Pela primeira vez na história, o MIT escolheu um brasileiro para encabeçar a lista de jovens mais inovadores do mundo. A categoria empreendedorismo é liderada pelo mineiro Tallis Gomes, mais conhecido por ter fundado a startup Easy (antiga Easy Taxi). Em conversa com a Gazeta do Povo, Tallis falou sobre sua grande paixão: a inovação disruptiva.
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Tallis vê a inovação como uma ferramenta para mudar — e melhorar — o mundo. Por isso tomou a decisão de seguir no Brasil, depois de vender a Easy e ter se gabaritado como CEO (sob seu comando, a Easy chegou a 35 países).
Sua experiência com mobilidade pesou para a escolha do MIT. Mas decisivo, mesmo, foi o que Tallis fez depois da venda: a fundação da Singu, espécie de “Uber do salão de beleza”.
Mais do que conectar profissionais da beleza e estética a clientes, por meio de uma plataforma tecnológica, Tallis quer criar, com o Singu, um “mecanismo meritocrático de ascensão social”.
Na conversa, Tallis falou um pouco sobre os desafios e a expansão da Singu, que atualmente está em na cidade de São Paulo, no Alphaville (Barueri), no ABCD paulista e no Rio de Janeiro. Além de falar sobre os obstáculos para inovação no Brasil.
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Confira a entrevista completa:
Você encabeça a lista do MIT de jovens mais inovadores do mundo, na categoria empreendedorismo. O que você considera como inovação?
Há dois tipos de inovação. A incremental, em que você melhora algo que já existe; e a disruptiva, aquele em que você cria algo novo, totalmente do zero; algo que “disrupt” o mercado, mude os parâmetros. Eu sou um cara focado em inovação disruptiva, em geral com base tecnológica. É o que a gente fez com a Easy e está fazendo, agora, com a Singu.
E como eu sou libertário, eu penso em criar inovações com base em um propósito de empoderar as pessoas e que elas possam caminhar com as próprias pernas, sem depender do Estado. Isto é inovação. É criar algo diferente, novo. O difícil, e o que a gente vê pouco no Brasil, são essas inovações disruptivas.
Você é um grande crítico das amarras burocráticas que o Brasil impõe ao empreendedorismo e à inovação. Não pensou em empreender lá fora, quando vendeu a Easy?
Naquele momento, eu pensei o que eu poderia fazer que me deixaria mais feliz. E [isso] seria continuar no meu país e criar um negócio que pudesse tirar as pessoas da pobreza. Eu decidi criar a Singu como um mecanismo meritocrático de ascensão social. [Há na plataforma] pessoas que ganham R$ 5 mil, R$ 6 mil por mês como manicures. Hoje você tem engenheiro formado que não ganha esse tanto. Eu sou muito agraciado por isso.
E eu não posso sair do país porque sou um idealista. Eu realmente acho que a minha geração, a geração Y, tem a chance de virar a chave para que a próxima geração, a dos meus filhos, possa criar um futuro novo. Eu não seria feliz me aposentando, trabalhando para alguém ou morando em Nova York e vendo meu país ir para o buraco.
A Singu tenta levar tecnologia a um mercado bilionário, que é o da beleza. Mas que ainda é muito offline. Ainda mais no setor que vocês atuam, que é o trabalhador autônomo, na ponta. Como é este desafio?
A Singu pega os profissionais dos próprios salões. Só que o salão explora estes profissionais, eles cobram até 70% [do ganho do profissional], e eu inverti este jogo [a Singu retém 30% do valor cobrado]. Você pode ser o melhor profissional do mundo, se você está na favela ninguém vai ir atrás. Tem de estar no shopping. E aí se cria uma barreira de entrada natural: excelentes profisisonais que nunca vão ter dinheiro, nunca vão ascender. Mesmo o que consegue ascender, se não tiver um sócio administrador para cuidar do fluxo de caixa, vai quebrar.
A minha mãe é cabeleireira, e eu vi ela quebrar algumas vezes por não ter como gerir o salão. No Singu, o profissional ganha três vezes mais do que no salão. Ele ganha mais dinheiro. E o usuário consegue utilizar o serviço, pagar mais barato, e é atendido na sua casa, no seu trabalho. É vantajoso.
Quantos usuários você tem hoje na plataforma?
Mais de 100 mil. E milhares de profissionais.
A Singu começou atuando em um número reduzido de cidades (o que é uma prática comum das startups). Como vai ser a estratégia de expansão?
O plano de expansão é estar nas cidades em que faz sentido. São Paulo hoje é um terço do mercado, e estamos focados em dominar completamente por lá, sem dar espaço para concorrentes. Depois, pensamos em internacionalizar.
Você teve uma boa experiência com internacionalização na Easy.
Sim, chegamos a 35 países.
Como está o faturamento, o crescimento da Singu?
A gente vai fechar 2017 sete vezes maior do que o ano passado. E faturar alguns milhões.
Do que o Brasil precisa para ser um país que se destaca no ramo da inovação?
[Há alguns anos] A gente começou a entrar num cenário em que o Brasil estava com juros mais baixos, começou a decolar. Os fundos de investimento olhando para o país, o fluxo de capital aumentando. Depois veio a reeleição da Dilma e o fluxo de dólar se inverteu. [O país] Passou a ter 14% de juros, no ano passado.
É muito simples saber o que precisa fazer para que o Brasil saia deste buraco. A gente precisa acabar com escândalos de corrupção. (...) Não existe licitação que não vai ser fraudada. E a única forma de acabar com isso é acabar com o Estado controlando empresas.
Veja o que aconteceu com a Petrobras: destruíram uma empresa que valia várias centenas de milhões. (...) Então, para o Brasil começar a ascender economicamente, a gente precisa do Estado atuando menos e deixando para o setor privado [fazer o que é preciso], que inclusive faz mais barato. Nada do que o Estado faz fica bom para a população mais carente.
Hoje, o Brasil tem 5,7% de juros real, se descontar a inflação. Nenhum país do mundo tem isso. Significa que ganhar dinheiro aqui é muito fácil. O rico só deixa o dinheiro dele em título da dívida pública e ganha 5%. Por que ele vai investir em inovação? Em startup? Para isso [acontecer] teria que ser como nos Estados Unidos. Lá é 1% de juros. Se ele não investe em inovação, o dinheiro dele não gira. A única forma de acabar com a cultura do rentismo é tirando o Estado da economia.
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Por fim, como você se sentiu ao ser indicado um dos jovens mais inovadores do mundo, pelo MIT?
É uma lista que já teve Larry Page, Mark Zuckerberg. E é a primeira vez que um brasileiro encabeça a lista. Eu sou número um no empreendedorismo. E muita gente me pergunta o que eu faço para inovar no meu negócio. V
eja que nos próximos dez anos, 40% das maiores empresas do mundo desaparecerão, a gente vai ter uma mudança muito significativa no mundo na próxima década. E o que o empreendedor deve fazer para ser disruptivo? Eu escrevi o “Nada Easy”, que é um best seller da área de negócios, em que falo exatamente o passo a passo sobre como criar um processo de inovação disruptiva. É uma boa dica para outros empreendedores.