A economia brasileira dá sinais de que seu modelo de crescimento, sustentado pelo consumo das famílias, está se esgotando. E essa "exaustão", dizem economistas, reforça a necessidade de o país dar mais ênfase ao investimento, elemento imprescindível para a promoção de ciclos de desenvolvimento mais duradouros.
Mas, como demonstrou em seu último pacote, o governo federal segue apostando quase todas as fichas no estímulo ao consumo. E, embora tenha lançado medidas para incentivar as empresas privadas a investir, ele próprio está reduzindo seus desembolsos pelo segundo ano seguido. De acordo com o portal Siga Brasil e a ONG Contas Abertas, a União investiu R$ 10,5 bilhões entre janeiro e abril, 5% menos que no mesmo período de 2011, ano em que os aportes haviam caído pouco mais de 20%.
Os números contrariam declarações da cúpula do governo. Na semana passada, quando o Tribunal de Contas da União (TCU) afirmou haver "problemas significativos na operacionalização dos financiamentos, que causam atrasos de algumas das ações mais estruturantes ligadas ao PAC", a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, disse que "os investimentos não estão com baixa execução" e "seguem a execução que tiveram no ano anterior". Ela também afirmou que o governo está gastando menos com custeio, mas os dados de execução do Orçamento mostram que as despesas correntes e com pessoal aumentaram 8% no primeiro quadrimestre, para R$ 306 bilhões.
O secretário-geral do Contas Abertas, Gil Castello Branco, atribui a retração dos investimentos à "quase paralisia" do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit), que teve toda a cúpula substituída a partir de meados de 2011. Com isso, os investimentos do Ministério do Transporte caíram pela metade no primeiro quadrimestre deste ano. A situação tende a piorar por causa dos problemas da Delta, "empreiteira líder" do PAC.
Para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao governo, o recuo tem a ver com o corte de gastos. Em sua "Carta de Conjuntura" de maio, o Ipea afirmou que "o ajuste fiscal realizado em 2011 e o prometido para 2012 têm afetado a execução dos investimentos públicos", inclusive os do PAC, tidos como prioritários.
A lentidão do governo é pior na medida em que o setor privado também está investindo menos. Segundo o Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), no primeiro trimestre todos os componentes do investimento público e privado caíram, algo que não ocorria desde 2008. O Ibre calcula que o investimento total medido pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), um componente do Produto Interno Bruto recuou 2,5% em relação ao trimestre anterior.
Só 2,5% do PIB vai para a infraestrutura
A participação do setor público no investimento total é pequena. O Ipea estima que no ano passado, quando a FBCF somou R$ 799 bilhões, ou 19,3% do PIB, os governos foram responsáveis por apenas 2,3 pontos porcentuais desse total. No entanto, quando se contabiliza o investimento em infraestrutura, o setor público costuma arcar com mais da metade dos gastos: de um "bolo" de R$ 93 bilhões (2,5% do PIB) aplicados nessa área em 2010, governos e estatais responderam por R$ 55,8 bilhões, ou 60% do total, segundo estimativa do economista Cláudio Frischtak, da consultoria InterB.
Em um país repleto de gargalos em portos, estradas, aeroportos e outros, a atual redução dos investimentos do governo federal muito concentrada na área de transportes torna-se ainda mais dramática. "Enquanto investimos 2,5% do PIB em infraestrutura, nossos concorrentes lá fora investem 10%", diz Frischtak.
Para Robson Gonçalves, professor de Economia do Isae/FGV, a questão não é exatamente a falta de recursos, e sim uma carência de capacidade de gestão dentro do setor público: "Essa carência se manifesta em uma tremenda dificuldade em agilizar processos e, nos casos mais graves, em corrupção". O TCU disse algo semelhante em relatório divulgado na semana passada, no qual criticou a "pouca capacidade" das entidades responsáveis em gerir grandes obras de engenharia.