Depois da surpresa da indicação de Murilo Ferreira, um ex-funcionário, para presidir a Vale, o mercado volta suas atenções para os investimentos da empresa, que foram alvo de críticas do governo no passado recente, por não estarem alinhados aos interesses de Brasília.
Em geral, investidores e analistas receberam de forma positiva a indicação de Ferreira, mas mantiveram cautela sobre os futuros desdobramentos da mudança na companhia. Preferem esperar para ver.
Além disso, é possível que a troca no comando provoque mudanças no nível de alta direção da mineradora, já que Murilo Ferreira deixou para trás dois executivos na ativa na companhia, Tito Botelho Martins e José Carlos Martins, cuja permanência na empresa agora gera dúvidas entre os acionistas.
"Principalmente o Martins (José Carlos) já passou pela mesma situação na CSN, quando Steinbruch preferiu a Maria Sílvia (Bastos Marques). Não sei se ele fica depois dessa", disse uma fonte que acompanhou de perto o processo de sucessão da Vale e pediu anonimato.
A saída da diretora de Recursos Humanos e Serviços Corporativos, Carla Grasso, no entanto, muito ligada ao atual presidente da Vale, Roger Agnelli, já é dada como certa, segundo a fonte.
Assim, possivelmente com uma diretoria em ajustes, Ferreira assumirá em maio com o estigma de ser mais afinado com o governo e por isso ficará na mira do mercado. A prova final, na opinião de analistas, só poderá ser tirada no decorrer do ano.
"A gente vai ter que ficar acompanhando e ver os novos sinais que ele vai passar. Vamos ver Belo Monte, o cronograma de investimentos, se vai ter algum anúncio de revisão, tem que ver se vão ceder nos royalties. Aos poucos vamos ver os sinais", avaliou Pedro Galdi, analista da SLW Corretora.
Brasil e exterior
Este ano Ferreira deve inaugurar pelo menos cinco projetos da companhia, sendo três fora do Brasil: Totten, no primeiro semestre deste ano, que significa a reabertura da mina de níquel de Sudbury, no Canadá; Moatize, projeto de carvão na África, também previsto para o primeiro semestre deste ano; e Karebbe, hidrelétrica na Indonésia de 130 megawatts.
No Brasil, a Vale inicia no segundo semestre deste ano o projeto de Salobo, no Pará, que vai produzir 100 mil toneladas de cobre; e a usina hidrelétrica de Estreito, no rio Tocantins, entre os Estados do Maranhão e Tocantins, com capacidade para 1.087 megawatts.
Os investimentos totais nos projetos brasileiros que entram em operação este ano somam 2,4 bilhões de dólares e no exterior, 2,5 bilhões de dólares.
Outros projetos fora e dentro do Brasil, com maturações mais longas, vão demandar novos desembolsos expressivos da companhia este ano, com 63,8 por cento do plano total de investimentos, ou 15,3 bilhões de dólares, destinados para empreendimentos locais.
Cada atraso ou aceleração do cronograma será acompanhado de perto pelos investidores, principalmente os projetos siderúrgicos que foram ponto de polêmica entre a empresa e o governo. A Alpa, siderúrgica do Pará, receberá 100 milhões de dólares este ano, e a unidade de aço no Ceará, que a Vale constrói em parceria com as coreanas Posco e Dongkuk, 195 milhões de dólares.
"Nossa preocupação reside no tamanho da interferência do governo daqui pra frente nas decisões sobre futuros investimentos: se vai diversificar mais no Brasil (infraestrutura, óleo, aço) do que seguir com planos de acrescentar mais ativos de cobre, fertilizantes e carvão fora do Brasil", afirmou em relatório a equipe de pesquisa do BTG Pactual.
Os países no exterior onde a Vale tem operação vão demandar cerca de 10 bilhões de dólares, com destaque para o Canadá, com 1,959 bilhão de dólares, e Argentina, que receberá investimentos de 1,393 bilhão de dólares em 2011.
"O que realmente preocupa as pessoas daqui pra frente com certeza não é o indicado para a presidência, que é uma pessoa com experiência na indústria --o receio é em relação à visão que o governo tem da Vale", afirmou Alexandre Povoa, que supervisiona 1 bilhão de reais em ativos para a Modal Asset Management.