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Governo poda criatividade das cervejarias artesanais

Cavalcanti, da Bodebrown, e a sua Perigosa: nome que ele queria dar à cerveja foi vetado pelo Ministério da Agricultura | Felipe Rosa/Gazeta do Povo
Cavalcanti, da Bodebrown, e a sua Perigosa: nome que ele queria dar à cerveja foi vetado pelo Ministério da Agricultura (Foto: Felipe Rosa/Gazeta do Povo)

Proibições de ingredientes e até de nomes de produtos por parte do Ministério da Agricultura vêm barrando a atividade – e a criatividade – de microcervejarias no país. No último ano, o movimento tem se intensificado, impedindo lançamentos de novas cervejas e atrapalhando até o processo de criação das bebidas.

Na formulação, os desentendimentos ocorrem pela proibição de determinados insumos na produção das cervejas. No caso dos nomes, as decisões são mais subjetivas: o governo tem impedido o uso de títulos ou adjetivos que supostamente confundiriam os consumidores.

O produtor Samuel Cavalcanti, dono da cervejaria Bodebrown, de Curitiba, passou pelas duas situações. Na tentativa de criar sabores e variações da bebida, já teve alguns de seus produtos barrados. Foi o caso de uma cerveja que usaria lactose – o ministério não teria entendido a função que o insumo teria na bebida e, por isso, proibiu seu uso.

Episódio semelhante ocorreu com a DaDo Bier, de Porto Alegre. No início do ano, ela foi proibida de vender uma cerveja com sabor de chocolate. O problema apontado pelo ministério foi que não está prevista a utilização de derivados animais, caso do leite em pó, na produção de cervejas nacionais. Junto com sua parceira, a chocolateria Kopenhagen, a DaDo Bier insistiu no projeto. Reformulou o produto, retirando o ingrediente proibido, mas a bebida foi novamente barrada, por causa do uso de outro insumo.

"A criação de produtos diferentes, inusitados, com novos sabores é um dos maiores trunfos das cervejarias artesanais. Diferentemente do que parte do Ministério da Agricultura pode pensar, não estamos descaracterizando a cerveja, mas trazendo inovações para ela, como ocorre no mundo inteiro", diz Cavalcanti, da Bodebrown.

Nome perigoso

Há cerca de dois anos, a cervejaria curitibana foi aconselhada pelo Ministério da Agricultura a alterar o nome de uma de suas criações, a cerveja Venenosa, a fim de evitar possíveis mal-entendidos. A cervejaria acatou a decisão e o produto passou a se chamar Perigosa. Outras empresas do país também já sofreram com o problema ao registrar nomes que fazem relação a outros produtos, como o chocolate ou a rapadura.

"Entendemos que o tema é novo e por isso a regulação do setor não está completamente atua­­lizada. Mas, ao mesmo tempo, o ministério também não tem olhado para o tema com a atenção necessária", afirma Eduardo Bier, da DaDo Bier.

Contradição

Bier e Cavalcanti veem incongruências na regulamentação vigente, uma vez que produtos importados com ingredientes e nomes já proibidos para as cervejas nacionais podem entrar no país sem problemas. Para o dono da Bodebrown, essa diferença no tratamento dispensado ao produto importado e ao nacional evidencia que desentendimentos e proibições têm origem na falta de adequação das normas à realidade das novas cervejarias.

"A nossa relação com os fiscais e, de forma geral, com o ministério, é positiva. O problema está na regulamentação, que deixa muito a desejar e atrapalha nossas atividades", diz Cavalcanti.

Bares

O constrangimento chegou aos locais de venda dos produtos. Semanas atrás, bares curitibanos foram visitados por fiscais do ministério e tiveram de retirar algumas cervejas artesanais de circulação.

O responsável pela questão no Ministério da Agricultura não pôde atender à reportagem quanto aos casos pontuais das cervejarias. Por e-mail, o órgão afirmou que as inspeções vêm sendo feitas dentro do cronograma anual da pasta e não teriam sido intensificadas nos últimos meses.

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