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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou em pronunciamento em rede nacional de rádio e televisão nesta quarta-feira (27), o pacote de corte de gastos que prevê uma economia de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos: R$ 30 bilhões em 2025 e R$ 40 bilhões em 2026.
A medida busca assegurar a sustentabilidade do arcabouço fiscal, que estipula déficit zero para as contas públicas em 2024.
Haddad destacou que o montante global das emendas parlamentares crescerá abaixo do limite das regras fiscais. Além disso, 50% das emendas das comissões do Congresso serão destinadas obrigatoriamente à saúde pública, fortalecendo o SUS.
“As medidas consolidam o compromisso deste governo com a sustentabilidade fiscal do país. Para garantir os resultados que esperamos, em caso de déficit primário, ficará proibida a criação, ampliação ou prorrogação de benefícios tributários”, afirmou o ministro.
O pacote também inclui mudanças nas regras do abono salarial e do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Para equilibrar os cortes considerados impopulares, foi anunciada uma benesse: a ampliação da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, uma promessa de campanha de Lula.
O benefício será contrabalançado por um aumento na taxação dos contribuintes mais ricos.
“Reafirmamos nosso compromisso com as famílias brasileiras: proteger o emprego, aumentar o poder de compra e assegurar o crescimento sustentável da economia. Honrando os compromissos assumidos pelo presidente Lula, estamos promovendo a maior reforma da renda de nossa história. Com a aprovação dessa reforma, uma parte importante da classe média, que ganha até R$ 5 mil por mês, não pagará mais Imposto de Renda”, declarou Haddad.
O anúncio do pacote e da isenção gerou divisões na equipe econômica, conforme apurado nos bastidores. Alguns integrantes teriam alertado para o impacto negativo na comunicação, com receio de que a combinação de cortes e concessões reduzisse a credibilidade do ajuste fiscal.
Desde a manhã desta quarta-feira, o vazamento sobre a ampliação da isenção do IR já repercutia no mercado financeiro. O dólar atingiu a cotação máxima de R$ 5,9288 e encerrou o dia em R$ 5,912, o maior valor desde 2020. O Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores (B3), fechou em baixa de 1,73%, a 127.668 pontos.
Analistas de mercado criticaram a medida, afirmando que ela reduz a credibilidade do ajuste fiscal e aumenta o risco de desequilíbrio nas contas públicas. “O governo cortou de um lado e abriu novas despesas de outro”, resumiram.
O anúncio de Haddad encerra uma novela que se arrastava há mais de um mês. A proposta inicial seria divulgada logo após o segundo turno das eleições municipais, em 27 de outubro, mas sofreu sucessivos adiamentos.
Antes do pronunciamento, Haddad apresentou a proposta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, aos presidentes da Câmara e do Senado e a líderes partidários.
Veja o que foi anunciado no pacote que prevê corte de gastos
Reajuste do salário mínimo
O ministro anunciou que o salário mínimo será reajustado de forma "sustentável". Isso significa um ganho real limitado entre 0,6% e 2,5%, de acordo com o intervalo de crescimento das despesas do arcabouço fiscal. Atualmente, a regra considera o reajuste pela inflação e o aumento do PIB de dois anos anteriores.
Isenção do IR
A faixa de isenção do Imposto de Renda, atualmente em R$ 2.824,00 por mês, será ampliada para R$ 5.000,00. Segundo a Warren Investimentos, a mudança terá um custo de pelo menos R$ 45,8 bilhões. “Esse cálculo é otimista, vale dizer, pois considera que a tabela do Imposto de Renda seria modificada garantindo-se a focalização do benefício apenas aos contribuintes de renda mais baixa”, afirmou Felipe Salto, economista-chefe da consultoria.
Taxação de super-ricos
Como forma de compensação, o ministro anunciou um aumento no Imposto de Renda para quem ganha mais de R$ 50 mil mensais, mas não revelou o percentual exato. “Tudo sem excessos e respeitando padrões internacionais consagrados”, destacou o ministro.
Benefícios dos militares
Embora sem detalhar as medidas, o ministro confirmou que haverá mudanças na reserva remunerada das Forças Armadas. Uma das alterações pode incluir a fixação de uma idade mínima de 55 anos para que o militar passe à reserva remunerada. Atualmente, o único critério é o tempo de serviço, de pelo menos 35 anos, sem exigência de idade mínima. Também está em estudo a cobrança de uma contribuição de 3,5% para o fundo de saúde dos militares.
“Para garantir que as políticas públicas cheguem a quem realmente necessita, vamos aperfeiçoar os mecanismos de controle, que foram desmontados no período anterior. Fraudes e distorções atrasam o atendimento a quem mais precisa. Quanto às aposentadorias militares, promoveremos mais igualdade, com a instituição de uma idade mínima para a reserva e a limitação de transferências de pensões, além de outros ajustes. São mudanças justas e necessárias”, afirmou o ministro.
Combate aos supersalários
O governo manifestou apoio à limitação dos chamados "supersalários" no funcionalismo público. Um projeto de lei que trata do tema está em análise no Senado há três anos. A estimativa é de que a medida possa gerar uma economia de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões por ano. No entanto, o cálculo do Movimento Livres questiona esse potencial de economia. Segundo o think tank, a proposta permite que 32 “penduricalhos” continuem sendo pagos aos servidores sem que sejam submetidos ao teto constitucional.