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robótica

Chip no cérebro faz tetraplégico mexer os dedos e jogar videogame

Ian Burkhart toca a guitarra do jogo Guitar Hero como parte de sua terapia para recuperar movimentos | Divulgação/Universidade do Estado de Ohio
Ian Burkhart toca a guitarra do jogo Guitar Hero como parte de sua terapia para recuperar movimentos (Foto: Divulgação/Universidade do Estado de Ohio)

Conseguir mexer cada dedo separadamente -- levantar só o indicador ou girar apenas o polegar, digamos -- é uma das capacidades aparentemente mais banais do ser humano, mas essa habilidade fez com o que o americano Ian Burkhart, 24, fosse classificado como “astro do rock” por uma equipe de cientistas.

Isso porque, em 2010, Burkhart sofreu uma lesão na medula espinhal ao mergulhar no mar, ficando paralisado dos ombros para baixo. Num experimento pioneiro, pesquisadores da Universidade do Estado de Ohio (EUA) descobriram como “ler os pensamentos” do rapaz e transmitir essa informação diretamente para os músculos da mão direita, fazendo com que ele conseguisse controlá-la novamente.

Ainda há um caminho gigantesco e cheio de obstáculos a percorrer antes que essa tecnologia tenha algum impacto prático na vida do jovem e de outros pacientes -- por enquanto, ele só consegue usar suas mãos quando visita o laboratório. De qualquer modo, o sucesso inicial indica que a ideia pode deixar de ser ficção científica antes do que se imagina.

A pesquisa que levou ao desenvolvimento do sistema, coordenada por Chad Bouton, acaba de ser publicada na revista científica “Nature”.

Sem Robocop

Ideias parecidas têm sido testadas por muitos pesquisadores mundo afora, como o brasileiro Miguel Nicolelis, da Universidade Duke. Muitos desses estudos, porém, buscam desenvolver uma espécie de “Robocop” -- um esqueleto externo robótico que seria controlado pelos impulsos cerebrais do paciente, mexendo-se por ele.

A equipe de Ohio preferiu adotar outra abordagem, explica Bouton. “Entre as nossas prioridades está a intenção de ser o menos invasivo possível, minimizando as cirurgias pelas quais o paciente tem de passar. Também queremos um sistema leve, que não atrapalhe demais a pessoa”, explicou Bouton em entrevista coletiva por telefone.

Burkhart, que também participou da teleconferência, defendeu o conceito. “Não quero sentir que sou um ciborgue, quero ver minha própria mão reagindo”, disse o paciente, que afirma ser “muito sortudo” por poder participar do estudo, mesmo que ele ainda não tenha alterado seu cotidiano.

Os experimentos com o jovem começaram há cerca de três anos, quando a equipe de pesquisadores implantou um conjunto de eletrodos no córtex motor primário esquerdo do cérebro do paciente, numa área que, graças a dados de ressonância magnética, já tinha sido identificada como responsável pelo controle da mão direita.

Passo seguinte: aprender a decodificar os impulsos elétricos emitidos pelas células nervosas dessa parte do órgão -- os eletrodos foram posicionados de maneira a “escutar” algumas centenas de neurônios ao seu redor.

A tarefa é mais complicada do que parece porque, em pessoas que nunca se acidentaram, os sinais enviados pelo cérebro são processados de modo refinado pela medula espinhal -- justamente o que não seria possível no caso de Burkhart.

O computador responsável por decifrar tais impulsos, então, enviaria as informações para um conjunto de 130 eletrodos posicionados no antebraço do paciente. Por meio de pequenos choques estrategicamente provocados, os músculos da mão seriam estimulados de forma direta, “pulando” a medula lesada -- e provocando os movimentos desejados.

Pensando os movimentos

Não foi brincadeira. Burkhart conta que, no começo, o esforço de “pensar” nos movimentos certos -- algo que ninguém que leva uma vida sem limitações faz -- o deixava totalmente exausto, “como alguém que faz uma prova de seis horas de duração na faculdade”.

Hoje, a taxa de acerto dos movimentos -- o paciente vê uma mão virtual numa tela de computador e depois tenta imitá-la -- está em torno de 70%. Além do movimento individual dos dedos (curiosamente, com exceção do mindinho, aparentemente mais difícil de estimular), Burkhart é capaz de manipular uma garrafa d’água e um copo, fazendo inclusive o movimento de pinça necessário para pegar um canudo e usá-lo para misturar o conteúdo do copo (como quem mistura açúcar num suco, digamos). E ele até jogou o game musical Guitar Hero, que envolve apertar botões numa guitarra de mentira no ritmo da música.

Não é por isso que os cientistas dizem que ele é um astro do rock, porém -- a equipe destaca sua dedicação e suas boas ideias para melhorar cada vez mais o aparato.

Os desafios que precisam ser vencidos antes que a tecnologia possa ser aplicada de forma mais ampla são vários, mas talvez o mais importante seja a miniaturização do sistema e seu uso sem fio, como a rede de internet wireless de uma casa ou empresa.

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