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NOVO MERCADO

Legalização dos jogos de azar é aposta às escuras

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Quem passa pelo Alto da XV e arredores se acostumou a ver pelas calçadas, encostadas em árvores e postes, pequenas placas pintadas à mão que pedem a volta dos cassinos no Brasil. Feitas de pedaços carcomidos de papelão e madeira compensada, elas se multiplicam em época de eleições e repetem – com a obstinação característica do autor, o ex-deputado federal e eterno candidato Pedro Lauro Domaradzki – os benefícios que a legalização dos jogos de azar supostamente trará: mais empregos, mais turistas, mais dólares.

Os bingos podem ser usados de múltiplos modos tanto por clientes como seus proprietários para a lavagem [de dinheiro]. (...) Por outro lado, a manutenção da atividade do bingo na esfera da ilegalidade impede que ele seja usado para ‘esquentar’ recursos.

Deltan Dallagnol chefe da força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal, em artigo de 2015.

A modesta campanha de Pedro Lauro pode não sensibilizar gente o bastante para elegê-lo. Mas o pedido dele, e de um numeroso grupo de interessados com muito mais cacife, nunca esteve tão perto de ser atendido.

O projeto de lei do Senado (PLS) 186/2014, uma das tantas propostas de regulamentação no Congresso, pode ser votado em plenário na quarta-feira (7). Os investidores que pretendem explorar a atividade preferem duas propostas que estão na Câmara, mas não veem problemas na aprovação do PLS 186 e posterior “aprimoramento” pelos deputados.

Existe uma chance grande de regulamentação. Eu não diria de 100%, mas muito próxima disso. O debate está mais forte hoje. O governo tem um problema de receita, e a geração de um ônus maior para a sociedade, como a recriação de uma CPMF, não é bem vista

Elias Deiab diretor da BR Jogos e do movimento Arrecada Brasil.

De um lado, entusiastas enfileiram projeções de quanto o país ganharia com a legalização. No campo da arrecadação anual de impostos, elas variam de R$ 15 bilhões (citada no projeto do Senado) a R$ 59 bilhões (segundo o Instituto Jogo Legal), passando por um cálculo de R$ 37 bilhões feito pela KPMG com base no projeto de lei 2.254/2007. Em paralelo, a criminalidade diminuiria por dois canais: a geração de empregos e a asfixia da atividade clandestina, que perderia a razão de ser.

Do outro lado, profissionais de saúde e assistência social advertem para os riscos relacionados ao vício em jogo, que afeta aproximadamente 3% da população e causa estragos nas finanças e relações familiares. E procuradores alertam para a falta de estrutura do país para fiscalizar a atividade, o que abriria uma janela para a lavagem de dinheiro e a sonegação de impostos.

Tiros no escuro

Prever com alguma exatidão as consequências da legalização do jogo, no entanto, é virtualmente impossível. Mesmo nos Estados Unidos, em que há dados de sobra à disposição, apenas estudos patrocinados por um lado ou outro do debate chegam a conclusões taxativas. Nos demais, os resultados são ambíguos e variam conforme a localidade avaliada.

Para os pesquisadores Carlos Joppert Ragazzo, professor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV), e Gustavo de Abreu Ribeiro, doutorando em Direito pela Universidade de Harvard, não há como conhecer os reais custos e benefícios de uma estrutura regulatória sem testá-la na prática. “Invariavelmente, se dá tiros no escuro em muitas situações, ainda que se tenha a precaução de incorporar evidências de outros países e experiências passadas”, escreveram, num artigo de 2012.

Para eles, o foco do debate não pode estar no ganho tributário, mas sim se as pessoas devem ou não ter acesso a jogos. “Quais são os tipos de jogos que queremos (des) estimular para quais pessoas, sob quais condições?”, questionam.

Ambiente propício

O tema da regulamentação, com sua promessa de gerar impostos sem incomodar o contribuinte, volta à tona em tempos de crise fiscal. Reapareceu em 2015, com o governo Dilma Rousseff à caça de receitas, e ganhou força na gestão de Michel Temer. A destinação da maior parte da arrecadação à Previdência e a esperada geração de empregos atraíram o apoio de centrais como Força Sindical.

Multinacionais do ramo têm contratado advogados e enviado representantes ao país, estimuladas por declarações como a do deputado federal Nelson Marquezelli (PTB-SP). “Devemos aprovar em meados de março e abril na Câmara e no Senado, e consequentemente deve ser sancionado pelo presidente. Em julho de 2017 deve estar regulamentado”, disse Marquezelli à plateia do Brazilian Gaming Congress, em São Paulo, no mês passado. “O presidente tem mais pressa que nós. Ele precisa arrecadar.”

Embora as apostas tenham sido proibidas há 70 anos, com os bingos liberados por alguns anos entre as décadas de 1990 e 2000, pelo menos três associações representam os interesses do ramo no Brasil: a Associação Brasileira dos Bingos, Cassinos e Similares (Abrabincs), o Instituto Jogo Legal (IJL) e a BR Jogos. Esta última patrocinou um documentário sobre o assunto, intitulado “Por que não?”.

“Existe uma chance grande de regulamentação. Eu não diria de 100%, mas muito próxima disso”, diz Elias Deiab, que dirige a BR Jogos e o movimento Arrecada Brasil. “O debate está mais forte hoje. O governo tem um problema de receita, e a geração de um ônus maior para a sociedade, como a recriação de uma CPMF, não é bem vista.”

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