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História

Mantega foi mentor econômico de Lula e deu pontapé à maior recessão da história

Lula com Mantega, seu mentor econômico: parceria desde 1992. | es/pa/RICARDO STUCKERT
Lula com Mantega, seu mentor econômico: parceria desde 1992. (Foto: es/pa/RICARDO STUCKERT)

O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, investigado pela Operação Arquivo X, é ligado ao PT desde os anos 80, quando entrou de maneira secundária em debates para a formação do partido. Sem participar ativamente da vida partidária, só começou a aparecer como uma voz do PT para a área econômica nos anos 90, quando trabalhou na prefeitura de São Paulo, no governo de Luiza Erundina. Em 1992, no fim do governo, ele foi chamado por Lula para assessorá-lo em questões econômicas.

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Mantega foi uma peça importante na eleição de Lula em 2002. Era a figura destacada para discutir economia em entrevistas de TV e em jornais. Naquele momento, o Brasil atravessava uma forte crise de confiança por causa da incerteza eleitoral. A ascensão de Lula nas pesquisas era acompanhada pela alta do dólar e previsões catastróficas a respeito da transição para um governo não alinhado com o então presidente Fernando Henrique Cardoso.

O país precisou fechar um acordo com o FMI, no qual se comprometia a manter um superávit primário acima de 3% ao ano para equilibrar as contas públicas, em troca de uma linha de crédito bilionária. Mantega concordou na época com a manutenção dos termos do acordo. Ele foi também um dos autores da Carta ao Povo Brasileiro, documento divulgado pela campanha de Lula para acalmar os mercados.

Após a eleição, Mantega enfrentou a frustração de não ser o escolhido para o Ministério da Fazenda. O cargo ficou com o articulador da transição para o governo Lula, Antônio Palocci, que apresentou um discurso moderado e bancou a indicação de Henrique Meirelles (na época um deputado federal eleito pelo PSDB) para o Banco Central. Mantega teve de esperar três anos e o escândalo da quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, que derrubou Palocci, para iniciar sua carreira na Fazenda – a mais longa entre todos os ministros que passaram por lá.

Convicções e escorregões

A linha econômica de Mantega é a chamada “desenvolvimentista”. Sua aprovação aos termos do FMI em 2002 foi antes uma concessão necessária em um momento de instabilidade do que uma convicção. Em uma entrevista, ele lembrou que sua aproximação com o PT foi porque estava mais à esquerda do que a turma de FHC, no tempo em que ambos trabalhavam no Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Apesar da escolha ideológica, o ex-ministro ficou fora da luta armada durante a ditadura – ele optou por entrar no Partido Operário Comunista (POC), um grupo que fez oposição sem partir para a guerrilha.

Em 2002, antes de aceitar o acordo com o Fundo, Mantega expressou em diversas entrevistas sua visão sobre o melhor caminho para a economia. Os juros precisariam ser reduzidos, o que aliviaria a dívida pública e, por conseguinte, a necessidade de superávit primário. Seria a chave para a retomada do crescimento, com muito investimento público. Com Palocci, o PT fez o contrário. Apertou os juros, subiu o superávit e esperou o ajuste fiscal abrir espaço para juros melhores, mas nunca muito baixos. A meta de inflação foi retomada.

Entre 2003 e 2006, Mantega passou pela presidência do BNDES e pelo Ministério do Planejamento, até chegar à Fazenda em 2006. Foi só a partir de 2008, porém, que começou a colocar em prática suas convicções. Primeiro, defendeu a criação do PAC, o programa para investimentos públicos. Depois, com a crise internacional, viu a chance de dar uma nova missão ao BNDES e ao Tesouro. Comprou briga com Henrique Meirelles, que quase foi derrubado do cargo no auge dos efeitos da crise, no início de 2009.

O desenvolvimentismo na economia passou a ser a política de longo prazo do governo na virada de 2010 para 2011, com a eleição de Dilma Rousseff. O sucesso na superação dos efeitos da crise internacional validou as ideias de Mantega e a troca de Meirelles por Alexandre Tombini no Banco Central. Acompanhado por Arno Augustin, seu secretário do Tesouro desde 2007, Mantega articulou as políticas anticíclicas que dominaram o cenário econômico de 2011 a 2014 e que culminaram nas pedaladas fiscais e na atual crise.

O aprofundamento das políticas anticíclicas seguiu a lógica de que o país poderia manter o ritmo do crescimento de 2010, quando a economia teve expansão de 7,5%. A fórmula foi a seguinte: juros artificialmente baixos, controles de preços de energia e combustíveis para evitar que a inflação estourasse a meta, R$ 500 bilhões em recursos do Tesouro injetados no mercado via BNDES (em empresas hoje encrencadas, como os negócios de Eike Batista e a Oi), criação de estímulos setoriais (como a desoneração da folha de pagamentos) e a contínua aposta no PAC como vetor do crescimento.

Esse conjunto de medidas não sustentou o crescimento e, ao mesmo tempo, corroeu as contas públicas. Depois de dez anos como ministro, Mantega entregou ao sucessor um país afundando na maior recessão da história (para registro, a atual recessão começou no segundo trimestre de 2014), com inflação controlada artificialmente e um buraco nas contas públicas que era maquiado com as pedaladas fiscais.

Mantega ficou tanto tempo no cargo pela combinação de sua capacidade de adaptação com a confiança depositada por Lula. Ele soube abandonar a parte mais controversa de sua crítica econômica – como a ideia de acabar com o programa que saneou o sistema bancário ou o calote da dívida externa – e dar uma roupagem “paz e amor” ao discurso do PT de 2002. O tempo mostrou que, no fundo, foi uma adaptação forçada. E, agora, a Lava Jato mostra que a confiança de Lula pode ter tido um preço.

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