"O governo gasta muito, e gasta mal." Não importa quem vença a eleição presidencial, o tradicional discurso da oposição tende a ganhar reforço no ano que vem, ao menos no que se refere à quantidade gasta pela União: as despesas do governo central deverão subir pelo quinto ano consecutivo, atingindo 19,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, segundo projeção da consultoria paulista Rosenberg & Associados. Há nove anos, esse porcentual estava em 15%.

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Boa parte do incremento se dará em despesas que não podem ser eliminadas, caso dos salários do funcionalismo, das aposentadorias e pensões. Para compensar o novo aumento dos gastos, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) prevê que são grandes as chances de que a carga tributária do país cresça pelo quarto ano seguido em 2007, principalmente se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reeleger. Pior para empresas e trabalhadores que contribuem com o Fisco, que novamente terão de bancar essa conta.

Em abril, o governo até incluiu em seu projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) enviado ao Congresso a meta de reduzir as despesas em 0,1% do PIB a cada ano pelos próximos 10 anos. Mas agora, às vésperas das eleições, o Executivo ignorou completamente essa idéia, a julgar pela proposta orçamentária que acaba de preparar – que prevê aumento das despesas em todas as áreas.

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Mesmo se o governo estivesse de fato comprometido em reduzir a sangria, especialistas advertem que o puro e simples corte de gastos não é suficiente. "O ideal é fazer mais com menos, e não fazer menos", diz Caio Marini, professor da Fundação Dom Cabral e pesquisador do Instituto Publix. "Quando o governo faz ajuste fiscal sem critério, reduz ainda mais a qualidade de seus serviços."

Para o economista Otávio Aidar, da Rosenberg & Associados, o crescimento dos gastos com salários e programas sociais "assistencialistas", compensado pela redução dos investimentos públicos, é um dos mais importantes gargalos da economia brasileira. "O Estado não investe em capacidade produtiva e infra-estrutura e não deixa o mercado fazê-lo", escreveu o economista em relatório divulgado na última segunda-feira, citando que a alta carga tributária impede o setor privado de fazer os investimentos que o governo deixou de lado.

O economista Raul Velloso, especialista em finanças públicas, segue essa mesma linha. Segundo ele, os gastos são muito altos porque, a partir da Constituição de 1988, o Estado passou a ser encarado como um "resolvedor das mazelas sociais".

"O setor público investidor, existente até os anos 70, ficou para trás. Hoje a idéia é de que se resolve tudo gastando mais, principalmente na área social. Basta constatar que as áreas da previdência, assistência social e saúde dominam as despesas", diz Velloso. "E nessas áreas o potencial de desperdício e fraude é muito grande. Por exemplo: a despesa com auxílio-doença passou de R$ 3 bilhões para R$ 11 bilhões em cinco anos, sem que haja indício de que a população ficou mais doente nesse período."

A tão disseminada idéia de corte nos gastos com políticas sociais, no entanto, tem opositores. "Sempre que se fala em economizar, é nos gastos sociais. Mas na verdade eles precisam ser ampliados, e não reduzidos", diz o sociólogo Ricardo Costa de Oliveira, professor da Universidade Federal do Paraná. "O que deve ocorrer é uma distribuição mais justa da tributação, e não necessariamente o corte desses repasses para reduzir os tributos, como têm defendido alguns candidatos da oposição."

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Serviço: Na edição de amanhã, a série Dinheiro no Desvio traz a última reportagem sobre o sistema tributário brasileiro.