O rebaixamento da perspectiva do rating do Brasil pela Standard & Poor’s na semana passada foi a gota d’água que fez transbordar o copo cheio de problemas da economia e gestores estrangeiros já estão se desfazendo de ativos brasileiros num ritmo crescente. Mas participantes do mercado ouvidos pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, se preparam para um agravamento da crise, tendo em vista a perspectiva de perda do grau de investimento e a possibilidade crescente de uma ruptura política, que pode levar à queda do governo Dilma Rousseff.

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Crise política atordoa economistas, mas cenário básico não contempla impeachment

O sentimento de agravamento foi percebido na semana passada no mercado

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“Eu não vejo Dilma terminando seu mandato”, diz Jorge Piedrahita, executivo-chefe da norte-americana Torino Capital. Ele comenta que os mercados emergentes em geral estão vendo uma reversão nos fluxos de investimentos, mas o caso do Brasil é exacerbado pela operação Lava Jato e a crise política. Para Piedrahita, o rating brasileiro não deve ser rebaixado para o grau especulativo este ano, mas será muito difícil evitar esse corte em 2016. “As dinâmicas macro e política são muito negativas e muito provavelmente haverá um rebaixamento”, comenta, lembrando que nem todos os investidores institucionais podem aplicar em países que não possuem o grau de investimento pelas três principais agência de rating.

Ele diz que alguns gestores estão adotando uma postura proativa e já começaram a reduzir a exposição ao Brasil. Na mesma linha, Klaus Spielkamp, diretor de vendas de renda fixa da Bulltick, também dos EUA, afirma que há cerca de dois anos vê um fluxo institucional de saída de investidores do Brasil. “Tenho clientes na América Latina que saíram por determinação estratégica e desde então não voltaram ainda. Atualmente, eu tenho visto venda dos últimos que haviam entrado como oportunidade”, explica.

Já David Goldman, diretor-gerente do grupo chinês Reorient Group, em Nova York, argumenta que todos os emergentes estão sofrendo em função da expectativa de aumento de juros nos Estados Unidos, mas que o Brasil tem problemas especiais. “O governo brasileiro e também as empresas emitiram dívidas fortemente, tanto que a dívida externa líquida passou de US$ 100 bilhões em 2007 para US$ 300 bilhões atualmente. Quanto maior a alavancagem, maior a vulnerabilidade”, afirma.

Na avaliação de Piedrahita, da Torino, os ativos brasileiros ainda devem cair mais, o que pode atrair compras de barganha no futuro. Segundo ele, o recente salto do dólar ajuda, ao tornar os ativos locais mais baratos para os estrangeiros, mas ainda não é suficiente. Spielkamp, da Bulltick, também diz que o Brasil já está barato em relação ao seus pares, mas ainda deve cair mais.

Um pouco mais moderado, Jack Deino, diretor de renda fixa para mercados emergentes da Invesco, diz não estar 100% convencido de que o Brasil será rebaixado para o grau especulativo. Para ele, apesar de a relação dívida/PIB estar piorando, as reservas internacionais fornecem um colchão importante e a dívida externa ainda é baixa.

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Piorar antes de melhorar

Em meio a tudo isso, o CEO da Torino diz que há uma luz no fim do túnel, que é justamente a continuidade da Lava Jato. Para o gestor, a atuação da Polícia Federal pode levar a uma queda na corrupção e renovação da classe política, a exemplo do que aconteceu na Itália na década de 1990, com a famosa operação “Mãos Limpas”. “Mas as coisas vão piorar antes de melhorar”, alerta Piedrahita.

Essa visão é compartilhada por Deino. Para ele, há mais de 50% de chance de Dilma não terminar o mandato. Mesmo assim, no longo prazo, a Lava Jato será positiva para o Brasil, mostrando a independência das instituições e reduzindo a corrupção. “O ruim é que isso acontece em um momento de grande vulnerabilidade macroeconômica, mas no longo prazo é positivo, é algo que eu gostaria de ver em outros países onde invisto”. O diretor da Invesco não revela quanto tem aplicado em ativos brasileiros, mas diz que possui em sua carteira títulos soberanos em moeda local e debêntures de empresas exportadoras.

Já Goldman tem uma análise menos positiva sobre o desdobramento do atual imbróglio político e econômico. Segundo o diretor do Reorient, o governo brasileiro “não inspira confiança” e isso é um agravante em um contexto já bastante ruim. Dada a situação complexa, ele diz que o governo deveria declarar oficialmente uma crise e convocar um gabinete de emergência, formado por especialistas conceituados, de fora da base aliada. “Enormes ativos estatais estão na mão de políticos que perderam a confiança do público e dos investidores. A coisa óbvia a se fazer é anunciar um plano para transferir a gestão desses ativos para o setor privado, com transferência gradual também da propriedade”, opina.

No caso de um impeachment, Spielkamp diz que a preocupação seria saber se o vice-presidente Michel Temer realmente teria apoio do Congresso para poder governar. Para ele, o peemedebista seria obrigado a alojar aliados nos ministérios e liberar alguns gastos. “Dependendo da pressão que se apresente, acabamos tendo uma mudança de governo não muito relevante. Mas acho que qualquer mudança será vista como uma melhora da situação atual”, afirma.

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