O presidente Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: limite ao uso de créditos de PIS/Cofins deve elevar a carga tributária, segundo especialistas.| Foto: André Borges/EFE
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A limitação do uso de créditos de PIS/Cofins, proposta por medida provisória pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta terça-feira (4), vai afetar fortemente o caixa das empresas e aumentar a carga tributária de alguns setores, avaliam tributaristas ouvidos pela Gazeta do Povo.

A medida foi a forma encontrada pela equipe econômica do governo para compensar a renúncia tributária com a desoneração da folha de pagamento de empresas de 17 setores, além de municípios com menos de 156 mil habitantes.

Os créditos de PIS/Cofins são uma espécie de benefício fiscal concedido para estimular setores econômicos e reduzir o efeito cumulativo dos impostos. Atualmente, as empresas se utilizam desses créditos para abater outros tributos devidos, como os da Previdência. É o que se chama de "compensação cruzada", mecanismo que reduz a arrecadação do governo, já que o crédito pode ser deduzido do imposto a pagar.

Com a medida anunciada nesta terça, apelidada de "MP do Equilíbrio Fiscal", os créditos só poderão ser usados para abater o próprio PIS/Cofins. A expectativa do governo é que isso resulte em aumento da arrecadação.

"Isso será um enorme golpe no fluxo de caixa das empresas, eis que ficarão limitadas a utilizar seus créditos líquidos, certos e exigíveis, assegurados por lei", afirma Mariana Ferreira, do escritório Murayama, Affonso Ferreira e Mota Advogados.

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Leonardo Roesler, da RMS Advogados, diz que a carga tributária pode subir. "A não-cumulatividade do PIS/COFINS, se aplicada de forma rigorosa e sem as devidas compensações, pode resultar em um aumento de carga tributária disfarçado, contrariando os princípios de neutralidade e equidade tributária", afirma.

Representantes do setor produtivo têm a mesma avaliação. Em nota à imprensa, a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) disse que as limitações no uso de créditos e compensações do PIS/Cofins "vão afetar o fluxo de caixa das empresas, causando impacto em investimentos, na geração de empregos e no crescimento econômico do país".

Segundo a federação, ao proibir uma compensação cruzada que era permitida por lei há mais dez de anos, a MP gera imprevisibilidade e insegurança jurídica.

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    Limite a crédito de PIS/Cofins corrige distorção, diz governo

    A MP ainda revoga a possibilidade de empresas que têm crédito presumido pedirem restituição do imposto, como ocorria até então. A Receita Federal alega que está corrigindo uma distorção, uma vez que o regime não cumulativo não deveria gerar crédito a devolver. Foram R$ 20 bilhões restituídos em 2023, conforme a Fazenda.

    O secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, diz que alguns contribuintes se valem dos créditos e pagam alíquotas reais menores de PIS/Cofins. "Em muitos casos, a Receita devolve dinheiro ao empresário e o imposto acaba retornando e financiando a atividade", afirmou. O uso dos créditos será limitado e só ocorrerá quando não levar a uma tributação negativa, após computados os débitos e créditos.

    Para Fernanda Terra, do Terra e Vecci Advogados, embora a limitação ao uso de créditos seja conceitualmente correta, é preciso lembrar que a não cumulatividade do PIS e Cofins, "é uma não cumulatividade mitigada, delimitada na própria legislação das contribuições".

    "Limitar a compensação, revogar a restituição, tem o mesmo efeito de aumento de tributação, pois o tributo que era pago por meio compensação, será feito agora, com desembolso de dinheiro, o que acaba onerando a empresa", diz.

    Jose Guilherme Sabino, CEO da Assertif, consultoria especializada na recuperação de créditos previdenciários e fiscais, destaca o efeito cascata na economia. "Vai haver elevação dos custos para as empresas, consequentemente, a redução da lucratividade dos negócios e o aumento dos preços e serviços para o consumidor final", diz.

    Na prática, para Fernanda Terra, o governo "segue aumentando tributação, sem nenhum movimento sério para uma reforma administrativa do país".

    Medida incrementa cofres do governo

    De fato, a conta vai ser vantajosa para o governo. O custo da desoneração da folha das empresas e municípios em 2024 é de R$ 26,3 bilhões, segundo a Fazenda. Desses, são R$ 15,8 bilhões referente às empresas e R$ 10,5 bilhões às prefeituras.

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    Enquanto isso, a medida de compensação anunciada pela Fazenda deve resultar em ganhos de R$ 29,2 bilhões no ano, sendo R$ 11,7 bilhões do crédito presumido não ressarcível e R$ 17,5 bilhões da compensação limitada do PIS/Cofins.

    "A medida é positiva e corrige distorções importantes do sistema tributário. Fecha as brechas remanescentes e restringe o uso dos créditos em geral", avalia Felipe Salto, economista da Warren Investimentos. "Os efeitos fiscais esperados são relevantes e o governo acerta ao seguir esse caminho."

    Segundo a Fazenda, em 2023, a maior parte das compensações de débitos previdenciários, em 2023, foi com créditos de PIS/Cofins. Foram arrecadados R$ 435,7 bilhões com o imposto, dos quais cerca de 86% das compensações foram decorrentes de compensação cruzada, para outros tributos.

    Outra vantagem para o governo é não precisar respeitar a chamada noventena, prazo de 90 dias entre a edição de medida que eleva um imposto e a efetivação da cobrança sobre os contribuintes. Além disso, as contribuições não serão divididas com estados e municípios. Ou seja, ficarão para a União.

    Indústria, setor farmacêutico, agronegócio e exportadores estão entre os mais afetados

    O governo não apresentou estimativa de impacto setorial da mudança. A Fazenda diz que não é possível fazer a relação da medida com as empresas beneficiadas pela desoneração. Nesse caso, o governo estaria "dando com uma mão e retirando com outra".

    “O nosso objetivo é fazer o ajuste fiscal com medidas de justiça, sem aumento de tributos, sem aumento de alíquota e sem criação de tributos”, afirmou o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan.

    Para especialistas, a indústria de manufatura, o setor farmacêutico, o agronegócio, empresas exportadoras e com ações em Bolsa de Valores devem ser os mais atingidos. "São notórios pelo uso intensivo de créditos tributários, já que suas operações envolvem cadeias produtivas longas e complexas", explica Roesler. "A incidência de PIS/Cofins sobre insumos e matérias-primas gera volume considerável de créditos a serem compensados."

    As exportadoras não pagam PIS/Cofins sobre suas vendas externas, mas acumulam créditos sobre insumos comprados no mercado interno. "Hoje elas já enfrentam desafios para obter ressarcimento de créditos acumulados", afirma o tributarista. A indústria manufatureira utiliza os créditos tributários para compensar tributos sobre insumos e matérias-primas.

    "Neste caso, a restrição da compensação cruzada poderá resultar em um aumento da carga tributária efetiva, afetando a competitividade das empresas no mercado interno e externo", diz Roesler.

    Para ele, no entanto, as mais prejudicadas serão as pequenas empresas e indústrias. "As limitações vão impactar diretamente empresas menores, que dependem desses créditos para equilibrar suas obrigações fiscais", afirma. "Mudanças abruptas e restritivas, como as propostas pela MP, geram insegurança jurídica e dificuldades na gestão de caixa das empresas que não possuem grande margem para absorver oscilações fiscais inesperadas."

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    Proposta de limitar créditos de PIS/Cofins já enfrenta resistência no Congresso

    A proposta foi apresentada na semana passada a lideranças do Congresso e já enfrenta resistência entre os congressistas. Logo após o detalhamento do texto pela equipe econômica, o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Pedro Lupion (PP-PR), criticou a medida. Ele disse a jornalistas que a MP gera “preocupação gigantesca” ao setor e demonstra uma “sanha arrecadatória” do governo Lula.

    A Fazenda alega que a medida foi pensada para atender a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, a pedido do governo, declarou inconstitucional a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos sem medidas de compensação.

    O modelo de desoneração foi instituído em 2011, no governo Dilma Rousseff (PT), e prorrogado diversas vezes. A ideia era estimular a geração de empregos. É um modelo de substituição tributária, em que setores intensivos em mão de obra podem substituir a contribuição previdenciária de 20% sobre salários por alíquota de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Os setores atingidos pelo programa empregam cerca de 9 milhões de pessoas. A Gazeta do Povo, como grupo de comunicação, está entre os beneficiados.

    Em 2023, a desoneração foi prorrogada pelos parlamentares, depois vetada por Lula e restabelecida pelo Congresso a partir da derrubada do veto. Mais adiante o governo recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para acabar com a desoneração e conseguiu, graças a uma liminar do ministro Cristiano Zanin.

    Posteriormente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chegaram a um acordo que prevê a manutenção da desoneração neste ano e o aumento progressivo da cobrança a partir de 2025. Com isso, a alíquota dos setores contemplados passaria a ser de 5% sobre a folha de salários em 2025, 10% em 2026, 15% em 2027 e 20% em 2028.

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    Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]