Ouça este conteúdo
Os setores de mineração e petróleo estão preocupados com o texto da reforma tributária (PEC 45/2019) previsto para ser votado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado nesta terça-feira (7).
Na avaliação de representantes e especialistas dessas áreas, a proposta pode desestimular investimentos no país, afetar a competitividade das exportações e encarecer produtos para o consumidor final.
O relator da reforma tributária no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), decidiu incluir esses dois setores na lista do imposto seletivo, apelidado de "imposto do pecado", com uma alíquota de 1%.
O imposto seletivo, uma criação da reforma tributária, tem como premissa tributar produtos tidos como nocivos ao meio ambiente e à saúde – e que por isso teoricamente devem ter produção e consumo desestimulados.
A questão é que o tributo afeta em cheio dois dos principais produtos de exportação do país – minério de ferro e petróleo – e que envolvem investimentos pesados em exploração e produção. Além disso, o aumento da tributação tende a chegar, por exemplo, ao preço dos combustíveis na bomba.
Fontes do setor e especialistas argumentam que, por mais que o relator da reforma possa considerar meritório um desestímulo à produção de petróleo, o fato é que a transição energética rumo a fontes mais limpas de energia é um processo longo.
Com isso, por muito tempo o país precisará dessa matéria-prima tanto para mover sua frota de veículos quanto para a geração de eletricidade em termelétricas movidas a gás, diesel, óleo combustível e carvão mineral.
O objetivo declarado da reforma tributária é simplificar a tributação brasileira, uma das mais complexas e onerosas do mundo. Para isso, propõe a criação de um novo tributo, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que substituiria os impostos federais, estaduais e municipais sobre o consumo.
O IVA será dividido entre Contribuição sobre Bens e Serviços, o CBS, que compilaria os impostos federais (PIS, Cofins e IPI); e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), substituto de taxas municipais e estaduais (ISS e ICMS).
Mas, com o acréscimo pelo Congresso de inúmeras exceções, de setores e produtos com tributação reduzida, a alíquota-padrão tende a ficar cada vez maior.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a alíquota-padrão pode chegar a 27,5% – e alguns consultores econômicos acreditam que ela possa ficar bem acima disso.
Relator da reforma, Eduardo Braga disse em entrevista à revista "Exame" que a desoneração dos investimentos prevista na reforma tributária justifica a criação da alíquota de até 1% de imposto seletivo sobre a extração de petróleo e minérios.
O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), entidade que representa o setor no país, publicou nota afirmando que apoia a reforma, mas que seus associados mostram preocupação com o imposto seletivo. Segundo o IBP, a alíquota pode dificultar a atração de investimentos e impor um custo que chegará aos consumidores.
“A competitividade do petróleo brasileiro será afetada, causando impacto negativo na balança comercial, já que o óleo cru é um importante item da pauta de exportação. A incidência do imposto seletivo afetará ainda projetos em campos maduros e de acumulações marginais, que tiveram expressivo aumento de produção nos últimos anos", diz o texto.
Para o IBP, não faz sentido jurídico e econômico onerar o setor com o imposto seletivo, na medida em que o combustível já é muito tributado. “O possível aumento do preço dos combustíveis impactará diretamente toda a sociedade, sobretudo com a alta na inflação, devido ao seu peso significativo nas cadeias econômicas de consumo”, diz o instituto.
Para o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), se a reforma for aprovada como está, prejudicará “sobremaneira setores importantes para a economia que produzem bens primários e semielaborados, que são a base de inúmeras outras indústrias e cadeias produtivas”.
Segundo eles, o imposto seletivo não deveria incidir sobre mineração, porque o setor já é onerado por meio de royalties – a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM).
O ex-ministro Raul Jungmann, hoje diretor-presidente do Ibram, alerta que o produto brasileiro pode ficar mais caro e perder competitividade.
"Definir a incidência da tributação no destino das operações contraria os princípios básicos da reforma – e, na prática, onera as exportações de setores econômicos, como a mineração, entre outros efeitos danosos ao setor”, escreveu Jungmann em rede social.
Marcio Felix, presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás e seus associados (ABPIP), ressalta que todo aumento de taxa recaí diretamente na alta da carga tributária a curto prazo. A médio e longo prazos pode resultar na perda de investimentos e espaço na disputa global de mercado, diz.
“O imposto seletivo tem esse efeito. Até que se entenda qual será sua regulamentação, afetará o apetite dos investimentos. Nas próximas semanas teremos leilão de áreas exploratórias, e isso (efeito do imposto) já será um termômetro”.
Félix também aponta que a cobrança a mais no segmento vai contra a política de segurar o preço do petróleo sustentada pelo governo até agora:
“Está confuso. Vemos várias medidas para segurar o preço (combustível), incentivo a carros elétricos, entre outros, e agora essa taxa (1%). Precisa de um ponto de equilíbrio”.