Na semana passada, o Comitê de Política Monetária (Copom) tirou meio ponto da taxa básica de juros, a Selic, reduzindo-a para 12% ao ano, argumentando, entre outros pontos, que "o balanço de riscos para a inflação" havia se tornado "mais favorável" e que "um ajuste moderado no nível da taxa básica é consistente com o cenário de convergência da inflação para a meta em 2012". No entanto, os dados do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), levam especialistas a divergir sobre a avaliação do Copom: a inflação de 0,37% em agosto fez o acumulado dos últimos 12 meses chegar a 7,23%, a taxa mais alta desde junho de 2005. O Banco Central, no entanto, alega que já considerava o avanço em sua análise.
INFOGRÁFICO - Calcule sua inflação em agosto de 2011
Para o coordenador de Análises Econômicas da Fundação Getulio Vargas (FGV), Salomão Quadros, o teto da meta de inflação do governo, 6,5% ao ano, ficou muito difícil de ser atingido, tendo em vista as pressões ainda existentes de aumentos de preços no varejo para os próximos meses. "Tem espaço ainda; mas ficou bem mais difícil", avalia.
O especialista vê, na decisão do Copom, uma "ruptura" no código de comunicação entre mercado e Banco Central. Isso, na prática, não conduz a um efeito imediato na taxa acumulada do IPCA, mas Quadros admite que a decisão do BC mexeu com as expectativas inflacionárias, que são formadas a partir da comunicação entre o banco e o mercado. "Toda vez que o BC toma decisões que fogem do padrão, o mercado se assusta. Esta decisão [de corte da Selic] pode até se mostrar correta futuramente, mas eu esperaria que fosse tomada de uma forma mais gradativa. Do modo como ocorreu, dá margem a muitas interpretações", afirma.
Preços "comportados"
Ao contrário de Quadros, o professor de Economia do Ibmec Rio de Janeiro Mauro Rochlin acredita que a inflação fechará o ano em torno de 6,3%, abaixo do teto da meta. "A inflação esteve bastante comportada nos últimos meses e acredito que o acumulado dos últimos 12 meses seja um efeito ainda do fim de 2010 e início deste ano, quando a alta nos preços das commodities pressionou os alimentos no Brasil", argumenta. Rochlin também diz que os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre levam a crer que a inflação fechará na meta. "Os investimentos [com alta de 1,7%] vêm crescendo acima do consumo das famílias [1%]. A pressão de preços pela demanda, portanto, não deve ocorrer", observa.
Sem surpresas
Para o Banco Central, o número não foi uma surpresa. Diretores do BC já trabalhavam com uma inflação maior em agosto na comparação com julho. Embora o índice projetado não seja divulgado, sabe-se que o BC esperava uma inflação ligeiramente maior que a anunciada. No início de agosto, o presidente do BC, Alexandre Tombini, já havia dito publicamente que a inflação acumulada atingiria o ápice em agosto.
Em linha com os analistas, o BC também reconhece que a inflação de setembro deverá ser maior que a observada no mês passado. Na pesquisa Focus divulgada anteontem, a mediana das projeções para o IPCA de setembro atingiu 0,40%. O cenário, porém, não anula ou invalida a avaliação da direção do BC de que a inflação acumulada começará a desacelerar em breve. Por isso, continua valendo a previsão dada por Tombini: o IPCA acumulado em 12 meses cairá dois pontos porcentuais entre setembro de 2011 e abril de 2012.