Três anos e meio após a entrada em vigor da Lei da Liberdade Econômica (LLE), em 20 de setembro de 2019, ainda há muito por avançar. A legislação vale na esfera federal, mas a implementação em estados e municípios – justamente onde se concentra boa parte da burocracia que dificulta os negócios – caminha a passos lentos.
Um levantamento realizado pelo Instituto Liberal de São Paulo (Ilisp), com dados de 16 de março, mostra que, dos 4.320 municípios brasileiros com mais de 5 mil habitantes, apenas 799 aprovaram um decreto ou lei de liberdade econômica, pouco mais de 18% do total. Os que não aprovaram estão desperdiçando uma oportunidade de fomentar a abertura de empresas e a geração de riqueza e renda – um estudo mostra que houve significativo aumento na criação de empregos após a aprovação da lei.
A LLE tem por objetivo simplificar e desburocratizar o ambiente de negócios do país, facilitando a abertura e o funcionamento de empresas. Em média, em fevereiro, levava-se 26 horas para abrir uma empresa no Brasil, segundo o Mapa de Empresas do governo federal. Há quatro anos, esse prazo médio era de 114 horas.
O principal ponto da Lei de Liberdade Econômica é o de acabar com a exigência de alvará de funcionamento, sanitário e ambiental para atividades consideradas de baixo risco. Essa definição é tomada por estados e municípios a partir de uma matriz de riscos, considerando o histórico da atividade.
Para Paulo Uebel, ex-secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia (2019-2020), um legado muito importante da legislação é trazer para a administração pública o conceito de que o cidadão está em primeiro lugar.
“Não se deve criar exigências sem sentido para quem quer empreender. A gestão pública precisa ser pautada pela conduta ética e seguir uma matriz de riscos: quanto maior o risco para o cidadão, mais o Estado precisa fiscalizar”, diz. Isto, de acordo com ele, se reflete em ganhos para a sociedade: a burocracia é reduzida entre 70% e 80%.
A dispensa de alvarás para atividades de baixo risco tem sido vista como uma medida para estimular a atividade econômica no país, reduzindo custos e tempo necessário para abrir e manter um negócio, aponta o Ilisp. E também pode ajudar na formalização de empresas.
Adesão à Lei de Liberdade Econômica foi menor no Norte e Nordeste
Um dos aspectos mais importantes da Lei de Liberdade Econômica, a dispensa de alvarás para atividades de baixo risco, só ocorre quando há a aprovação de legislação equivalente nos estados e municípios. Trata-se de um passo necessário para que as autoridades envolvidas – como prefeituras, órgãos de meio ambiente, Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros – possam dispensar o alvará.
“Há uma grande disparidade entre as unidades da federação”, aponta Marcelo Faria, especialista do Instituto Millenium e presidente do Ilisp. Das 27 unidades da federação, 12 estados não aprovaram leis de liberdade econômica, dos quais 11 são do Norte ou Nordeste, mais Goiás.
“Há uma grave falta de interesse nas cidades e estados do Norte e do Nordeste no avanço da lei, justamente as regiões em que facilitar a atividade empreendedora é ainda mais importante”, destaca Faria.
O Rio Grande do Sul é o estado em que, proporcionalmente, mais municípios aprovaram a Lei de Liberdade Econômica – 58% dos mapeados. Na sequência, vem Santa Catarina (54,2%), Espírito Santo (49,4%) e Minas Gerais (42,5%). Nos estados do Norte e Nordeste, esse percentual é inferior a 10%, à exceção de Rondônia (10,9%).
Emprego cresceu em municípios que aderiram à Lei de Liberdade Econômica
Faria diz que a aprovação da Lei de Liberdade Econômica foi fundamental, não apenas para elevar a avaliação do país no critério de liberdade de negócios nos rankings internacionais, mas também para gerar mais empregos.
No último ranking da Heritage Foundation, divulgado no início de março, o Brasil aparece na 127.ª posição entre 176 países. É um ganho de seis posições em relação ao levantamento divulgado em 2022.
Porém, especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo apontam que, com as medidas adotadas pelo governo neste início de mandato, os prognósticos para os próximos anos não são bons.
“É preciso estar atento. Qualquer ameaça à liberdade econômica pode ter um pesado impacto social, como a geração de menos empregos”, diz Uebel.
Segundo estudo realizado pelo Ilisp em parceria com o Instituto Millenium, municípios que aderiram à Lei de Liberdade Econômica tiveram um aumento médio de cerca de 40% na geração de empregos após implantarem a lei.
“As cidades que implantaram a Lei de Liberdade Econômica tiveram um maior índice de abertura de empresas após a lei, dado que a dispensa de alvarás beneficia sobretudo os micros e pequenos empreendedores que podem iniciar a sua atividade ou formalizar uma já existente de forma mais rápida, prática e com menos riscos regulatórios”, diz o estudo.
Quais são os obstáculos à difusão da Lei de Liberdade Econômica
Faria avalia que a falta de vontade política é o principal dificultador à implementação da lei: “Há prefeitos e secretários municipais que se recusam a perder um certo micropoder ao dispensar alvarás para centenas de atividades de baixo risco”.
Outro problema, segundo Faria, são as disputas políticas entre prefeitos e governadores. “Em outras localidades, a lei não avançou porque há um forte trabalho do governo estadual para avançar a lei, mas o prefeito local faz oposição ao governador e não quis aprová-la – prejudicando centenas de milhares de pessoas – para não dar uma 'vitória política' ao governador.”
O especialista do Instituto Millenium destaca que também há uma certa resistência de funcionários que deixariam de analisar a liberação dos alvarás diante do avanço da Lei da Liberdade Econômica, ainda que a dispensa de alvarás não afete a fiscalização posterior das empresas. “Quando essa resistência é vencida, o que pode levar meses de negociações, a lei acaba avançando”, diz.
Também pesa o desconhecimento da lei e de seus reflexos, destaca Uebel. Para evitar isso, segundo ele, é necessário trabalhar com educação e envolver entidades que promovem o associativismo, como as associações empresariais.
Implantação da Lei de Liberdade Econômica, por estado
Porcentual de municípios com mais de 5 mil habitantes que implantaram a Lei de Liberdade Econômica, segundo o Ilisp:
Estado | Municípios com LLE (% do total) |
Rio Grande do Sul | 58,05% |
Santa Catarina | 54,21% |
Espírito Santo | 49,35% |
Minas Gerais | 42,47% |
Rio de Janeiro | 23,91% |
Mato Grosso | 16,82% |
Paraná | 14,63% |
Mato Grosso do Sul | 12,33% |
Rondônia | 10,87% |
Alagoas | 9,28% |
São Paulo | 8,73% |
Pará | 7,69% |
Pernambuco | 7,65% |
Roraima | 6,67% |
Amapá | 6,25% |
Bahia | 5,42% |
Paraíba | 5,10% |
Ceará | 4,92% |
Goiás | 4,64% |
Acre | 4,55% |
Sergipe | 3,13% |
Tocantins | 2,82% |
Maranhão | 2,80% |
Rio Grande do Norte | 1,71% |
Amazonas | 1,64% |
Piauí | 0,68% |
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