O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) publicou no último dia 28 de dezembro uma instrução normativa que modifica as regras de concessão de crédito consignado para aposentados e pensionistas, aquele descontado diretamente do benefício. Segundo o presidente da autarquia, Edison Garcia, que deixará o cargo em breve e ainda não tem substituto indicado pelo novo governo de Jair Bolsonaro, as modificações foram feitas para reduzir o assédio de bancos a aposentados e pensionistas e também para dificultar o uso indevido de informações sigilosas pelas instituições financeiras. Os bancos, que participaram das discussões sobre a nova normativa, terão 90 dias para se adaptar às novas regras.
Pela nova normativa, as instituições financeiras ficam proibidas de fazer qualquer ação de marketing ativo, oferta comercial ou proposta que tente convencer o segurado a firmar contratos de empréstimos pessoal e cartão de crédito pelo prazo de seis meses após a concessão do benefício. Ainda em 2017, o jornalista Lúcio Vaz, colunista da Gazeta do Povo, investigou como esse assédio funcionava e como mailings com dados de pessoas que muitas vezes nem sabiam ainda que tinham tido o benefício aprovado iam parar na mão de corretores e atendentes de bancos e financeiras.
LEIA TAMBÉM: Planos de saúde terão cinco mudanças em 2019
A normativa também estabelece que, mesmo que o beneficiário queira contratar um empréstimo desse tipo só poderá fazer isso após 90 dias de recebimento do benefício. Só após esse período, o aposentado, pensionista ou representante legal poderá solicitar o desbloqueio do benefício. Sem essa pré-autorização pelo aposentado e pensionista, nenhum banco ou financeira poderá dar andamento à contratação do crédito antes do prazo de seis meses de concessão do benefício.
O INSS entende que essas medidas ajudam não só a reduzir o assédio aos novos beneficiários por parte das instituições financeiras como também a combater fraudes com o consignado – quando o crédito é concedido sem autorização do aposentado ou pensionista – , já que proíbe que isso aconteça ao menos por um período inicial de recebimento do benefício.
Garcia sabe que a medida não substitui as investigações sobre vazamento de informações sigilosas sobre os aposentados, mas acredita que ela colabora para reduzir essa prática, já que a normatiza também como o INSS poderá punir as instituições financeiras que infringirem as regras.
De acordo a advogada Juliana Moya, especialista em relações institucionais da Proteste, entidade de associação de consumidores, infelizmente, são muito comuns as reclamações de aposentados e pensionistas em relação ao crédito consignado. Geralmente, o beneficiários só se dá conta do problema quando percebe o desconto em folha. E aí começa uma nova dor de cabeça: a dificuldade de se cancelar esse desconto, mesmo aquele fraudado, feito sem a autorização do aposentado ou pensionista. “A normativa do INSS vem endurecer as regras e, de alguma forma, tentar diminuir a ocorrência de fraudes e que as pessoas se sintam incomodadas com ofertas de crédito muito invasivas”, avalia a advogada.
LEIA TAMBÉM: Decreto vai permitir que BC autorize capital estrangeiro em bancos no Brasil
Por outro lado, o bloqueio do benefício por 90 dias acaba por restringir a liberdade de escolha do aposentado e pensionista. Garcia alega que esse é o tempo necessário para que o beneficiário amadureça a ideia de contratar um empréstimo consignado, estando protegido do assédio inicial dos bancos pela regra dos seis meses.
Margem consignável não muda
A instrução normativa não muda o percentual de margem consignável, que permanece em 35% da renda líquida do aposentado ou pensionista. Desta forma, a margem será definida após descontos obrigatórios como imposto de renda, contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social, pensão alimentícia fixada por decisão judicial, e pagamento de benefícios além do devido.
INSS cobrará custos operacionais de bancos
A nova instrução normativa também prevê que os bancos e financeiras que oferecem o consignado terão de ressarcir o INSS pelos custos operacionais da autarquia com esse tipo de transação, como as reclamações recebidos pela Ouvidoria e os processos resultantes disso. A partir de agora, segundo Garcia, a autarquia apurará anualmente essa conta e a cobrará dos bancos no início do ano seguinte, em parcelas. Para 2019 a conta dos custos operacionais apurada ainda em 2018 foi de R$ 127 milhões.
O presidente da autarquia lembra que esse ressarcimento já era previsto em lei, mas que não ocorria porque, de início, se pensava que os custos operacionais seriam os da Dataprev, que operacionaliza efetivamente o desconto em folha. Mais tarde, com o crescimento das reclamações e fraudes se viu que os custos seriam maiores. Segundo ele, entre outubro de 2017 e outubro de 2018 foram às agências do INSS cerca de 50 milhões de pessoas. Destas, 30 milhões foram à procura de informações, incluindo reclamações sobre consignados.
LEIA TAMBÉM: Gestão Bolsonaro vai acelerar processo para cancelar benefício irregulares
“Se os bancos criarem, por exemplo, um serviço de ouvidoria etc que faça a mesma coisa, de maneira independente, pode ser que não precisem pagar mais essa conta. Mas hoje, com a dificuldade de servidores e investimentos que o INSS tem, nós precisamos cobrar essa conta”, disse Edison Garcia.
Normativa prevê punições e até descredenciamento dos bancos
Outra novidade da normativa é a definição de um fluxo para apuração de irregularidades e aplicação de sanções aos bancos que descumprirem as normas previstas para a operação dos empréstimos, o que reforça a segurança para os aposentados e pensionistas. Essas punições vão desde a suspensão até a proibição de operar empréstimos consignados.
Bancos avaliarão impacto na modalidade de crédito só após período de adaptação
Em nota, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), principal entidade representativa do setor bancário brasileiro, disse que participou das reuniões com o INSS para discutir as mudanças na concessão do consignado e avalia a instrução normativa como positiva. A entidade afirmou ainda que as novas regras irão contribuir “para a melhoria da qualidade, segurança e sustentabilidade das contratações desse tipo de produto”.
Sobre a afirmação de que os bancos estariam cometendo “assédio comercial” a aposentados e pensionistas, a Febraban se defendeu dizendo que “os bancos seguem os mais altos padrões de ética e qualidade em todas as atividades que exercem, inclusive na concessão do crédito consignado, de forma a garantir a proteção dos dados e dos direitos dos consumidores”.
A instrução normativa, publicada em 28 de dezembro de 2018, prevê um período de 90 dias para adequação dos bancos às novas regras. Dessa forma, a Febraban reforça que, somente depois desse período, será possível avaliar os impactos dessa modalidade de crédito.
Reforma tributária promete simplificar impostos, mas Congresso tem nós a desatar
Índia cresce mais que a China: será a nova locomotiva do mundo?
Lula quer resgatar velha Petrobras para tocar projetos de interesse do governo
O que esperar do futuro da Petrobras nas mãos da nova presidente; ouça o podcast