O voto favorável à manutenção da taxa básica de juros na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que aconteceu nos dias 18 e 19, fortaleceu Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária, à sucessão da presidência do Banco Central (BC). A decisão unânime do colegiado interrompeu a trajetória de quedas da taxa Selic, iniciada em agosto do ano passado, apesar das pressões exercidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo Partido dos Trabalhadores.
Analistas consideram que a resistência de Galípolo aos apelos políticos contribui para que Lula se sinta mais a vontade para indicá-lo, sem reações por parte dos agentes financeiros.
Apesar de ainda não ter batido o martelo, o presidente da República disse, nesta quinta, que o atual diretor de Política Monetária do BC é um "menino de ouro" e tem plenas condições de comandar a instituição. O mandato do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, termina em 31 de dezembro.
"Quando o [Gabriel] Galípolo vota com os demais, mantendo a questão técnica acima da questão política, reforça essa questão da autonomia do Banco Central que é algo importante para o próprio presidente [Lula]", diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
A unidade do Copom em junho foi recebida com alívio pelo mercado, após a decisão dividida da reunião de maio, quando os cinco indicados pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) votaram a favor de um corte de 0,25 ponto percentual, enquanto os quatro nomeados por Lula queriam um corte maior, de meio ponto percentual. A decisão gerou ruídos sobre interferência política nas votações do comitê.
Uma nova divergência contribuiria para desancorar ainda mais as expectativas de inflação, comprometendo a credibilidade do BC e levando a um aumento nas taxas de juros de longo prazo.
Galípolo é favorito no BC, mas tem concorrentes
Conselheiro da campanha presidencial em 2022, Galípolo ocupou a secretaria-executiva do ministério da Fazenda, sendo o "número dois" de Fernando Haddad antes de assumir o cargo no BC. Desde então, segue tendo canal direto de interlocução com Lula.
O favoritismo, no entanto, não exclui considerações sobre outros nomes no páreo. As especulações aumentaram após Lula dizer na terça (18), um dia antes da decisão do Copom, que queria alguém "maduro" e "calejado" para o comando da autoridade monetária.
Analistas avaliaram que Galípolo, aos 42 anos, poderia não se encaixar nos critérios. Nesta terça-feira (25), em webinar na Warren Investimentos, Galípolo brincou com a questão. “Por um pequeno momento, quando se levantaram dúvidas sobre o meu nome, sobre maturidade, eu quase fiquei contente, porque eu achei que estavam achando que eu era novo. Já não é mais o caso”, disse .
Na quarta-feira (26), Lula elogiou o diretor do BC, mas confirmou que não tem pressa. “O Galípolo é um companheiro altamente preparado, conhece muito o sistema financeiro, mas eu ainda não estou pensando na questão do Banco Central. Vai chegar um momento em que eu vou pensar, e vou indicar um nome para ser o presidente do Banco Central”, disse ao UOL.
Nomes ligados a políticas heterodoxas e alinhados ao PT, como o do ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, ou do presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, continuam no radar.
Na mesma entrevista, Lula reforçou o temor dos agentes financeiros e disse que "não indica presidente do BC para o mercado" e é preciso "aceitar isso". O martelo não deve ser batido antes de outubro, conforme defende o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto.
Políticos enfrentariam resistência
Analistas consultados pela Gazeta do Povo acreditam que nomes políticos, como o de Mantega, dificilmente passariam pelo escrutínio do Congresso e do mercado. Pela lei de autonomia do BC, os indicados devem passar por uma sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e os aprovados, submetidos ao plenário.
"Por outro lado, [Aloízio] Mercadante tem desempenhado um papel estratégico para o Partido dos Trabalhadores à frente do BNDES", avalia Sílvio Campos Neto, economista sênior e sócio da Tendências Consultoria.
Uma ala do PT, descontente com o alinhamento de alinhamento de Galípolo a Campos Neto, defendeu a indicação do economista André Lara Resende, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e um dos idealizadores do Plano Real.
Lara ganhou holofotes por classificar a proposta de emenda constitucional sobre a autonomia financeira do Banco Central (PEC 65) como "um retrocesso de 70 anos", em audiência pública sobre o tema no Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, em 18 de junho.
O nome é visto como pouco provável. Lara é associado à defesa da Teoria Monetária Moderna (MMT, na sigla em inglês) que desagrada o mercado financeiro e os economistas ortodoxos que consideram inflacionária, podendo levar à trajetória de crescimento explosivo da dívida pública. Seu fundamento é a ideia que os governos que emitem a sua própria moeda nunca vão dar calote na sua dívida porque sempre podem imprimir dinheiro para pagá-la.
"Ele [André Lara] em defendido ideias que são muito questionáveis", avalia o sócio da Tendências. "Sem dúvida, o nome dele assusta e seria visto pelo mercado de forma muito cautelosa. O governo não deveria querer causar tanto barulho".
Nomes alternativos à Galípolo são opções por causa da oposição à independência do BC
Também por conta da audiência sobre autonomia financeira, o economista Paulo Nogueira Batista Jr. entrou na lista. Nogueira, que foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS e diretor executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI), afirmou que a PEC 65 tem inconsistências jurídicas enormes e podem ser questionadas no STF.
O mesmo aconteceu com Luiz Awazu Pereira, ex-diretor de assuntos internacionais do BC e ex-vice-gerente-geral do Banco de Compensações Internacionais (BIS). Sua posição crítica à proposta ganhou repercussão.
Contra Awazu, também pesa o fato de sua participação durante a gestão de Alexandre Tombini, no governo Dilma Rousseff (PT), quando a redução "a canetada" dos juros contribuiu para a maior inflação e recessão que se seguiram.
Mercado sonha com nomes ligados ao setor financeiro
No cardápio de apostas do mercado financeiro, há outros nomes menos polêmicos. Entre eles o do diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos do BC, Paulo Picchetti. Economista respeitado, mestre em Economia pela Universidade de São Paulo (USP) e doutor pela Universidade de Illinois, tem em seu favor a familiaridade com o colegiado do Copom.
Alguns outros "nomes dos sonhos" do mercado também fizeram parte das especulações. Dois deles, ligados ao Bradesco, segundo maior banco privado do país: o do economista-chefe, Fernando Honorato Barbosa, de 45 anos, e o do presidente do Conselho de Administração, Luiz Carlos Trabuco. Seriam quase unanimidades, mas não estão no topo do páreo.
"Acho improvável, sobretudo com o presidente fazendo todo esses discursos recorrentes contra a 'Faria Lima' [alusão ao mercado financeiro]", diz Sílvio Campos Neto.
A tensão sobre a escolha deve ser crescente a partir de agora. Apurações da imprensa dão conta que Lula não quer expor outros nomes, sujeitos a desgaste até outubro.
As atenções também estarão votadas a outros dois nomes para cargos nas diretorias do BC. Em 31 de dezembro, chegam ao fim os mandatos de Otavio Damaso (Regulação) e de Carolina de Assis Barros (Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta).
Com a nova composição, o governo terá sete indicado dos nove diretores do Banco Central, que votam nas reuniões do Copom.
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