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O setor produtivo do Brasil recebeu US$ 74 bilhões em investimentos estrangeiros entre janeiro e outubro, quase 59% mais que no mesmo intervalo de 2021. É o maior valor para os dez primeiros meses do ano desde 2014 (US$ 74,7 bilhões), segundo os dados do Investimento Direto no País (IDP) publicados nesta sexta-feira (25) pelo Banco Central.
O valor investido pelos estrangeiros no acumulado dos últimos 12 meses é ligeiramente menor, de US$ 73,8 bilhões, o equivalente a 4,05% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. A taxa supera a do mês anterior (de 3,98% do PIB, segundo dado revisado pelo BC) e também a registrada um ano antes (3,14%), além de ser a maior desde agosto de 2019 (4,11%), meses antes do início da pandemia.
Relatório divulgado em outubro pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) afirma que o Brasil foi o terceiro país que mais atraiu investimento estrangeiro direto na primeira metade do ano, atrás apenas de Estados Unidos e China.
Em alta há várias semanas, as expectativas de mercado para o IDP em 2022 chegaram a US$ 80 bilhões, segundo o boletim Focus. Em meados do ano, esperava-se algo próximo de US$ 60 bilhões. As projeções para 2023, que também estavam na casa dos US$ 60 bilhões na virada do semestre, chegam agora a US$ 75 bilhões.
Apesar da profusão de dados positivos neste momento e de vantagens comparativas do Brasil em relação a outros emergentes, que levam observadores a classificar o país como "bola da vez" do investimento, as perspectivas para 2023 em diante carregam uma certa dose de incerteza.
A expectativa é de desaceleração no crescimento econômico do país, o que por si só pode inibir investimentos mais robustos. Além disso, o fluxo de recursos estrangeiros vai depender das políticas econômicas do governo eleito, que por ora são alvo de desconfiança (veja mais abaixo).
O que explica o avanço do investimento estrangeiro no setor produtivo do Brasil
Fatores internos e externos ajudam a explicar o avanço do investimento estrangeiro no Brasil, segundo o economista Rodolfo Margato, da XP Investimentos:
- um crescimento robusto da economia brasileira;
- as elevadas taxas de juro domésticas; e
- o fato de o país estar bem posicionado frente a outros emergentes.
A corretora prevê, para o acumulado de 2022, a entrada de US$ 89 bilhões (4,7% do PIB) em investimento estrangeiro direto, e ingressos de US$ 77 bilhões (3,9% do PIB) em 2023. São expectativas mais otimistas que a mediana do mercado.
“O desempenho doméstico mais robusto favorece os investimentos”, destaca Margato. O ponto médio das expectativas do mercado financeiro aponta para um crescimento de 2,8% no PIB neste ano, segundo o boletim Focus, do Banco Central. No começo do ano, a mediana das projeções era de apenas 0,3%.
Outro fator que ajuda são as elevadas taxas de juros domésticas, pois favorecem o fluxo de operações intercompanhia, como, por exemplo, empréstimos de matrizes para subsidiárias.
Externamente, diz o economista da corretora, o Brasil está relativamente bem posicionado e com uma posição mais sólida frente a alguns de seus principais concorrentes entre os países emergentes.
A Rússia, um dos países que disputam a atração de investimentos com o Brasil, está fora do mercado e tão cedo não retorna por causa da guerra com a Ucrânia. A Turquia está com uma política econômica errática. E a Argentina encontra-se mergulhada em uma crise cambial.
“Talvez só o México se coloque como alternativa ao Brasil”, complementa o CIO da Portofino Multifamily Office, Eduardo Castro. Segundo ele, o Brasil tem uma boa oportunidade para se diferenciar de seus pares. "Apesar da forte polarização [política], mostrou que é um país democrático, com eleições confiáveis e que vai para mais uma alternância de poder", diz.
O planejador-chefe da plataforma de investidores TC, Pedro Lafraia, avalia que, tirando EUA e China, as duas maiores economias globais, o Brasil pode ser considerado a “bola da vez” no cenário internacional.
“Antecipamos a alta nos juros, estamos com uma Selic estável, estamos atraindo capital especulativo e temos contratados mais de R$ 250 bilhões em investimentos, muitos deles na área de infraestrutura”, diz, enumerando mais vantagens brasileiras.
Lafraia vê boas oportunidades em segmentos tão diversos quanto educação, varejo, mineração e infraestrutura. “O agronegócio pode se beneficiar da continuidade do conflito entre Rússia e Ucrânia, possibilitando a incorporação de uma parcela do mercado europeu.”
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Lívio Ribeiro, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) vê o cenário com mais cautela. Ele aponta que a continuidade desse fluxo favorável depende das políticas que o novo governo adotar.
“É preciso oferecer condições de previsibilidade, estabilidade e criar capacidade para reduzir os riscos para viabilizar a entrada de capitais para o setor produtivo. É um dinheiro que vem para ficar cinco, dez anos”, diz.
Para Lafraia, o que pode ajudar neste sentido é a tomada de decisões por parte da equipe de transição, chefiada pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin. “Necessita-se saber o que vem por aí: como o governo vai conduzir a austeridade econômica? Como vai ser trabalhada a questão fiscal? Quem vai ser o ministro da Fazenda?”, questiona.
"Esperamos continuidade na dinâmica produtiva doméstica para o ano que vem, porém em níveis menos fortes", diz Margato, da XP.
Conteúdo editado por: Fernando Jasper