Com o iminente afastamento da presidente Dilma Rousseff nos próximos dias, o ministro Nelson Barbosa deve encerrar suas atividades na Fazenda com saldo zero de aprovação de medidas no Congresso. Desde que assumiu o ministério, há mais de quatro meses, Barbosa assinou 9 projetos, com pelo menos 14 medidas em diferentes áreas, que precisam do aval dos parlamentares. Nenhum foi aprovado.
Com a crise política e o processo de impeachment de Dilma dominando as discussões no Legislativo, as propostas apresentadas com pedido de prioridade e anunciadas com destaque por Barbosa têm trâmite arrastado no Congresso. Nos bastidores, a atual equipe da Fazenda - que deve ser integralmente substituída em eventual gestão de Michel Temer - avalia que o peemedebista vai manter o encaminhamento de boa parte das propostas de Barbosa. Mas com uma vantagem: diferente de Dilma, contará com grande base de apoio no Congresso para aprová-las.
“O provável ministério de Temer está aderindo a propostas que já estão no Congresso, como ajuste fiscal mais gradual e limite para os gastos. Agora, eles vão usar como base o que já está proposto”, disse uma pessoa próxima a Barbosa. De saída, o ministro pretende deixar tudo organizado para quem chegar. “Não vai ter nada de terra arrasada”, completou a fonte, em referência a uma frase que vem sendo repetida por assessores de Temer.
Em fevereiro, Barbosa apresentou um pacote de medidas fiscais de curto e longo prazos. Mas o curto prazo acabou se alongando. Ao Congresso, o ministro solicitou a redução da meta fiscal deste ano, com abatimentos, permitindo que o rombo chegue a R$ 96,6 bilhões. A tramitação esbarra na esvaziada Comissão Mista de Orçamento (CMO), que não tem presidente nem membros eleitos para sua nova formação. Sem o aval do Congresso para a nova meta, o governo pode cair em shutdown, sendo obrigado a interromper até os gastos operacionais mais corriqueiros.
Também foram anunciadas propostas de readequação fiscal, como um sistema que limita despesas e cria mecanismos de corte de gastos no caso de não cumprimento desses limites. No mesmo projeto, Barbosa propôs a criação de um regime para preservar despesas essenciais em momentos de baixo crescimento da economia, além da proposta de alongamento das dívidas dos Estados com a União. Tramitando em regime de urgência, o texto pode pular a etapa de análise das comissões temáticas. Mesmo assim, segue parado no plenário da Câmara.
Para o secretário de Política Econômica da Fazenda, Manoel Pires, é evidente que o debate político colocou a agenda econômica em segundo plano. “Na conversa com parlamentares, é muito claro que é preciso passar essa confusão política para que as medidas sejam analisadas”, disse ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado. Ele pondera que a Fazenda também atuou com propostas que não dependem do aval do Congresso, como no setor elétrico, na área de infraestrutura e no setor imobiliário.
Pires destaca a importância do entendimento quase consensual de que o País precisa avançar na agenda fiscal proposta por Barbosa. Segundo ele, o atraso na tramitação das medidas pode ser prejudicial à economia, mas já há indicativos de que pautas como a mudança da meta vão avançar tão logo a discussão política seja superada. “O trabalho não para. Todo o trabalho tem sido feito e vai continuar sendo feito”, ressaltou.
Outra proposta de Barbosa, que busca aperfeiçoar o sistema de pagamento de precatórios, foi apresentada com a promessa de um incremento de R$ 12 bilhões ao resultado do governo. Mais de dois meses depois, não há nem sequer uma definição dos relatores que vão elaborar os pareceres nas comissões temáticas. Também aguarda análise a medida que permite o uso de parte do FGTS como garantia para obtenção de crédito consignado.
Na avaliação do líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), Barbosa fez o que era possível. “O presidente da Câmara (Eduardo Cunha), numa articulação com a oposição, só colocou na pauta o golpe”, afirmou, repetindo o discurso petista de desagravo a Dilma no processo de impeachment. O líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA), discorda. “A base do governo sempre foi majoritária para aprovar medidas, mas se recusava a evoluir nas propostas do governo. É o retrato da erosão da autoridade da presidente Dilma”, disse.