O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteve em Araucária, na região metropolitana de Curitiba, nesta quinta-feira (15) para uma cerimônia alusiva à reativação da fábrica de fertilizantes Araucária Nitrogenados S/A (Ansa), unidade da Petrobras que está inoperante há quatro anos. Lula também anunciou investimentos na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), ao lado da Ansa.
O evento marca uma mudança drástica na estratégia da companhia, que há alguns anos deu início a um processo de redução de seu portifólio, de modo a concentrar sua atuação na exploração e produção de petróleo e gás natural.
Depois de se desfazer das participações que mantinha, entre outras, na BR Distribuidora e na Liquigaz, em 2019 a estatal firmou um acordo para vender oito de suas 12 refinarias. No ano seguinte, a Ansa foi colocada em “hibernação”, etapa que antecede um eventual fechamento.
Ao todo, foram anunciados investimentos da ordem de R$ 870 milhões para a retomada da fábrica de fertilizantes, além de R$ 3,2 bilhões para a expansão da Repar.
Ao destacar os números nesta quinta-feira, a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, no cargo há cerca de três meses, classificou o evento como “o início do cumprimento da missão que o presidente Lula me endereçou”.
Em seu discurso, o chefe do Executivo defendeu a atuação mais ampla da estatal, inclusive na indústria naval. “A Petrobras não é uma indústria de petróleo, é uma indústria de desenvolvimento nesse país, de inovação nesse país”, disse.
Ele aproveitou para fazer críticas ao modelo de gestão adotado pela empresa durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), entre 2019 e 2022. “A gente teve um período em que o Brasil não era governado. Era como se fosse uma nau à deriva”, comparou.
“Não foi só essa empresa que foi fechada, não. Nós estávamos com 15% para terminar uma empresa em Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, simplesmente eles pararam. Simplesmente eles pararam a Refinaria Abreu e Lima durante tanto tempo. O complexo petroquímico que a gente ia fazer em Itaboraí, no Rio de Janeiro, pararam tudo. Pararam a tentativa de fazer a refinaria no Ceará. Pararam a tentativa de fazer a refinaria no Maranhão. Por quê? Porque eles não pensam no Brasil”, atacou.
Parte dos empreendimentos citados por Lula foi suspensa ou cancelada durante a gestão de Dilma Rousseff (PT), que o sucedeu na Presidência da República. A construção da fábrica de Três Lagoas (MS) foi interrompida no fim de 2014. Os projetos das refinarias Premium I e II foram cancelados no início de 2015, mesmo ano em que a Petrobras interrompeu a construção do Comperj, em Itaboraí, depois rebatizado de GasLub. A Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, está em operação e receberá novos investimentos, anunciados por Lula no começo deste ano. Todos os empreendimentos causaram perdas bilionárias à Petrobras.
Embora alguns petistas atribuam as paralisações e cancelamentos às dificuldades de financiamento provocadas pelas revelações da Operação Lava Jato, desencadeada em março de 2014, a própria empresa e o governo citaram na época razões econômicas para a desistência.
Lula improvisa discurso e se emociona ao falar de prisão
O presidente, que preferiu improvisar seu discurso nesta quinta-feira, deixando de lado um texto previamente preparado, ainda se emocionou ao falar sobre o período que esteve preso em Curitiba, na sede da Polícia Federal.
Em uma cerimônia que contou com a presença de representantes de diversos sindicados e movimentos sociais, ele agradeceu a vigília feita por apoiadores durante os 580 dias que ficou preso na capital paranaense.
Relatou ainda ter “ficado deprimido” e ter chorado em sua cela ao saber que funcionários da Petrobras eram hostilizados e chamados de “ladrão” em razão das denúncias de corrupção apuradas pela força-tarefa da Lava Jato em contratos da empresa.
Fábrica de fertilizantes deve retomar atividades só em 2025
Prestes a voltar às operações, a Ansa tem capacidade de produção de 720 mil toneladas/ano de ureia, o que corresponde a 8% do mercado do produto; 475 mil toneladas/ano de amônia; e 450 mil m³/ano do chamado Agente Redutor Líquido Automotivo (Arla 32).
No início de julho, 215 ex-funcionários da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen, como era conhecida a Ansa), principalmente técnicos especializados no funcionamento da planta industrial, foram recontratados e voltaram a seus postos de trabalho. A intenção é que a unidade volte à operação no segundo semestre de 2025.
Segundo o governo, serão realizados imediatamente procedimentos necessários à retomada, incluindo a publicação de editais para contratação de serviços de manutenção e de materiais críticos. O procedimento deve contar com exigência mínima de 85% de conteúdo local.
Após finalizada essa etapa, será realizada a mobilização dos contratos de serviços e manutenção dos equipamentos para o início das atividades. A estratégia, segundo o governo, é “reconfigurar e consolidar operações viáveis em ativos que já pertencem à companhia”.
Ainda de acordo com o governo, para a intervenção para o retorno operacional, serão contratados cerca de 2 mil trabalhadores, entre empregados da Fafen e das empresas contratadas. Após a retomada dos trabalhos, devem ser mantidos 700 empregos diretos.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que a reativação da unidade ajudará a reduzir a dependência do Brasil de fertilizantes importados.
A decisão de colocar em hibernação a Ansa em 2020, no entanto, foi tomada em razão dos resultados negativos recorrentes que pesavam no balanço da Petrobras.
A própria empresa explicou, na época, que a matéria-prima usada pela fábrica (resíduo asfáltico) era mais cara do que os produtos finais. “A Ansa é a única fábrica de fertilizantes do país que opera com esse tipo de matéria-prima”, declarou a estatal em um comunicado, na ocasião.
A decisão da Petrobras foi de que a planta permaneceria “em condições que garantam total segurança operacional e ambiental, além da integridade dos equipamentos”. Nisso, quase mil postos de trabalho, entre empregos diretos e indiretos, foram fechados.
Antes de optar pelo fechamento da fábrica, a empresa tentou vender a fábrica a uma companhia russa que demonstrou interesse na aquisição da planta, mas o negócio acabou não sendo concretizado.
Em um relatório de revisão de informações contábeis intermediárias elaborado pela KPMG, o diagnóstico era de que a fábrica vinha “apresentando perdas recorrentes em suas operações, devido a paradas não programadas, gerando deficiência de geração de caixa, a qual vem sendo suprida pelo suporte financeiro dos seus acionistas”.
Já um relatório do BTG Pactual mostrou que de 2015 a 2021 a Ansa acumulou prejuízo líquido de US$ 320 milhões.
Unidade já foi privatizada, reestatizada e colocada em “hibernação” após prejuízos recorrentes
A Ansa foi criada em 1982, durante o regime militar. Conhecida na época como Ultrafértil, fazia parte de uma divisão de fertilizantes da Petrobras e que contava ainda com unidades na Bahia e Sergipe.
Em 1990, durante o governo de Fernando Collor de Mello, a empresa entrou no Programa Nacional de Desestatização (PND). Três anos mais tarde, já na gestão de Itamar Franco, acabou vendida para a multinacional Bunge. Em 2010, a planta voltou a ser negociada e foi comprada pela Vale Fertilizantes.
Em 2013, no governo de Dilma Rousseff (PT), em uma operação de troca de ativos entre a Petrobras e a Vale, a Fafen, também chamada de Araucária Nitrogenados S/A (Ansa), foi reincorporada à estatal petrolífera.
Na época, a então presidente da Petrobras, Graça Foster, afirmou que a fábrica “nunca deveria ter saído” das mãos da empresa, “porque tem toda uma sinergia com o nosso sistema”.
Um total de US$ 234 milhões foram desembolsados pela Petrobras para adquirir a unidade, e o plano era investir US$ 144 milhões até 2017 – o equivalente, em valores da época, a R$ 300 milhões, divididos em quatro anos.
Com o passar do tempo, no entanto, a fábrica só deu prejuízos à Petrobras. Após tentativas infrutíferas de vender a subsidiária, em 2020, já na gestão de Jair Bolsonaro (PL), a estatal decidiu colocar a Fafen em “hibernação”.
Lula anuncia R$ 3,2 bilhões em investimentos na Repar
No mesmo evento, Lula anunciou investimentos da ordem de R$ 3,2 bilhões da Petrobras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar). A unidade também esteve no plano de desestatizações da companhia, mas acabou retirada após o início do governo do petista, em uma mudança de estratégia da petrolífera.
Entre as medidas que serão contempladas com o valor, está a implantação de uma nova unidade de hidrotratamento de médios (HDT), voltado a aumentar a produção de diesel S10, além de projetos de melhoria de eficiência energética.
A unidade atende cerca de 15% da produção nacional de derivados de petróleo e 85% do abastecimento vai para os estados do Paraná, Santa Catarina, sul de São Paulo e do Mato Grosso do Sul.
Governo promete reforma, mas evita falar em corte de gastos com servidores
Boicote do Carrefour gera reação do Congresso e frustra expectativas para acordo Mercosul-UE
“Vamos falar quando tudo acabar” diz Tomás Paiva sobre operação “Contragolpe”
Brasil tem portas fechadas em comissão da OEA para denunciar abusos do STF
Reforma tributária promete simplificar impostos, mas Congresso tem nós a desatar
Índia cresce mais que a China: será a nova locomotiva do mundo?
Lula quer resgatar velha Petrobras para tocar projetos de interesse do governo
O que esperar do futuro da Petrobras nas mãos da nova presidente; ouça o podcast