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Empresa da China

Governo Bolsonaro se divide sobre Huawei no 5G: saiba quem é quem na disputa

Qual é a posição do governo Bolsonaro sobre a participação da Huawei no 5G brasileiro
Visitante mexe no telefone no stand da Huawei durante o Congresso Mundial de Telefonia Celular de 2016, em Barcelona, Espanha. (Foto: Lluis Gene/AFP)

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A liderança da empresa chinesa Huawei na tecnologia 5G pôs o presidente Jair Bolsonaro em uma saia justa política. Pressionados pelos Estados Unidos, que acusam a Huawei de atuar como um instrumento de espionagem do governo chinês, vários países do mundo decidiram proibi-la de fornecer equipamentos para as futuras linhas da telefonia de quinta geração. Mas o Brasil, dependente do comércio com a China, se vê num impasse em barrar a companhia chinesa do leilão do 5G brasileiro, marcado para o ano que vem.

E essa situação se reflete no racha interno dentro do próprio governo sobre que atitude tomar. A ala ideológica pretende alinhar o Brasil aos Estados Unidos, barrando a Huawei. Do outro lado, com tendência a serem a favor de não restringir a companhia chinesa, estariam o vice-presidente Hamilton Mourão e os ministros Paulo Guedes (Economia) e Teresa Cristina (Agricultura).

Entre os governos que decidiram proibir a Huawei estão Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Índia e Japão. O Reino Unido havia imposto um teto de até 35% na participação da Huawei em suas redes de 5G, mas há expectativa de que as restrições evoluam para banimento. Alemanha, França e Espanha, por sua vez, optaram por não restringir a atuação da companhia até agora.

Oficialmente, governo evita se posicionar sobre Huawei...

No Brasil, essa decisão será de Bolsonaro, a quem caberá a edição de um decreto sobre o tema. Como toda política pública, cabe aos ministérios envolvidos opinar sobre o assunto, pois a decisão, qualquer que seja, terá que ter respaldo técnico, legal e jurídico.

Pasta mais diretamente relacionada ao assunto, o recém-criado Ministério das Comunicações evita se posicionar. "A eventual imposição de limitações a um fornecedor de equipamentos de telecomunicações perpassa diversos órgãos de governo para além do Ministério das Comunicações, como o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o Ministério da Economia e o Ministério das Relações Exteriores, cabendo a decisão final ao presidente", informou a pasta.

O mesmo ocorre com vários outros ministérios. A reportagem procurou sete pastas na última semana para perguntar a opinião deles sobre o tema. O GSI e os ministérios da Economia, da Agricultura e de Ciência, Tecnologia e Inovações preferiram não comentar, assim como a Casa Civil – a quem cabe reunir a posição dos diferentes ministérios. O Ministério de Relações Exteriores não respondeu aos questionamentos da reportagem.

... Mas nos bastidores há uma "guerra" interna no governo

Se publicamente os ministérios não se pronunciam sobre o tema, nos bastidores há uma "guerra" sobre o tema. O ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ligado à ala ideológica, tem deixado clara sua posição a favor de um alinhamento aos Estados Unidos e contrário à China em suas redes sociais. Sobre a pandemia do novo coronavírus, chamado por ele de "comunavírus" ele considera haver um plano para implantar o comunismo em organismos internacionais.

Por outro lado, o vice-presidente Hamilton Mourão já deixou claro ser contra qualquer restrição à Huawei. No ano passado, ele viajou à China, onde se encontrou com o vice-presidente da companhia e reiterou haver um clima de confiança com o país asiático.

O tema também preocupa a ministra da Agricultura, Teresa Cristina, já que a China é o principal destino das exportações agrícolas do Brasil. Qualquer barreira à Huawei pode ter consequências diretas sobre o agronegócio brasileiro.

Liberal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem dito que quer as três fornecedoras – além da chinesa Huawei, a sueca Nokia e a finlandesa Ericsson – competindo para oferecer o melhor serviço ao país.

Além do racha interno sobre a Huawei, o Planalto pode ter de enfrentar um componente a mais para dificultar a decisão: a Câmara dos Deputados.

O Legislativo pretende entrar no debate sobre a segurança das redes 5G – e, em princípio, a movimentação é para não barrar a empresa chinesa. Presidente da Comissão de Agricultura e das Frentes Parlamentares Brasil-China e dos Brics, o deputado Fausto Pinato (PP-SP) afirma que a decisão deve ser tomada em conjunto entre Executivo e Legislativo.

"Vou sugerir ao presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) que crie uma comissão para darmos transparência total a esse processo de 5G no nosso país. Temos que visar o que realmente seja o melhor pro Brasil", diz Pinato.

Ele afirma que o Brasil deve tomar a melhor decisão em termos econômicos e tecnológicos no que diz respeito ao 5G, "independente de ideologias". "Se não há consenso sobre o que fazer, vamos fazer um debate franco", afirmou. Para Pinato, a ala ideológica está levando o governo "para o buraco". "O vice-presidente e a ministra Teresa Cristina não vão aceitar isso", acrescenta. "A China não é nenhuma santa, mas os EUA têm interesse nessa causa. Não podemos fazer algo só porque o Trump disse."

O que os EUA afirmam sobre a Huawei

Os Estados Unidos têm intensificado movimentos contrários à chinesa Huawei e pressionado operadoras de telefonia em todo o mundo. Declarações públicas do secretário de Estado norte-americano, Michael Pompeo, foram distribuídas pela Embaixada dos Estados Unidos no Brasil com esse teor.

Em nota oficial, Pompeo defende a adoção de "fornecedores confiáveis" para o 5G. "A maré está se voltando contra a Huawei à medida que cidadãos de todo o mundo estão acordando para o perigo do estado de vigilância do Partido Comunista Chinês", afirma.

O secretário de Estado americano cita medidas anunciadas pela República Checa, Polônia, Suécia, Estônia, Romênia, Dinamarca, Letônia e Grécia. Ele menciona ainda iniciativas adotadas por teles na França, Índia, Austrália, Coreia do Sul, Japão, Reino Unido e Canadá. A nota destaca ainda que a Telefônica, dona da Vivo, também teria se comprometido a não usar equipamentos de fornecedores "não confiáveis".

Além da pressão dos Estados Unidos, uma série de fatores pesam contra a Huawei. Embora seja uma empresa privada, por ter capital fechado ela não tem o mesmo grau de transparência das nórdicas Ericsson e Nokia – listadas em bolsa e com balanço auditado por empresas independentes.

Além disso, a Huawei está submetida, na China, à Lei de Inteligência Nacional, de 2017, segundo a qual toda organização deve apoiar e cooperar com a inteligência do Estado. Para os críticos, essa legislação obrigaria as empresas que atuam no país a repassar informações ao comando do Partido Comunista, dentro e fora da China.

EUA não têm grande fornecedor de 5G

Curiosamente, os Estados Unidos, que exerce a pressão para barrar a Huawei, não têm um grande fabricante de tecnologia 5G. Os norte-americanos contam principalmente com os serviços das duas empresas nórdicas.

A Lucent, empresa americana que estava no ramo, foi comprada pela francesa Alcatel e, depois, pela Nokia. A Motorola saiu do mercado. E a Standard Electric, que inclusive tinha fábrica e escritório no Rio de Janeiro, saiu do negócio de telecomunicações. As americanas Cisco e a Qualcomm permanecem no setor, mas não fazem equipamentos centrais de 5G.

Brasil corre risco de espionagem se escolher a Huawei?

Juarez Quadros, ex-presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e ex-ministro das Comunicações, tem uma visão realista sobre o risco de o Brasil ser espionado dependendo do fornecedor da tecnologia 5G que vier a escolher. "Todos poderiam espionar. A verdade é que temos de proteger as redes de telecomunicações a evitar situações de conflito. Então teríamos que impor salvaguardas que protejam o Brasil desse risco", afirma.

Quadros avalia que o ideal seria o governo elaborar uma política pública que estabeleça protocolos de segurança de modo a evitar conflitos geopolíticos. "Se é para restringir, que se façam os atos necessários, porque estão ausentes leis, decretos e portarias nesse sentido. E é preciso ter embasamento legal e jurídico para uma decisão como essa."

O presidente da consultoria Teleco, Eduardo Tude, afirma que a pressão norte-americana vai contra a cadeia de suprimento global do setor e, se for bem-sucedida, certamente levará a aumento de preços. Ele destaca que a americana Apple, por exemplo, produz o iPhone na China. "Voltar a uma fase pré-globalização, em que cada país produz seu equipamento, reduz os ganhos de escala. Isso vai se refletir em preços mais altos. Será pior para todos", diz o analista.

Na avaliação dele, o Brasil tem muito a perder caso se curve à pressão dos Estados Unidos. "Não vejo por que não devamos resistir. A política externa brasileira deve buscar uma posição de neutralidade. Numa briga de gigantes, não devemos nos posicionar de um lado ou de outro", afirma.

Governo não editou até agora nenhuma regra para barrar a Huawei

Mesmo com a pressão norte-americana e a liderança chinesa no 5G, até agora o governo não editou nenhuma norma que restrinja a atuação da Huawei no Brasil.

Em março, o GSI editou uma Instrução Normativa (IN) sobre segurança cibernética, com requisitos mínimos para o 5G. Entre as diretrizes está a garantia da integridade, confidencialidade e privacidade. A norma do GSI também orienta as operadoras a contratar, dentro de uma mesma área geográfica, equipamentos de, no mínimo, dois fornecedores distintos. A prática, no entanto, já é adotada pelas principais teles brasileiras para 2G, 3G e 4G, por estratégia comercial. Essa Instrução Normativa está em análise na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Também está na Anatel a análise do edital do leilão do 5G, pelo direito de explorar frequências para transmitir o sinal. A disputa é restrita às teles – como Claro, Vivo, TIM, Oi e Algar, além de prestadores de pequeno porte – e não diz respeito a equipamentos usados.

Apesar das promessas de que o leilão do 5G ficaria para 2020, internamente, a Anatel sempre trabalhou com o prazo de 2021, corroborado pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria.

Nos bastidores, as teles são contra a restrição de atuação da Huawei no Brasil, onde a empresa chinesa já está há 20 anos. A estimativa é que a chinesa esteja presente em algo entre 40% e 50% das redes do país. Além disso, boa parte da estrutura atual pode ser reaproveitada no 5G.

O que a Huawei diz

A Huawei se defende das acusações e afirma nunca ter tido incidentes relacionados à segurança em 30 anos de operação em mais de 170 países.

A empresa, que atua há 22 anos no Brasil, afirma que preza pela segurança e que fornece equipamentos para mais de 500 operadoras em todo o mundo, além de ter fechado 91 contratos de 5G no primeiro trimestre deste ano. "A segurança cibernética e privacidade do usuário são o principal foco de atenção da Huawei", informa.

Sobre a suspeita de praticar espionagem, a Huawei afirma que suas soluções "estão de acordo com as leis de cada país em que atua" e que não trabalha "com qualquer governo ou instituição no sentido de criar 'backdoor' para produtos ou serviços". A Huawei informa que tem trabalhado para achar formas de "gerenciar" as restrições propostas pelos EUA.

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