O executivo brasileiro Carlos Ghosn, preso em Tóquio desde o dia 19 de novembro sob a acusação de cometer fraudes financeiras contra a Nissan, foi indiciado pela segunda vez nesta sexta-feira (11). A promotoria o acusa de ter sonegado informações sobre o próprio salário entre 2015 e 2018, período em que ocupou os cargos de executivo-chefe e de presidente do conselho de administração da montadora japonesa.
Ghosn também teria realizado transações em benefício próprio com um empresário saudita, lesando a Nissan em cerca de US$ 15 milhões. Na legislação japonesa, esse suposto crime cometido pelo brasileiro é chamado de “quebra de confiança”. Com o novo indiciamento, Ghosn deverá ser autorizado a pagar fiança para responder o processo em liberdade. A defesa do executivo informou que vai tentar libertá-lo ainda nesta sexta (11). Os advogados não tiveram sucesso no pedido anterior.
O suposto cúmplice de Ghosn, o executivo americano Greg Kelly, e a Nissan também foram indiciados na investigação sobre a sonegação de informações de salários. No primeiro indiciamento, em 10 de dezembro, Ghosn, Kelly e a Nissan também são acusados de terem falsificados informes de pagamentos do período entre 2010 e 2015.
Ghosn diz que as acusações “não têm fundamento”. Kelly, que já foi libertado sob fiança, alega inocência.
Ghosn tem febre alta na prisão e família pedirá ajuda ao Itamaraty
O ex-presidente da Nissan Carlos Ghosn está completamente isolado no centro de detenção de Tóquio. Segundo a imprensa japonesa, o executivo, que não tem acesso aos familiares e só se comunica com o exterior por meio de um advogado japonês, estava com febre alta, o que obrigou a suspensão de um interrogatório.
De acordo com o advogado Motonari Otsuru, um médico prestou atendimento a Ghosn, de 64 anos, que estaria “cansado da longa detenção e dos interrogatórios”.
Em comunicado, a mulher de Ghosn, Carole Ghosn, afirmou que soube da notícia pelos jornais. Ela diz que as autoridades japonesas se recusam a esclarecer se o executivo foi transferido para uma enfermaria ou se será permitido à família falar com a equipe médica.
“Estou suplicando às autoridades japonesas que nos forneçam qualquer informação sobre a saúde do meu marido”, escreveu. “Estamos com medo e muito preocupados que sua recuperação seja complicada, enquanto ele continua a suportar condições tão duras e tratamento injusto.”
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Defesa brasileira fala em violação de garantias básicas
Para o advogado brasileiro do executivo, José Roberto Castro Neves, o caso agora é uma questão humanitária. “Há uma violação das garantias básicas, da integridade física de Ghosn.” De acordo com Castro Neves, a família vai solicitar que o Itamaraty tome medidas.
Em sua primeira aparição pública, durante depoimento à Corte Distrital de Tóquio, na segunda-feira (7), Ghosn, que entrou algemado, aparentava estar mais magro do que antes da prisão e exibia fios brancos na raiz de seus cabelos, conforme pessoas presentes na audiência.
Em sua fala, o executivo, a quem é dado o crédito de ter resgatado a Nissan da beira da falência duas décadas atrás, disse que foi “equivocadamente acusado e injustamente detido com base em acusações infundadas e sem mérito”.
Na última quarta-feira (9), foi a vez do jornal Wall Street Journal, em editorial, questionar a condução das investigações contra Ghosn. Na avaliação da publicação, trata-se de um dos casos “mais estranhos no mundo dos negócios”.
Para o WSJ, a prolongada prisão do executivo é uma pressão crescente sobre a Renault para que destitua Ghosn de sua presidência - a montadora francesa tem uma aliança com a Nissan e a Mitsubishi Motors, liderada pelo brasileiro. “(...) Essa aliança incomoda cada vez mais os japoneses; é possível presumir que a inquisição sobre Ghosn seja parte de um esforço japonês para dissolver a aliança montada pelo executivo.”
Segundo o WST, os procuradores públicos estão adicionando acusações que necessitam de investigação, para que possam manter o executivo preso, nos termos das leis japonesas. Em referência à Alice no País das Maravilhas, o jornal americano recorre à lógica da Rainha de Copas, do clássico de Lewis Carroll, para definir o tratamento dado ao executivo: “primeiro a sentença e depois o veredicto”.