Preço à vista igual ao do parcelamento dito “sem juros” é uma falácia não percebida pela maioria dos brasileiros| Foto: Felipe Rosa/ Gazeta do Povo

Em andamento

Maior transparência é proposta no novo Código do Consumidor

Agência O Globo

São Paulo - A proposta do novo Código de Defesa do Consumidor, em discussão no Senado, já tem como alvo a transparência das vendas "sem juros". Proíbe que a publicidade use esse tipo de expressão. De acordo com o diretor do Procon-SP Paulo Arthur Góes, explica que não anunciar preços à vista menores que os cobrados a prazo pode ser considerado propaganda enganosa. E destaca que, hoje, não há legislação que obrigue as empresas a tornarem claras as taxas de juros que estão sendo cobradas dos seus clientes. "É muito difícil um programa de parcelamento que não tenha juros. A recomendação é que o consumidor não se deixe seduzir por esse tipo de oferta. Mas, quando tem desconto à vista, o consumidor não reclama porque se considera beneficiado", explica Góes, que acha importante o estímulo ao consumo de uma forma mais consciente.

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Empresários cobram clareza em relação aos impostos

Denise Paro, da Sucursal

Foz do Iguaçu - Empresários presentes na XXII Convenção das Associações Comerciais e Empresariais do Paraná (Faciap), aberta ontem em Foz do Iguaçu, aprovam a intenção do governo em imprimir mais transparência na cobrança de juros para o consumidor final, no entanto, pedem uma contrapartida. Querem que o consumidor também saiba o quanto de imposto paga sobre os produtos adquiridos.

Para o presidente da Faciap, Rainer Zielasko, a informação sobre a cobrança dos chamados "juros escondidos" é necessária, principalmente para o consumidor de renda mais baixa, porque ele geralmente não faz o cálculo de quanto está pagando de juro, mas sim se a prestação caberá no orçamento. "Mas a recíproca também é verdadeira. O governo deveria destacar mais claramente quanto pagamos de impostos sobre os produtos que consumimos", diz.

O presidente da Associação Comercial e Industrial de Londrina (Acil), Flávio Balan, diz que o setor privado sempre vai apoiar qualquer ideia no sentido de esclarecer o consumidor sobre o quanto está pagando de juros. Porém, ele defende mais coerência por parte do governo e uma quebra de paradigma no setor, que incluiria uma reforma fiscal. "Eu proporia ao governo, já que quer fazer isso com o empresariado, que todo produto da prateleira tem de ter especificado o custo, o lucro do empresário, o imposto e a taxa de juros", diz.

Lucro

Para Zielasko, a queda recente na taxa de juros beneficiou indústrias na compra de caminhões e máquinas, mas não chegou ao consumidor final porque o spreed bancário está muito alto. Segundo ele, a taxa do cheque especial, de 9% a 10% ao mês, é muito mais alta em relação às praticadas em outros países, por isso os bancos também precisam fazer seu papel, enxugando um pouco a voracidade pelo lucro e beneficiando o consumidor.

Expectativa

Economista-chefe do Bradesco prevê taxas ainda menores

Agência Estado

O economista-chefe do banco Bradesco, Octavio de Barros, acredita que as taxas de juros para os tomadores finais têm espaço para continuar cedendo. Segundo ele, a correlação entre a queda da taxa Selic e as taxas para os clientes tem uma "defasagem, não é imediata". De acordo com Barros, a redução de 5 pontos porcentuais na referência do juro brasileiro neste ano está se refletindo "na ponta de forma também importante". "A grande preocupação vinha sendo com as taxas do cartão de crédito e do rotativo, mas os bancos estão tomando medidas e isso tende a perder um pouco de atenção".

Há uma semana, o Bradesco anunciou a redução da taxa dos seus cartões bandeiras Visa, American Express, ELO e Mastercard. A taxa máxima do crédito rotativo diminuiu 54%, passando de 14,9% para 6,9%. Os juros para parcelamento nos cartões de crédito caíram de 8,9% para 4,9%, na máxima. As novas taxas do crédito rotativo, de saque, parcelamento do emissor e parcelamento da fatura dos cartões de crédito entram em vigor em 1.º de novembro.

PIB

Barros acredita que a economia brasileira deva ter encerrado o terceiro trimestre com Produto Interno Bruto (PIB) anualizado em cerca de 5%. "É como um carro atolado que, de repente, pega tração e sai em disparada". Barros lembra, entretanto, que é natural uma certa acomodação após a "disparada". A previsão dele é que, neste quarto trimestre e em 2013, a atividade econômica cresça em torno de 4% ao ano. Para 2012, a projeção é 1,6%.

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O governo federal estuda uma nova investida contra o custo financeiro do país e desta vez o alvo é o juro "invisível", aquele presente nas parcelas, mas escondido pela propaganda do "sem juros". Estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República mostra que os brasileiros só conhecem 1,9% dos juros que pagam e por isso pede mais transparência. Especialistas afirmam que a medida terá impacto na redução da inflação, mas o comércio teme a imposição e diz que há uma dificuldade para executar a discrição do custo, sem prejuízo ao lojista e ao consumidor.

O estudo, feito com base em cruzamento de dados do Banco Central e da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE, mostra que o consumidor tem consciência de apenas uma pequena parcela do que paga efetivamente de juros. As famílias desembolsaram R$ 170 bilhões, mas a percepção é de apenas 1,9% desse valor, ou R$ 3,2 bilhões. O estudo tem como referência valores de 2008, ano-base do último levantamento do IBGE.

Auxiliado pela SAE, o Banco Central analisa alternativas para uma nova legislação que dê transparência ao setor financeiro e, ao mesmo tempo, abra espaço para a criação de produtos voltados para a nova classe média.

Uma ideia sobre a mesa é obrigar lojistas a mostrarem o chamado custo efetivo total (CET) das operações. E deixar claro o desconto no preço à vista, que deve ser necessariamente menor que o parcelado.

Embora muitos consumidores não percebam, um preço à vista igual ao parcelado significa que o valor à vista está inflado – de acordo com economistas, a empresa embute o custo financeiro que teria ao longo dos meses no valor à vista, que começa em 2% ao mês. As instituições financeiras já são obrigadas a dar transparência a essas informações desde 2007.

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A diretora de projetos da SAE, Diana Grosner, observa que a invisibilidade dos juros é um problema que atinge todas as classes sociais. "Mesmo a classe alta, com média de 12 anos de estudo, parece que não está conseguindo perceber o que está pagando de juros", ressalta Diana.

O economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia do Paraná (Corecon-PR) Eduardo Cosentino considera a proposta interessante. "Economicamente melhoraria também a pressão inflacionária. A partir do momento que o consumidor sabe efetivamente quanto está pagando e tem uma educação financeira, ele deixa de gastar por impulso, refletindo inclusive no endividamento da família", avalia.

Por outro lado, Cosentino teme que o mercado empresarial inflacione os preços para obter vantagens no momento da efetivação da medida. "Uma geladeira, que hoje custa R$ 1 mil, pode ter o preço elevado a R$ 1,3 mil, para que, com desconto à vista, fique em R$ 1,2 mil. Para evitar essa situação, é preciso uma ação de controle e fiscalização por parte do governo", aponta.

Comércio teme ser lesado com possível medida

O comércio considera positivo trazer mais transparência à cobrança de juros, mas teme que a medida traga prejuízos ao lojista, avaliam representantes do setor. Para o presidente da Associação Comercial do Paraná (ACP), Edson José Ramon, o lojista deve dar a opção de desconto à vista para o consumidor, mas não pode ser obrigado a explicar a taxa ao cliente.

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"Isso porque o lojista não tem condições de fazer o cálculo, principalmente o pequeno, que teria de contratar um economista para fazer essas contas. É um excesso de burocracia. Se o comerciante der o desconto à vista, o consumidor já vai saber o valor absoluto e a diferença no parcelamento", pondera Ramon.

Federação

O presidente da Fede­­ra­­ção do Comércio do Paraná (Fecomércio-PR), Darci Piana, tem a mesma opinião, porque, segundo ele, é difícil simplificar e explicar os juros embutidos. Piana ressalta que como o comerciante tem acesso ao crédito de diferentes instituições financeiras e usualmente utiliza mais de um canal, o projeto seria de difícil viabilidade. "Cada banco tem uma taxa de juros própria. Como simplificar isso em uma loja de 30 mil itens?", questiona.

Cartões de crédito

O consumidor também paga taxas exorbitantes no rotativo ou no parcelamento de dívidas no cartão de crédito para compensar as supostas vendas a prazo sem juros. As administradoras de cartão alegam cobrar caro porque precisam compensar o "juro zero" de quem paga em dia. O argumento é que, entre a data da compra e o vencimento da conta, nada é cobrado do cliente.

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Para o presidente da ACP, é preciso esclarecer a cobrança de juros, mas seriam os cartões de crédito os responsáveis pela cobrança de taxas abusivas. "Não são os lojistas que estão ganhando com essa situação, são as instituições financeiras", ressalta.