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O governo federal planeja uma redução expressiva de gastos nos próximos anos, capaz de levar suas contas de volta ao azul em 2025. Conforme as projeções oficiais, parte dessa melhora virá da contenção de despesas obrigatórias, como aposentadorias e salários do funcionalismo. Porém, haverá um corte ainda mais forte nos gastos de livre manejo, chamados de discricionários, que abrangem basicamente os investimentos e o custeio da máquina.
A consequência, admite o próprio governo, será uma piora nos serviços públicos – a não ser que o país faça reformas estruturais capazes de reverter esse movimento.
A explicação para essa compressão está na regra do teto de gastos, que impede as despesas públicas de avançar acima da inflação. Como é mais difícil limitar os gastos obrigatórios, que em geral são determinados pela legislação, o ajuste das contas é feito principalmente sobre as demais despesas.
"É possível observar o crescimento na participação dos gastos obrigatórios em detrimento dos discricionários. A situação demanda avanços na agenda de reformas estruturais para reverter tendência de precarização gradual da oferta de bens e serviços públicos e de investimentos importantes", afirma a equipe econômica no sumário executivo do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2023, que também apresenta as perspectivas para os dois anos seguintes.
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Para o secretário especial de Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Esteves Colnago, uma mudança nessa tendência dependerá de alterações nas regras vigentes – em especial, o reajuste automático de gastos pela inflação.
"O objetivo do teto de gastos é restringir o crescimento da despesa do governo. O que a gente precisa é olhar as nossas despesas públicas e ver aquilo que a gente pode efetivamente alterar, o que pode aprimorar", disse Colnago na entrevista coletiva em que apresentou o PLDO 2023, no dia 18.
"O reajuste automático pela inflação é uma regra que a gente deveria olhar com mais cuidado. Obviamente demanda alteração constitucional, mas essa prerrogativa de aumentar as despesas deveria ser do Congresso, e não uma fórmula automatizada na Constituição", completou o secretário.
Em 2022, o governo estima que as despesas primárias (que não têm relação com a dívida pública) serão de R$ 1,753 trilhão, o equivalente a 18,2% do Produto Interno Bruto (PIB). Segundo o PLDO, cerca de 92,5% dessas despesas serão obrigatórias (R$ 1,622 trilhão, ou 16,8% do PIB) e 7,5%, discricionárias (R$ 131 bilhões, ou 1,4% do PIB).
O atual patamar dos gastos livres, de 1,4% do PIB, é igual ao de 2021, que por sua vez foi o menor da série histórica do Tesouro Nacional para esse tipo de dado, iniciada em 2008. Nesse intervalo, o nível mais alto foi o de 2010, com 3,3% do PIB aplicados em investimento e custeio.
Para 2023, o governo estima que o gasto primário cairá a 17,8% do PIB, com 16,8% do PIB de despesas obrigatórias e 1% do PIB de discricionárias. Nesse cenário, o Orçamento federal será 94,2% obrigatório e 5,8%, de livre manejo.
A dinâmica persiste nos anos seguintes e, conforme as projeções do PLDO, em 2025 a União fará desembolso de 16,7% do PIB, o menor patamar desde 2008, dos quais 16,1% do PIB serão gastos obrigatórios e apenas 0,6% do PIB, discricionários. O Orçamento federal, assim, será composto de 96,2% de despesas obrigatórias e somente 3,8% de gastos livres.
Em resumo, no intervalo de 2022 a 2025 o gasto total vai encolher o equivalente a 1,5 % do PIB, com investimento e custeio diminuindo em 0,8% do PIB. Em apenas três anos, portanto, esse tipo de desembolso cairá a menos da metade dos níveis atuais, em comparação com o tamanho da economia brasileira.
Risco de paralisia dos serviços públicos é baixo, diz Ministério da Economia
Os gastos discricionários não vão diminuir apenas em termos relativos (isto é, em relação ao PIB e ao Orçamento total). O governo também prevê uma redução em termos absolutos, com os valores aplicados caindo de R$ 131 bilhões em 2022 para pouco menos de R$ 77 bilhões em 2025.
Os valores de 2023 em diante não incluem as emendas parlamentares, que são classificadas como gastos discricionários. De todo modo, mesmo a inclusão delas – que depende de decisões do Congresso a cada ano – não altera a tendência de encolhimento no investimento público e no custeio da máquina.
O secretário de Tesouro e Orçamento trabalha com valores próximos de R$ 20 bilhões em emendas parlamentares. O que em 2025 faria o gasto discricionário passar de R$ 77 bilhões para algo próximo de R$ 97 bilhões. Esses patamares levantam discussões sobre um possível "shutdown", isto é, uma paralisia de serviços públicos por falta de recursos para mantê-los.
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Os gastos de custeio incluem pagamento de água e luz de repartições públicas, serviços de limpeza, vigilância, aluguel de imóveis, tecnologia da informação, combustíveis e materiais de consumo variados. Em muitos casos, afetam diretamente a manutenção de serviços à população. Ou seja, embora não sejam classificados como "obrigatórios", em muitos casos eles são imprescindíveis.
Em meados de 2017, no governo de Michel Temer, o país teve uma pequena amostra das consequências do esgotamento desse tipo de recurso: a Polícia Federal parou de emitir passaportes, a Polícia Rodoviária Federal reduziu drasticamente o patrulhamento de estradas e o atendimento ao público em órgãos como o INSS foi prejudicado.
Colnago, porém, acredita que o risco de shutdown é muito baixo nos próximos anos – inclusive em 2025, horizonte do planejamento atual, quando os valores de investimento e custeio tendem a ser os menores da série histórica.
"Você vai ter aquilo que a gente vive mais ou menos todo ano. Uma restrição no primeiro semestre, e ao longo do ano o Orçamento vai flexibilizando e a gente vai conseguindo atender as demandas dos órgãos, e vai cumprindo com as políticas públicas", disse o secretário em entrevista coletiva. "Na nossa regra de bolso, R$ 80 bilhões [em gastos discricionários por ano] ainda não são shutdown."
Governo prevê superávit primário em 2025, mas faz alerta sobre dívida pública no "médio prazo"
Conforme o PLDO 2023, o governo federal espera alcançar em 2025 o superávit primário em suas contas, após mais de uma década no vermelho. O documento também prevê uma trajetória de estabilidade na dívida pública até lá.
O superávit primário ocorre quando a receita líquida (após as transferências constitucionais a estados e municípios) supera as despesas primárias (que são os gastos não financeiros, sem relação com a dívida pública).
A volta ao azul prevista pelo governo é resultado de uma redução acentuada de gastos nos próximos anos, combinada a uma queda mais suave nas receitas.
Além de gastar menos com investimento e custeio, o governo prevê economizar com benefícios previdenciários e salários de servidores, graças aos efeitos da reforma da Previdência e das iniciativas de contenção de gastos com pessoal que a equipe econômica batizou de "reforma administrativa silenciosa".
O último superávit primário da União foi registrado em 2013. De 2014 em diante, o país registrou sucessivos déficits primários, e só deve sair dessa situação no terceiro ano da próxima gestão.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, previa zerar o déficit primário ainda em 2019, primeiro ano de governo. Porém, as contas ficaram negativas durante toda a sua gestão, com déficit de 1,3% do PIB em 2019, 9,9% do PIB em 2020 (neste caso, por causa dos gastos com a pandemia) e 0,4% do PIB em 2021.
Para 2022, o Ministério da Economia prevê déficit equivalente a 0,7% do PIB, seguido de -0,6% do PIB em 2023 e -0,2% do PIB em 2024. Em 2025, segundo o PLDO, o país finalmente voltaria ao azul, com saldo positivo de 0,3% do PIB.
Para a dívida pública, o governo prevê uma trajetória estável até 2025. O indicador, que fechou 2019 em 74,4% do PIB, saltou para 88,6% do PIB no ano seguinte por causa dos gastos com a pandemia e, em 2021, caiu para 80,3% do PIB.
Para o fim deste ano ano e dos três seguintes o governo espera índices entre 79,3% e 80,3% do PIB. No sumário executivo do PLDO 2023, a equipe econômica afirma que essa estabilidade se deve "à melhoria do cenário fiscal a partir de manutenção de âncoras fiscais, como o teto de gastos, e reformas estruturais, como a reforma da Previdência".
Na sequência, porém, o texto faz um alerta, apontando para a necessidade de "substancial esforço arrecadatório" para conter o crescimento da dívida no médio prazo.
"A trajetória fiscal projetada ainda se mostra insuficiente para uma conter o crescimento da dívida pública no médio prazo, dado o cenário macroeconômico posto", diz o documento. "Sob as hipóteses consideradas para a evolução das despesas primárias, seria necessário substancial esforço arrecadatório para gerar superávits suficientemente elevados para reverter, no curto prazo, a trajetória ora projetada para a dívida pública."