Os preços de alimentos e bebidas aumentaram, em média, 9,54% entre janeiro e setembro, segundo o IBGE.| Foto: Marcelo Andrade/Arquivo/Gazeta do Povo
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As despesas com comida ficaram bem maiores neste ano. A inflação média de alimentos e bebidas foi de 9,54% no acumulado de janeiro a setembro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É o maior aumento para o período desde a adoção do real, em 1994. A alimentação no domicílio ficou 10,89% mais cara, segundo o IBGE.

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Os fatores que provocaram a inflação dos alimentos

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Uma série de fatores contribuiu para as fortes altas nos preços de alimentos. As raízes do problema estão na pandemia. Para tentar evitar um drástico desaquecimento da atividade econômica, foram concedidos estímulos por parte dos governos, o que favoreceu e sustentou o consumo.

Na sequência, formou-se o que o coordenador de preços da Fundação Getulio Vargas (FGV), André Braz, chama de “tempestade perfeita”. Ele se refere a problemas climáticos, a partir de 2021, que complicaram a situação de culturas tão diferentes quanto café, milho e soja, e a invasão russa na Ucrânia, que afetou cadeias importantes do agronegócio, como a do trigo e a dos fertilizantes.

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“Tivemos um problema hídrico grave, com o estabelecimento de uma bandeira tarifária para a energia mais elevada”, lembra Tatiana Nogueira, economista da XP Investimentos. Isto afetou a produção de alimentos por meio da elevação de custos.

Outro fator que trouxe preocupação, segundo ela, foram os impactos do “La Niña”, o fenômeno climático caracterizado pelo resfriamento anormal das águas do Oceano Pacífico Central.

Outro problema veio com o aumento nos custos da produção, em decorrência da guerra na Ucrânia. Além de dificultar a produção e o escoamento de produtos como milho e trigo, o fornecimento de fertilizantes da Rússia e de Belarus (aliado dos russos no conflito) foi restringido. “Isto também acabou tendo impacto na inflação”, diz Thomás Gibertoni, gerente de portfolio da Portofino Multifamily Office.

Não bastasse isso, há fatores sazonais. “A partir de outubro e durante o verão, o clima fica mais hostil”, diz Braz. Isto impacta principalmente na produção de hortifrutigranjeiros.

Leite e derivados: os vilões mais recentes

Os mais recentes vilões da alta de preço foram o leite e seus derivados, que tiveram variação de 31,56% até setembro. Os destaques foram o leite longa vida (50,73%), o leite condensado (31,12%) e a manteiga (22%).

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A analista Natália Grigol, do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo (Cepea-USP), informou em relatório publicado em agosto que, além da entressafra, o setor enfrentaria um enxugamento mais drástico de oferta devido à combinação de uma seca mais intensa e de mudanças estruturais no campo, desencadeadas pelos menores níveis de investimento e pelo aumento nos custos de produção nos últimos anos.

A tendência para a inflação daqui em diante

A tendência, daqui para a frente, é de altas mais comportadas nos preços dos alimentos. Se, por um lado, o clima é menos favorável para os alimentos in natura, de outro o preço das principais commodities agrícolas tende a desacelerar porque o mundo está crescendo menos que o esperado.

“A pressão inflacionária em todo o mundo está levando ao aumento nos juros, o que leva ao desaquecimento da atividade econômica”, diz Braz, da FGV. Um dos efeitos é o consumo menor de commodities.

O Banco Mundial projeta queda de 4,5% nos preços das commodities agrícolas no próximo ano. A expectativa da instituição é de que caiam os preços de culturas como soja, milho, cacau, trigo e café.

Mesmo assim, os preços da maioria das commodities continuarão acima da média histórica, aponta publicação do banco. E inúmeras incertezas ainda podem mudar essas projeções, como:

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  • interrupções no fornecimento de energia;
  • deterioração das perspectivas econômicas globais, como resultado de uma eventual aceleração do aperto monetário nas principais economias e de uma valorização adicional do dólar;
  • clima adverso (um possível La Niña pelo terceiro ano consecutivo); e
  • medidas restritivas ao comércio internacional.

Outras preocupações, segundo a economista da XP, são a produção agrícola ucraniana, que só conseguiu plantar 40% da área habitual; a evolução dos preços das commodities energéticas; e a reorganização dos estoques na China, um dos maiores consumidores mundiais de alimentos.

"Os estoques das principais commodities agrícolas também estão apertados", cita Patrícia Krause, economista-chefe para a América Latina da seguradora de crédito Coface.

Boa safra é fonte de ânimo

No Brasil, há um fator que ajuda a amenizar essas preocupações. É a perspectiva de uma boa safra brasileira para 2022/23. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que a produção poderá superar 300 milhões de toneladas, 16% mais que no ciclo anterior.

Segundo Nogueira, nos meses seguintes à colheita, esse avanço poderá se refletir nos preços da proteína animal, principalmente suína e aves, uma vez que soja e milho são matérias-primas da ração.

Tendências para a inflação

Depois de três meses seguidos de deflação, os preços devem ter voltado a subir em outubro. Um termômetro disso é o resultado do IPCA-15, a previa da inflação, que mostrou uma elevação de 0,16% no mês e de 6,85% no período de 12 meses. “A expectativa é de que [a inflação mensal] continue em patamares baixos”, diz a economista da XP.

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Outro sinal vem das projeções para a inflação em 2022 apuradas pelo Banco Central e que constam do boletim Focus. Embora o ponto médio das expectativas tenha oscilado para cima na última medição (de 5,60% para 5,61%), ele havia recuado fortemente ao longo das 17 semanas anteriores.

Itens como alimentação e bens industriais, vilões dos preços antes do ciclo de deflações, tendem a pressionar menos nos preços, apontam os economistas ouvidos pela Gazeta do Povo.

Por outro lado, os serviços continuam sendo uma das principais fontes de preocupação. “O nível de atividade está demorando para desacelerar”, afirma Nogueira. Segundo o IBGE, nos 12 meses encerrados em setembro, o volume de serviços prestados foi 8,9% maior do que o registrado em período anterior.

Outra preocupação vem dos itens administrados. Beneficiados pelo corte nas alíquotas do ICMS sobre combustíveis, energia, telecomunicações e transporte público, os preços devem cair mais de 4% neste ano. Mas um cenário que preocupa são as commodities energéticas, como o petróleo. Recentemente, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) anunciou um corte na produção devido às incertezas na demanda global.

Segundo Krause, da Coface, também é preciso ver se a inflação lá fora vai persistir. Algumas das principais economias globais estão enfrentando este problema. Nos Estados Unidos, nos últimos 12 meses, os preços aumentaram 8,2%. Na área do euro, a alta é maior: 10,7%. E no Reino Unido, 10,1%, a maior em 40 anos.

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Outra questão relevante, segundo o professor Denis Medina, da Faculdade do Comércio de São Paulo (FAC-SP), é o futuro do arcabouço fiscal por parte do governo eleito. “Existe ainda muita indefinição. Os vencedores na eleição ainda não apresentaram seu programa econômico”, diz. Sem a manutenção do rigor fiscal, a tendência é de que a dívida pública aumente com mais força.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]