Guerra na Ucrânia vai respingar na economia mundial. Nos bastidores, governo brasileiro fala em crescimento menor| Foto: EFE/EPA/STRINGER
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Mal o mundo saiu de uma crise econômica, causada pela pandemia da Covid-19, e uma nova onda de incertezas foi detonada pelo ataque da Rússia à Ucrânia.

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Os maiores impactos sentidos até agora são no preço das commodities. Nas duas primeiras semanas da guerra, o índice que acompanha as cotações das matérias-primas subiu 14%, segundo a Bloomberg. Mas a guerra também deve afetar o crescimento dos países, principalmente em áreas próximas ao conflito. O Goldman Sachs fez um corte severo nas expectativas de crescimento para a Europa neste ano, de 3,9% para 2,5%.

No Brasil, o ponto médio das expectativas para o crescimento do PIB avançou na última semana, passando de 0,3% para 0,43%, segundo o relatório Focus. Esse movimento, porém, é creditado a um efeito estatístico: o crescimento mais forte que o esperado no último trimestre de 2021. “O carregamento [herdado do desempenho de 2021] aumentou”, diz Thiago Xavier, economista da Tendências Consultoria.

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Passadas duas semanas da guerra, o mercado financeiro não fez grandes revisões em seus prognósticos para a economia brasileira, embora instituições apontem pontos que podem ajudar e atrapalhar o PIB do país.

A XP Investimentos aponta que houve uma expansão acima do esperado no final de 2021 e deve seguir em alta no início deste ano. “No entanto, com o enfraquecimento da demanda interna adiante e os riscos internacionais, mantemos a projeção de variação nula para o PIB em 2022”, escrevem os analistas da corretora em relatório.

O Bradesco considera que ainda é difícil prever o desfecho da guerra na Ucrânia, que pode alterar de maneira significativa os números do cenário. De forma geral, porém, o banco avalia que o legado do conflito deve ser mais inflação e menos crescimento, inclusive no Brasil. As projeções do banco de inflação para 2022 e 2023 foram elevadas, mas por ora as do PIB permanecem estáveis em 0,5% – até então elas vinham exibindo viés de alta, segundo a instituição.

O Itaú, por outro lado, vê chance de mudança para melhor em sua projeção para o PIB de 2022, que no momento é de queda de 0,5% do PIB na atividade econômica. “Além de dados melhores na margem, os fundamentos também estão se alterando”, diz o banco. Segundo ele, o PIB brasileiro responde principalmente a três fatores fundamentais no curto prazo: os preços das commodities, a política monetária e a fiscal.

O banco aponta que a postura monetária é significativamente contracionista, mas os preços das commodities estão em alta – mesmo antes do conflito entre Rússia e Ucrânia –, os governos regionais estão aumentando os gastos e há perspectivas de corte de impostos por parte do governo federal.

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O que o governo espera

O governo ainda não se manifestou oficialmente sobre os impactos da guerra na Ucrânia sobre a economia brasileira. A projeção oficial da Secretaria de Política Econômica é de uma alta de 2,1% no PIB em 2022. Novas projeções podem ser divulgadas na próxima semana.

Mas, segundo o jornal "Valor", estimativas que circulam dentro do governo federal estariam sendo revistas para baixo em razão da guerra, que teria reduzido o crescimento do PIB em meio ponto percentual.

Dias antes da invasão, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o mercado passaria o ano revendo para cima as projeções, e que o Brasil tem uma "dinâmica de crescimento próprio".

"Vão rever crescimento lá fora pra baixo o ano inteiro. E vão rever o crescimento para cima no Brasil o ano inteiro. Vamos ver um agravamento da situação internacional. Não só da geopolítica, que está séria, mas da economia. Temos crise energética e inflação subindo no maior país do mundo. E nós somos uma economia continental. Temos dinâmica de crescimento próprio", declarou o ministro.

O que ajuda o desempenho do PIB

Commodities em alta

Segundo a XP Investimentos, para a América Latina, o conflito geopolítico pode trazer algum benefício de curto prazo. “Os preços mais altos das commodities tendem a elevar o valor de suas exportações e aumentar a arrecadação de tributos”, diz a corretora.

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Outro fator que pode beneficiar o Brasil, de acordo com a corretora, é que o agravamento da crise militar pode redirecionar fluxos de capitais do Leste Europeu a países com mercados amplos, com grande liquidez e distância geográfica dos conflitos, como é o caso do Brasil.

Outro trunfo é a baixa exposição financeira/bancária e a pequena participação dos dois países no comércio exterior do Brasil. Segundo o Bradesco, o peso das transações com a Rússia corresponde a 0,4% do PIB.

Mas há uma ressalva. A XP aponta que muitos países da América Latina dependem das vendas de fertilizantes dos países em guerra, o que pode pressionar o custo da produção agrícola doméstica e os preços internacionais dos alimentos. É o caso do Brasil.

Expectativas favoráveis para o primeiro trimestre

As expectativas dos analistas para o crescimento da economia no primeiro trimestre são favoráveis. “Para o atual estágio do conflito, o PIB brasileiro não deve ser significativamente impactado, seja pela nossa baixa exposição comercial ou por fatores domésticos que sustentam algum crescimento”, destaca o Bradesco.

Esses fatores são impulsionados por:

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  • expansão da população empregada, que ainda sustenta o consumo privado – em janeiro, foram abertos 155,2 mil postos de trabalho com carteira assinada;
  • o aumento dos investimentos públicos, principalmente nos governos regionais;
  • o desempenho positivo de atividades “menos sensíveis ao ciclo econômico”, como a agropecuária, apesar da quebra da produção de soja no Sul do país e a indústria extrativa;
  • e a normalização da economia, dado o afrouxamento das medidas restritivas relacionadas à Covid-19, que beneficia, principalmente, os serviços prestados às famílias.

Os serviços ainda não se recuperaram totalmente da crise causada pela pandemia, diz Xavier, da Tendências. Dados do IBGE apontam que, em dezembro, o nível de atividade era 11,7% inferior ao registrado em fevereiro de 2020, antes de a Covid-19 ganhar força.

Medidas de estímulo adotadas pelo governo

A adoção de medidas governamentais de estímulo, como o corte de 25% no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) podem dar mais alento à atividade econômico. Outras medidas que podem vir a ser tomadas são pacotes de crédito para micro e pequenas empresas e novos saques do FGTS.

Mas o economista da Tendências faz um alerta: apesar de o corte do IPI dar mais alento à atividade econômica, pode impactar nas contas de estados e municípios, que recebem pouco menos da metade da arrecadação do imposto.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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O que atrapalha o desempenho do PIB

Nova escalada na guerra

Uma nova escalada do conflito militar poderia impactar negativamente o desempenho econômico. Xavier diz que se a guerra se prolongar e as sanções forem intensificadas haverá impactos globais, com menor crescimento do PIB e afetando a demanda por produtos, como as commodities.

A XP Investimentos aponta que nesse cenário haveria uma maior aversão ao risco, o que tenderia a afastar os investidores dos mercados emergentes, levando ao enfraquecimento das economias da América Latina.

Desaceleração à vista a partir do segundo trimestre

As expectativas de analistas econômicos são de esfriamento da atividade econômica a partir do segundo trimestre. A XP Investimentos explica que níveis de renda deprimidos, inflação persistentemente alta e efeitos defasados do aperto da política monetária vão interromper a tendência ascendente verificada no último trimestre de 2021 e no primeiro de 2022. E, segundo o Bradesco, podem contaminar 2023.

Mais tempo convivendo com juros elevados

O brasileiro terá de conviver mais tempo com juros mais elevados, o que impacta negativamente na atividade econômica. Já há casas de análise falando que a Selic poderá ultrapassar 14% neste ano. Atualmente, a taxa está em 10,75%.

“A economia brasileira apresenta certa resiliência à guerra, mas o aumento da inflação e dos juros devem limitar o crescimento a partir do segundo semestre do ano”, apontam economistas do Bradesco.

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Eles lembram que o cenário ganhou contornos mais complexos e incertos. A pressão inflacionária, motivada pela alta das commodities, pode se estender por mais tempo. “A guerra na Ucrânia demanda cautela.”

Os efeitos sobre o petróleo já começam a ser sentidos no Brasil. Na quinta-feira (10), a Petrobras aumentou o preço da gasolina, do óleo diesel e do gás de cozinha nas refinarias. A alta chegou a 24,9%.

Horas depois o Congresso aprovou medidas para suavizar o impacto nos preços, mas ainda assim o próprio governo admite que parte da alta promovida pela Petrobras chegará às bombas.