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Mercado financeiro

Lira turca afunda, arrasta emergentes e faz dólar se aproximar dos R$ 3,90

Em 2018, a lira turca já desvalorizou 46%. | YASIN AKGUL/AFP
Em 2018, a lira turca já desvalorizou 46%. (Foto: YASIN AKGUL/AFP)

A lira turca registrou nesta segunda-feira (13) novo dia de forte desvalorização e arrastou outras moedas, em meio a temores de contágio da crise a emergentes. Medidas do banco central turco para tentar injetar confiança nos investidores falharam.

Depois de cair quase 15% na sexta (10), a moeda turca recuou 8,25% nesta sessão — no ano, a depreciação atinge 46%.

O mercado desconsiderou a decisão do banco central turco de reduzir os depósitos compulsórios -parcela que os bancos são obrigados a manter na autoridade monetária — em uma tentativa de aumentar a liquidez do mercado.

Nos últimos dias, as atenções se voltaram para uma disputa entre os Estados Unidos e a Turquia, aliada dos americanos há mais de 60 anos.

O presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou na sexta que autorizou o Departamento de Estado do país a dobrar as tarifas sobre aço e alumínio importados da Turquia, em retaliação à detenção, pelas autoridades turcas, de um pastor evangélico da Carolina do Norte. A decisão aprofundou a crise da lira turca.

Para Katie Nixon, diretora de investimentos da área de gestão de fortunas da Northern Trust, as ações adotadas pelo banco central turco ficaram bem aquém do que o mercado percebe como necessário para conter a inflação e a depreciação da moeda, como um aumento expressivo na taxa de juros e a adoção de uma política de austeridade fiscal.

A situação na Turquia alimentou a aversão dos investidores ao risco e contaminou as principais Bolsas do mundo e as moedas de emergentes.

O dólar subiu 0,87%, para R$ 3,898, na maior cotação em mais de um mês. Ao longo do dia, chegou a bater R$ 3,93.

A moeda americana ganhou força ante 22 das 24 principais divisas emergentes. Apenas o dólar de Hong Kong e o bath tailandês ficaram estáveis.

A maioria das Bolsas reagiu a essa piora no cenário. Nos EUA, o Dow Jones, principal índice de Nova York, caiu 0,5%. O S&P 500 teve baixa de 0,4%, e o índice da Bolsa de tecnologia Nasdaq recuou 0,25%.

Após oscilar no vermelho, a Bolsa brasileira acelerou a alta no fim do dia e conseguiu fechar com avanço de 1,28%, para 77.496 pontos, conforme investidores aproveitaram os cinco pregões seguidos de baixa para remontar posições.

Com a volatilidade no mercado, as negociações no Tesouro Direto foram suspensas às 11h05 e novamente às 14h10. As transações foram normalizadas por volta das 15h30.

Os próximos dias, no entanto, devem continuar marcados por uma piora na aversão a risco e um temor de contágio, enquanto investidores tentam medir a exposição dos bancos europeus a títulos da dívida turca, afirma Katie Nixon, diretora de investimentos da área de gestão de fortunas da Northern Trust.

“Há mercados emergentes com moedas frágeis e uma grande necessidade de financiamento externo (principalmente de dólar). O medo é que o que acontece na Turquia não fique na Turquia”, afirmou, em nota.

Entre essas moedas mais vulneráveis estariam o rand sul-africano, que perdeu 2,88% nesta segunda, e a rupia indonésia, que recuou 0,82%.

O Banco Central Europeu (BCE) se preocupa com a exposição de algumas instituições financeiras do bloco, grandes financiadoras do governo e das empresas turcas, à lira.

Leandro Ruschel, sócio-fundador do Grupo L&S, lembra que a Turquia é um dos emergentes que mais tem dívida externa das empresas em dólar.

“Essa dívida se torna impagável conforme a lira vale cada vez menos. Seu enfraquecimento pode gerar uma quebradeira geral entre empresas e efeito dominó no sistema financeiro europeu”, diz.

Eleições

Embora o Brasil seja afetado pelas turbulências na Turquia na rasteira dos países emergente, especialistas ressaltam que a economia brasileira guarda diferenças relevantes da turca e questões internas devem se apresentar como fator maior de volatilidade.

“Quando crises como essas acontecem, como vimos com a Argentina, investidores começam a olhar mais atentamente os riscos políticos e econômicos nos emergentes.

Há um risco político no Brasil por causa das eleições, o que justifica o aumento do prêmio nos ativos brasileiros”, afirma. Rachel Ziemba, presidente da Ziemba Insights e especialista em mercados emergentes.

Marco Casarin, economista-chefe para América Latina da consultoria inglesa Oxford Economics, também avalia o Brasil como um dos países vulneráveis a mudanças de apetite ao risco dos investidores.

“O Brasil também pode sofrer um pouco nesse ano no quesito vulnerabilidade por conta da falta de clareza sobre eleições, ou seja, por dúvidas sobre se o próximo governo manterá seu compromisso com o ajuste fiscal e as reformas estruturais que o governo [do presidente Michel] Temer largou pela metade”, diz.

Casarin ressalta, no entanto, que a Turquia tem conjunturas econômicas diferentes das do Brasil.

“Não apenas possuímos um déficit em conta corrente minúsculo se comparado ao da Turquia como nossa dívida externa de curto prazo é mínima e inteiramente coberta pelas reservas, ao contrario da deles”, afirma.

Ele acrescenta ainda que o Brasil registra inflação baixa e crescimento abaixo do potencial. “A Turquia tem uma inflação acima da meta há bastante tempo, com uma economia superaquecida e crescimento baseado em crédito.”

Outros emergentes, em situação mais frágil, tendem a sofrer mais, como a África do Sul e a Argentina.

O primeiro tem um déficit em conta corrente elevado. Já o vizinho sul-americano fechou acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) em junho, depois de o peso argentino mergulhar numa forte desvalorização.

Nesta segunda, a moeda recuou 3,81%, sob impacto da crise turca e de um escândalo de corrupção que envolveu políticos e empresários argentinos. No ano, a queda é de 39%. “Tenho convicção que, passada a volatilidade inicial, essas moedas voltarão aos níveis da semana passada, e apenas a Turquia vai experimentar uma mudança significativa na sua taxa de câmbio”, diz Casarin.

Como a crise da moeda turca afeta o Brasil

Por que a lira turca cai?

Há diversas razões. Nos últimos dias, as atenções se voltaram a uma disputa entre os EUA e a Turquia, aliada dos americanos há mais de 60 anos, porque o Departamento de Estado americano impôs sanções ao país em razão da detenção, pelas autoridades turcas, de um pastor evangélico da Carolina do Norte.

O problema todo é o pastor?

Não. O país prosperou com o fluxo de capital estrangeiro, conforme países ricos (tidos como mais seguros) mantinham juros baixos, encorajando investidores a buscar retornos mais altos na Turquia e em outros emergentes, que pagam taxas mais elevadas como “prêmio” pelo risco maior. Agora, com a alta das taxas nos EUA, ficou mais difícil para a Turquia (e outros emergentes, como o Brasil) obter os fundos de que necessita. O deficit em conta-corrente turco, de 5% do PIB, é considerado muito alto —no Brasil, o indicador ronda 0,5%.

Qual o papel de Erdogan na crise?

Economistas sugerem ações para frear economia, como a alta dos juros, para controlar a inflação, que atingiu 16% em julho, e reduzir o deficit — com menor consumo, as importações cairiam e, assim, a dependência de capital externo diminuiria. No entanto, o presidente Recep Tayyip Erdogan, o mais poderoso líder da Turquia desde Mustafa Kemal Ataturk, não parece convencido de que haja necessidade de corrigir o equilíbrio da economia.

O que BC da Turquia anunciou nesta segunda?

O Banco Central turco não mencionou taxas de juros, mas se comprometeu a fornecer liquidez ao mercado. A autoridade monetária revisou os índices de reservas obrigatórias que bancos precisam manter no BC e informou que proporcionaria ao sistema financeiro quase 10 bilhões de liras, US$ 6 bilhões e o equivalente a 3 bilhões em ouro.

Por que a situação na Turquia afeta o Brasil?

A crise turca sinaliza para o mercado a existência de fragilidades nos mercados emergentes como um todo, incluindo o Brasil. Avessos a esse risco potencial, investidores preferem tirar capital dessas praças e buscar segurança em outros mercados, como o americano.

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