Ao longo da guerra comercial, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, alegou com frequência que o conflito forçaria empresas a retirar sua produção da China e transferi-la para os EUA. Depois de mais de um ano, ele se provou 'meio-certo'.
Mais de 50 corporações multinacionais anunciaram planos de mudar a produção para fora da China, ou estão considerando fazê-lo, de acordo com reportagem do Nikkei Asian Review. Apple, Google, Nintendo e Dell, entre outros, tentam evitar as penalidades de importação de US$ 250 bilhões de produtos chineses. Mas, em vez de mover suas operações para os EUA, como Trump afirmou, muitas dessas empresas estão planejando reconstruir suas cadeias de fornecimento no fora de solo americano, principalmente no sudeste da Ásia.
A Nintendo, gigante japonesa do videogame, desviou a produção de seu popular console Switch da China para o Vietnã, segundo reportagem do Wall Street Journal. O Google mudou para Taiwan e Malásia a fabricação de suas placas mãe Cloud e alguns produtos domésticos inteligentes da Nest. A Hewlett-Packard e a Dell planejam transferir parte de suas produções de computadores pessoais para o sudeste da Ásia.
Uma pesquisa realizada em julho pelo QIMA, auditor de controle de qualidade e cadeia de suprimentos, mostrou que a demanda por inspeções de empresas americanas caiu 13% no primeiro semestre de 2019. No mesmo período, a demanda geral por inspeções no sul da Ásia aumentou 34%.
A Apple avalia o custo de transferir de 15 a 30% de sua produção para fora da China, que também é o maior mercado internacional da empresa, onde ancorou sua indústria nos últimos 20 anos. Um executivo da empresa disse ao Nikkei que os riscos de montagem na China farão com que a Apple deixe o país, independentemente da costura de um acordo comercial. "Uma baixa taxa de natalidade, custos trabalhistas mais altos e o risco de centralizar excessivamente a produção em apenas um país. Esses fatores adversos não nos levam a lugar algum", disse o executivo ao periódico japonês Nikkei.
A Foxconn, que monta iPhones, iPads e Macs e é uma das maiores empresas de fabricação terceirizada do mundo, disse no mês passado que ainda pode atender à demanda dos consumidores americanos com sua atual capacidade de produção fora da China. Como pretende mudar a produção, a Apple está voltada para o sudeste da Ásia, com a Índia e o Vietnã aparecendo como os principais candidatos a produzir o iPhone. A companhia disse que em breve começará a produção experimental de AirPods no Vietnã, um precursor para a produção em massa.
China reage
Como a movimentação afeta os negócios e a produção, a China procurou atrair novas empresas. O governo reduziu restrições ao investimento estrangeiro em setores-chave, como petróleo, agricultura, mineração e manufatura, anunciou a agência estatal de planejamento no mês passado. As alterações entram em vigor em 30 de julho.
O êxodo das empresas americanas, juntamente com outras feridas da guerra comercial, afetou a economia chinesa. Esta semana, as autoridades chinesas anunciaram que o crescimento atingiu o menor nível em 27 anos. "As condições econômicas ainda são severas, tanto em casa quanto no exterior, o crescimento econômico global está diminuindo, as instabilidades e incertezas externas estão aumentando", disse Mao Shengyong, porta-voz do Departamento Nacional de Estatísticas da China, em entrevista coletiva. "O desenvolvimento desequilibrado e inadequado em casa ainda é agudo e a economia está sob nova pressão".
No Twitter, Trump comentou a desaceleração chinesa, divulgando-a como evidência da eficácia de sua guerra comercial. "o crescimento do segundo trimestre da China é o mais lento em mais de 27 anos. As tarifas dos Estados Unidos têm um efeito importante sobre as empresas que querem deixar a China para países não tarifários. Milhares de empresas estão saindo. É por isso que a China quer fazer um acordo..." "...com os EUA, e gostaria de não ter quebrado o acordo original. No meio tempo, estamos recebendo bilhões de dólares em tarifas da China, possivelmente com muito mais por vir. Essas tarifas são pagas pela China, não pelo contribuinte dos EUA!", escreveu Trump.
"As tarifas dos Estados Unidos estão tendo um grande efeito sobre as empresas que querem trocar a China por países não-tarifados", disse Trump no início da semana. "Milhares de empresas estão saindo. É por isso que a China quer fazer um acordo com os EUA".
Efeitos da guerra sino-americana
Embora Trump tenha alegado repetidamente que os países nos quais ele impõe tarifas arcam com seus custos, especialistas afirmam que a realidade é que as contribuições são pagas pelas empresas dos EUA, que absorvem o que podem ou repassam o custo para os consumidores. Um estudo recente calculou que as tarifas de 25% impostas à China custariam ao lar americano médio mais de US$ 800 por ano, de acordo com um post no blog do Federal Reserve Bank de Nova Iorque.
Da mesma forma, apesar de Trump afirmar que o conflito está mais amplamente prejudicando a China, especialistas afirmam que a guerra comercial afeta a economia dos EUA e possivelmente alimenta uma desaceleração global. O presidente da FED, Jerome H. Powell, apontou os ventos da guerra comercial como a principal razão pela qual o banco central poderia cortar as taxas de juros mais adiante neste mês. Em janeiro, o Fórum Econômico Mundial previu que a guerra comercial poderia reduzir o PIB global em 0,7 pontos percentuais, para 2,8 por cento em 2019. E, em uma nota recente, o economista-chefe do Morgan Stanley alertou que a guerra comercial poderia provocar uma recessão global dentro de um ano.
Na Cúpula do Grupo dos 20, no Japão, no mês passado, a China e os EUA concordaram em retomar as negociações comerciais e evitar a implementação de mais tarifas. O secretário do Tesouro, Steven Mnuchin, disse recentemente à CNBC que ele e Robert E. Lighthizer, representante comercial dos EUA, falariam com autoridades chinesas, mas que muitas "questões complicadas" permanecem.
Desde que retornou da China para os EUA, Trump expressou frustração com o fato de os líderes chineses não terem cumprido o que ele entendera como promessas da compra de mais produtos agrícolas dos EUA, e disse que ressuscitará sua ameaça de impor novas tarifas se não estiver satisfeito.
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