privada do Brasil não tem arrojo e nem recurso financeiro para isso. Nesse momento, é o dinheiro dos contribuintes que vai financiar a presença brasileira no Alto Rio Grande".
Impacto ambiental é desconhecido, mas previsível
O mundo tem tecnologia e recursos financeiros para financiar a empreitada em alto-mar. O maior obstáculo é ambiental. "Não se sabe com certeza qual será o impacto ao ecossistema marinho até porque são poucos os estudos. Aliás, conhecemos pouquíssimo sobre a fauna e a flora nesse ambiente", diz o geólogo João Carlos Biondi.
Segundo ele, é fácil presumir os impactos mais imediatos. "Haverá um ataque direto às formas de vida existentes e uma destruição do assoalho oceânico no local da lavra", afirma ele, que antecipa ainda outro problema. "O lodo gerado na extração provavelmente vai ser jogado de volta no mar, mas na superfície. Não podemos esquecer que 95% da vida marinha vive na faixa até 50 metros de profundidade, a chamada zona fótica." O pesquisador Eugênio Frazão, do CPRM, diz que existem áreas "ambientalmente sensíveis" no local. "O impacto pode ser de médio, longo ou curto prazo, mas hoje não sabemos determinar com precisão. A partir de agora vamos fazer um zoneamento, ver quais são as espécies, e obter mais informações." Para Biondi, a questão mais desconfortável é não saber quanto tempo será necessário para o ambiente marinho se recuperar. "Só mesmo a experiência vai nos dizer", diz.
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