A vigência da Lei Anticorrupção e a profundidade de investigações recentes, como a Operação Lava Jato, acrescentaram um novo item ao planejamento estratégico das empresas brasileiras: a criação de sistemas de compliance. O termo define as regras de conduta de cada companhia a fim de inibir fraudes e envolvimento em esquemas de corrupção nas relações comerciais.
"A Lava Jato é um exemplo de evolução nesse ambiente empresarial. Avançamos na agenda da transparência com a pressão da sociedade civil e com políticas públicas que contribuem para esse cenário", observa o diretor-presidente do Instituto Ethos, Jorge Abrahão.
Desde 29 de janeiro deste ano, empresas flagradas em negociações fraudulentas respondem na Justiça pelo crime, juntamente com o funcionário ou colaborador envolvido. A possibilidade de um escândalo de corrupção colocar e empresa e seus sócios no banco dos réus, afetando também seus resultados, acendeu o alerta nas diretorias e presidências da iniciativa privada o aumento na demanda por informações foi notada por consultorias da área.
Ao estabelecer seus sistemas de compliance, muitas empresas aumentam o monitoramento de seus funcionários. Elas também adotam ferramentas de tecnologia de informação na avaliação de dados financeiros e contábeis que possam mostrar indícios de ações ilegais. A investigação corporativa, porém, precisa respeitar a privacidade do colaborador e não infringir a lei.
"É preciso trabalhar com as informações da empresa e com a apuração que os canais de denúncia oferecem", explica o consultor José Francisco Compagno, sócio líder da área de investigação e fraudes da EY no Brasil e América do Sul.
Conduta
"A melhor maneira de se proteger é definir as regras de conduta internas. Isso demonstra que a companhia tem boas práticas ao lidar com recursos de terceiros e mitiga os riscos de ver seu corpo de executivos ou colaboradores envolvido em crimes", diz Eliane Lustosa, vice-presidente do Conselho de Administração do Instituto Brasileiro de Governança Corportativa (IBGC).
Mais do que monitorar o comportamento de seus funcionários, o sistema de compliance tem relação direta com a performance da empresa. Para consultores, controlar riscos exige um novo nível de gestão empresarial, que prepara a organização para desenvolver mercados, buscar financiamentos ou aportes de fundos de investimento.
"A empresa não se sustenta no longo prazo com práticas nebulosas de gestão", diz o consultor Eduardo Valério, da J. Valério, de Curitiba. Além de sinalizar aos parceiros e financiadores sobre a transparência nos negócios, o cuidado com a conduta ética tem impacto direto na valorização da imagem da companhia.
Ser pequena não exime a empresa de estabelecer regras de combate à corrupção. Com o estimulo às compras governamentais gerado pela Lei Geral das Pequenas e Média Empresas, o gestor precisa ficar atento e resistir a situações de favorecimento em licitações suspeitas que possam complicá-lo no futuro.
"Para as pequenas, é importante definir a cadeia de comando, que também prepara a sucessão e melhora a gestão, e construir um conjunto interno de regras", lembra o consultor Carlos Tortelli, da Consult Finance, de Curitiba.
A melhor maneira de se proteger é definir as regras de conduta internas.
Eliane Lustosa vice-presidente do IBGC
Novo mercado
Somente a EY, antiga Ernst&Young, registrou aumento de 65% na área de compliance no último ano. São mais de 140 profissionais envolvidos no setor. O movimento se repete em escritórios de advocacia, como o Prolik Advogados Associados, que criou uma área dedicada ao segmento. Também em Curitiba, o escritório Marins Bertoldi faz a lição de casa e criou o próprio compliance. "Foi uma necessidade dos clientes internacionais, que exigiam processos formais de transparência", explica o sócio Emerson Albino.
Manual formaliza adoção de regras
Formado pelas empresas OpusMúltipla, Brainbox e HouseCricket, o Grupo OM de Comunicação Integrada é uma das 652 empresas signatárias do Pacto Global, lançado no país em 2000. A iniciativa pretende mobilizar a comunidade empresarial para a adoção de práticas de negócios que contemplem as áreas de direitos humanos, relações de trabalho, meio ambiente e combate à corrupção.
Desde 2010, o grupo está envolvido com os compromissos estabelecidos no documento. "A formalização do pacto foi um movimento natural da postura da empresa durante a criação do grupo e na certificação de qualidade, mas também na crença de que podemos colaborar com a sociedade de forma ética", explica o vice-presidente administrativo-financeiro João Namir Moro.
No fim de 2013, a publicação da Lei Anticorrupção foi mais uma razão para aprimorar os processos internos de controle. Contratou uma consultoria jurídica e começou a adotar práticas de compliance, ajustando-se às novas regras. Uma das primeiras ações foi a elaboração do manual de ética e conduta, onde esclarece as normas de atuação de funcionários e fornecedores.
Para acompanhar o processo, são realizadas auditorias regulares nas áreas de contabilidade e recursos humanos, além de treinamentos. Fornecedores são monitorados para alinhamento às convicções adotadas por meio de questionários e classificações internas. Apenas em 2014, o método exigiu R$ 51 mil em investimentos.