O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse no início da tarde desta sexta-feira (22), por telefone, ao primeiro-ministro britânico Tony Blair, que considera "desproporcional" a proposta dos países desenvolvidos para liberalização do comércio mundial e afirmou que, como se esgotaram as negociações técnicas, é preciso apelar para a vontade política.
Lula disse que Estados Unidos e União Européia desconsideraram o principio do desenvolvimento da rodada de Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC), na proposta apresentada a Brasil e Índia, em reunião no começo da semana na Alemanha. O telefonema entre os dois ocorreu por volta das 12h40 e teve duração de 20 minutos.
"O presidente Lula observou que os países desenvolvidos buscaram acomodar seus próprios interesses defensivos em agricultura e ao mesmo tempo pedir contribuição desproporcional dos países em desenvolvimento no que diz respeito aos bens industriais. Foi desconsiderado o princípio central da rodada que é o desenvolvimento", disse o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach.
Redução de tarifas
O primeiro-ministro britânico reafirmou a proposta de reduzir as tarifas impostas a bens industrializados em 60%. Isso diminuiria a alíquota máxima de 35% para 12,7% - algumas exceções à regra permitiram a cobrança de uma "tarifa média", de 23,9%, a ser imposta pelos países pobres aos países industrializados. "Ele (Blair) entende que as próximas 48 horas serão decisivas para o processo e disse contar com a liderança do presidente Lula para salvar as negociações", relatou Baumbach.
Lula voltou a rejeitar a proposta e disse que o Brasil aceitaria negociar uma redução de 50%, o que diminuiria a tarifa máxima para 14,6%. No entanto, como alguns produtos poderiam ser excluídos da nova tarifação, o percentual médio seria de 24,8%.
Ajuste de expectativas
O presidente considerou que houve falta de ambição dos desenvolvidos. "Para um pacote agrícola modesto, (eles) pediam que os países em desenvolvimento fizessem cortes desproporcionais no que dizia respeito aos produtos industrializados. O corte médio para nós seria de 60% enquanto eles cortariam em menos de 25%", disse o porta-voz, relatando a conversa entre Lula e Blair.
Como o presidente Lula não vê mais saída técnica para a rodada de Doha, disse a Blair que resta apelar à vontade política dos países negociadores. "O presidente declarou-se disposto a reunir-se com outros chefes de governo na busca de uma solução política para o impasse. A disposição do presidente Lula é total para o diálogo, mas as propostas dos países desenvolvidos terão de ser melhoradas e suas expectativas ajustadas", reiterou o porta-voz.
Entenda a Rodada de Doha
A Rodada de Doha, da OMC, foi iniciada em 2001 e tinha o objetivo de concretizar a liberalização do comércio mundial em diversos setores - agricultura, indústria e serviços, por exemplo. Entretanto, desde 2003 criou-se um impasse entre os diferentes grupos de países - os desenvolvidos e os em desenvolvimento.
Depois do fracasso da rodada de negociações em Cancún, em 2003, o Brasil passou a ser visto como uma espécie de líder das nações em desenvolvimento no comércio mundial. O país vem, desde então, cobrando a redução dos subsídios agrícolas na União Européia e nos Estados Unidos. As nações desenvolvidas, porém, cobravam do Brasil mais abertura na área industrial.
A Rodada de Doha deveria ter sido encerrada no fim de 2004, mas foi sendo adiada por conta da falta de acordo. Em julho de 2006, foi abandonada. Nos últimos meses, diferentes países mostraram interesse em retomá-la, mas a reunião desta quinta-feira (21) voltou a mostrar que as diferenças ainda não foram superadas.
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