O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), afirmou nesta terça-feira que já está sendo investigada a hipótese de o grampo telefônico que flagrou uma conversa entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) ter sido realizado nas instalações da Casa. Neste fim de semana, a revista "Veja" publicou a degravação de conversas entre os dois. Gilmar e Demóstenes confirmaram o teor da conversa que supostamente teria sido gravada por agentes da Agência Brasileira de Investigação (Abin).
Na segunda-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afastou temporariamente a cúpula da Abin , inclusive o diretor-geral da instituição, Paulo Lacerda, e o diretor-adjunto José Milton Campana. A partir desta terça-feira, o secretário de Planejamento, Orçamento e Administração, Wilson Roberto Trezza, responde pela Abin. O presidente também determinou abertura de inquérito na Polícia Federal (PF), pedido pelo procurador-geral da República. O diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa, designou o chefe de Divisão de Polícia Fazendária, William Marcel Morad, para conduzir o inquérito. Morad está há cinco anos da PF e, neste curto período, já foi chefe da Divisão de Repressão a Entorpecentes em Pernambuco e do Núcleo de Inteligência no Rio Grande do Norte.
- Já mandei investigar, já ouvi o diretor-geral [Agaciel Maia] e acho que o afastamento temporário da diretoria da Agência Brasileira de Inteligência [Abin], iniciativa tomada pelo presidente da República, foi a providência correta. Foi melhor, para que agora se investigue tudo - disse Garibaldi nesta terça.
Garibaldi solicitou ainda que seja feita uma varredura nos gabinetes dos parlamentares. O diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, disse que é remota a possibilidade do ato ilícito ter sido realizado no sistema de escuta interno do Senado.
- Eu expliquei ao presidente que nossa central fica dentro de uma sala-cofre. Não se pode ter acesso sem deixar registrados ali o login (conjunto de caracteres que identifica quem acessa um sistema computacional) e a impressão digital. É um acesso restrito e altamente identificável. É praticamente impossível a um estranho entrar ali. Todas as vezes que se investigou a hipótese de grampo nesta Casa, constatou-se que a possibilidade disso aqui é remota - afirmou Agaciel.
Garibaldi disse que o Senado deve se esforçar para aprovar o substitutivo que Demóstenes Torres apresentou o projeto do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) para disciplinar com mais rigor esse assunto.
- Agora tem que ter desdobramentos. O Senado precisa agir, precisa aprovar regras definitivas para coibir e punir escuta telefônica realizada sem autorização judicial - disse ainda.
CPI dos Grampos vai ouvir Jorge Félix, a quem a Abin está subordinada
Também nesta terça-feira, será ouvido na CPI dos Grampos o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Jorge Félix, a quem a Abin está subordinada. O convite foi confirmado na segunda, pelo presidente da comissão, deputado Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), que acredita que, nesta tarde, Félix terá condições de explicar se houve participação da agência no caso.
Para Marco Aurélio Garcia, reação do governo foi importante
Também nesta terça, o assessor para Assuntos Especiais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, disse que a reação do governo será importante para esclarecer os interesses que estão em jogo com a produção de gravações ilegais.
- Esse não é o interesse nem do Estado brasileiro, nem do governo e muito menos do Legislativo e do Judiciário. São interesses de quem quer privatizar o Estado. Está claro que esta escuta não foi feita pela Abin, mas pode ter sido feita por membros da Abin. O problema é estabelecermos mecanismos de controle por meio do Executivo e do Legislativo. Com a legislação atual já dá para fazer isso. É fundamental manter o sigilo telefônico, dos Correios e de mecanismos do estado democrático - disse.
Perguntado se os grampos que atingiram o telefone do presidente do STF, Gilmar Mendes, teriam relação com a operação Satiagraha, da Polícia Federal, Garcia preferiu não comentar.
- Isso quem está dizendo é você - limitou-se a dizer ao repórter.
O assessor da presidência também afirmou que, pessoalmente, não tem nenhum medo de ser grampeado.
- O que eu falo em privado pode ser falado em público.Transparência Brasil: Grampos são reflexo de falta de controle sobre Abin
Para o diretor executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, as possíveis escutas ilegais feitas pela Abin são resultado da falta de controle sobre o órgão.
- Fica evidente que não há uma submissão desse organismo a uma supervisão que seja externa à comunidade. Isso pode ser muito perigoso para as instituições porque ela (a Abin) é um órgão de informação que pode usar das suas prerrogativas para ficar perturbando a vida das pessoas - avalia o diretor-executivo da ONG.
Para Abramo, o controle deveria ser feito pelo Congresso Nacional e não pelo Poder Executivo, já que é o próprio presidente que indica o chefe da Agência:
- As atividades de uma agência de coleta de informações, por definição, não são transparentes, mas precisam ser submetidas a limitações - afirma.