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O ano de 2022 deve ser marcado por uma corrida para tirar do papel projetos de geração própria de energia no país. A expectativa surge na esteira de uma contagem regressiva iniciada a partir da sanção do marco da geração distribuída, no mês de janeiro. A partir daquele momento, os interessados têm 12 meses para se enquadrar no regramento atual, com a extensão de isenções e incentivos para a geração distribuída – que é a geração própria de energia e que, no Brasil, é predominantemente solar – até 2045.
Encerrado esse prazo de 12 meses, os novos projetos passarão a se adequar num cronograma de escalonamento de tarifação.
De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), Guilherme Crispin, os primeiros meses do ano foram “mornos”, mas dentro do histórico do setor, com demanda que começa a esquentar com a aproximação do segundo trimestre. A avaliação do executivo é de que, ao ganhar tração, o segmento deve ter seu melhor ano desde a chegada da solar no Brasil.
Se as expectativas da ABGD se concretizarem, a geração distribuída vai quase que dobrar de tamanho, impulsionada pelo interesse do consumidor em escapar das taxações que vão chegar com o ano de 2023.
“A gente vai ter uma aceleração muito forte de projetos. Ano passado foi um ano de 4 gigawatts [acrescidos à potência instalada durante o período]. Acredito que a gente alcance 8 GW de potência [acrescida] em 2022. O que nós estamos dizendo é que muito provavelmente, neste ano em que se completam dez anos de Resolução 482, a gente vai fazer quase em um ano o que fizemos nos últimos dez”, compara, fazendo referência à norma que em 2012 estabeleceu as condições regulatórias para a inserção da geração distribuída na matriz energética brasileira.
O Brasil fechou 2021 com um total de 8 GW de potência instalada em geração distribuída e saltará para 16 GW se as projeções de confirmarem. O acréscimo de potência esperado significa algo em torno de R$ 40 bilhões em investimentos.
A Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) também espera que a nova lei acelere investimentos em novos projetos fotovoltaicos pelo território nacional além de reforçar a atratividade da tecnologia fotovoltaica para o consumidor brasileiro. Somando as usinas de grande porte e os sistemas de geração própria de energia elétrica em telhados, fachadas e pequenos terrenos, essa modalidade já supera a potência instalada da usina hidrelétrica de Itaipu.
Em cálculo ainda mais otimista do que o da ABGD, a Absolar projeta crescimento de 105% da geração própria de energia solar fotovoltaica frente ao total já instalado até 2021, passando de 8,3 GW para 17,2 GW. O resultado daria ao segmento o melhor ano e o maior crescimento do mercado na última década.
O escalonamento previsto na nova lei pode também manter o interesse pela aceleração da implementação de projetos mesmo entre aqueles que não conseguirem fazê-lo ainda em 2022. Conforme a Absolar, “como as cobranças das componentes que remuneram a distribuição serão menores nos primeiros anos, o impacto no tempo de retorno sobre o investimento (o chamado payback) é suavizado para sistemas com prazo de implantação mais próximos”.
Outro destaque feito pela Absolar é de que os sistemas de geração própria de energia solar tem instalação muito rápida, podendo ser implantados em poucos dias em residências ou em pequenos negócios. Nesse sentido, entretanto, pode haver gargalos.
Não se fala em preocupação com escassez de módulos fotovoltaicos (os populares painéis solares) ou demais equipamentos, mas pode faltar mão de obra. As previsões da Associação Brasileira de Energia Solar são da geração de 357 mil novos empregos criados só em 2022, mas Guilherme Crispin, da ABGD, admite que não se pode afastar totalmente o risco de entraves.
“Pode faltar gente e em todos os níveis, desde o gerencial, de supervisão, coordenação, ao [profissional] “mão na massa” mesmo. De repente quer fazer 8 GW em um [ano] precisa de gente. Infelizmente o índice de desemprego está alto, então faz com que se tenha capacidade de captar. Mas é um captar que você precisa ainda de capacitação, treinamento, não é um negócio que se resolve do dia para a noite”, frisa, ao apontar que a questão é considerada ponto focal para o setor.
Na ponta já se percebe interesse crescente na GD. A L8 Energy, que atua na industrialização e distribuição de sistemas de geração fotovoltaica, tem visto aumentar as consultas de integradores e instaladores atrás de equipamentos para novos projetos. Segundo o diretor da empresa, Guilherme Nagamine, a esperada alta – em decorrência da sanção do marco – motivou uma preparação prévia, iniciada ainda em 2021.
“Queríamos estar preparados para atender a demanda e antecipamos muitas compras. Investimos em estoque para a demanda ainda maior do que o crescimento já observado nos últimos anos”, diz Nagamine.
Entre 2018 e 2019 a L8 dobrou de tamanho e, em 2020, cresceu mais 70%, apesar da pandemia. Em 2021 a empresa voltou a dobrar seu faturamento e espera repetir a performance em 2022, a reboque da corrida para garantir os incentivos que permanecem até janeiro próximo.
Como funcionará a cobrança a partir de 2023
Para novos sistemas de geração própria que protocolarem a solicitação de acesso até janeiro de 2023, as regras de compensação atuais serão mantidas até dezembro de 2045. Caso a solicitação de acesso ocorra entre janeiro e junho de 2023, será aplicada regra de transição com cobrança gradual e progressiva da componente Fio B da TUSD – a Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição – até 2030.
Sistemas que protocolarem no período seguinte também passarão por uma cobrança progressiva da TUSD, mas com transição que durará menos, apenas até 2028. Nos anos subsequentes, serão aplicadas diretrizes e valoração que ainda serão estabelecidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).