São Paulo A indústria de bebidas alcoólicas, às voltas com um projeto do Ministério da Saúde com restrições à publicidade e sob pressão de ONGs que a consideram vilã da saúde, quer usar a publicidade para mudar essa imagem. Para isso, pretende ir além do aviso "beba com moderação" em suas campanhas. Esta semana, entram no ar em rede nacional duas campanhas com esse mote: a da cerveja Brahma, que tem como garoto-propaganda o cantor Zeca Pagodinho, e a da vodca Smirnoff, com o slogan "Uggo não!" uma referência aos efeitos da bebedeira.
Há duas semanas, a AmBev já vem veiculando uma nova campanha da cerveja Antarctica, em que a protagonista, a atriz Juliana Paes, tentava tirar uma grande mala da mesa do seu bar. A mensagem era clara: se beber demais, a pessoa vira uma "mala". Agora, na campanha da Brahma, Zeca Pagodinho lista uma série de comportamentos não aconselháveis como dirigir após exagerar na bebida e no final emenda com a frase: "Se você não sabe beber, não tome Brahma. Tome juízo, sujeito."
Embora as campanhas publicitárias com mensagens de consumo responsável já sejam veiculadas desde 2001, foi neste ano que elas ficaram mais explícitas. "Havia uma crítica de que nós não colocávamos as mensagens de consumo responsável nas falas dos garotos-propaganda. Hoje, isso já ocorre", diz Milton Seligman, diretor de assuntos corporativos da AmBev. O executivo reconhece que a campanha de consumo consciente com Zeca Pagodinho é uma resposta às críticas do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, que recentemente disse que gostaria de ver uma campanha em que o cantor apresentasse uma mensagem mais responsável. O publicitário Nizan Guanaes, da agência Africa, que assina a campanha junto com Eduardo Martins e Carlos Fonseca, garante que não poderia haver melhor garoto-propaganda para a campanha da Brahma. "Zeca é um trabalhador, deu importante contribuição cultural para o país e é um sujeito de bem. É o melhor porta-voz para dizer isso às massas."
A campanha "Uggo não!", da Smirnoff marca da multinacional Diageo , é uma tentativa de se aproximar mais do público entre 20 e 35 anos. Segundo Walter Celli, gerente de marketing da Smirnoff, as peças, criadas pela agência JWT Brasil, apresentam os riscos do consumo excessivo de álcool em uma linguagem mais acessível.
"Procuramos deixar de lado o tom professoral e o discurso de utilidade pública. Preferimos contextualizar as conseqüências do consumo excessivo de álcool no dia-a-dia", diz. Segundo Celli, nesse ponto a campanha se diferencia de outras feitas pela indústria de bebidas no país, com os motes "beba com moderação" e "se beber, não dirija".
Porém, para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e autor de uma recente radiografia sobre o alcoolismo no país, essas campanhas responsáveis "não passam de jogo de cena" das empresas. Segundo ele, a propaganda mostra apenas o lado festivo da bebida o que atrai o interesse do jovem e pode efetivamente incitá-lo a consumir. "A publicidade mostra festa, glamour, e a mensagem do consumo responsável fica diluída."