Quando tudo parecia relativamente sob controle para as empresas brasileiras apesar do tamanho da crise financeira nas economias centrais , as incertezas ganharam dimensão muito maior em razão da descoberta de que algumas companhias fizeram operações alavancadas de derivativo cambial, perdendo somas significativas com a valorização do dólar. Pelo menos duas empresas, Sadia e Aracruz, vieram a público assumir prejuízos com essas operações financeiras, que deveriam ser usadas para a proteção contra a variação cambial. Somente a Sadia teve prejuízo de R$ 760 milhões. A Aracruz não informou o valor.
Até a semana passada as ações das empresas caíam, mas os analistas e especialistas falavam que os fundamentos eram bons e os lucros do terceiro trimestre estavam garantidos para a maioria delas. Acreditava-se que o desafio para as empresas brasileiras vinha do front externo, com o enxugamento da liquidez internacional e as preocupações sobre o desempenho da economia global. Esses dois componentes já eram suficientes para plantar a incerteza quanto à capacidade de financiar os investimentos previstos e à possibilidade de retorno embutida.
Essa cautela era, no entanto, amenizada pelo baixo endividamento e boa capitalização das companhias. Olhando para o caixa disponível no final de junho, último dado divulgado em balanços, as empresas mais importantes dos setores de mineração, siderurgia, energia, celulose, transportes, telecomunicações e alimentos tinham dinheiro suficiente para bancar os investimentos já anunciados até o final do ano, sem necessidade de recorrer a captações externas, que se tornaram muito caras.
O problema é que agora ninguém tem certeza de que esses caixas não serão comprometidos em razão de prejuízos financeiros, que possam vir a ser liquidados. Na sexta-feira, os analistas ficaram em polvorosa, tentando obter informações com diretores de relações com investidores sobre as empresas que acompanham. Perto de uma dúzia de companhias saiu a público para declarar que não faz especulação com hedge cambial. Mesmo assim, a dúvida prevaleceu: o número de empresas que se manifestou foi pequeno e não existe outra forma de obter esse tipo de informação. Não é obrigatório que o balanço mostre abertamente operações com derivativos.
Algumas entidades representantes dos investidores e do mercado de capitais iniciam um movimento para cobrar das companhias abertas a antecipação da adoção da convergência das normas contábeis ao padrão internacional, o IFRS, que só será obrigatória a partir de 2010. A nova legislação prevê mais transparência das informações financeiras nos demonstrativos de resultados, incluindo a divulgação de contratos de derivativos.
Setembro também trouxe importantes mudanças para o cenário macroeconômico global, após meses de intensa preocupação com a elevada inflação derivada dos choques de commodities e alimentos e com a possibilidade real de recessão no mundo desenvolvido. Além de mudar o viés das políticas monetárias mundo afora, fez aumentarem as dúvidas sobre a resistência das economias emergentes a choques externos, como os decorrentes da crise financeira internacional, e também sobre o papel desses países como motores de crescimento global.
O agravamento da crise nas últimas semanas obrigou os presidentes de bancos centrais a colocarem a estabilidade financeira acima de todos os objetivos de suas políticas monetárias.