O economista e ex-ministro Aloizio Mercadante (PT) tomou posse do cargo de presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), na manhã desta segunda (6), e apresentou como deve ser a atuação da instituição sob o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em linhas gerais, as novas políticas de financiamento vão focar nas micro, pequenas e médias empresas, incentivo ao empreendedorismo de negros e mulheres, infraestrutura para o desenvolvimento sustentável e fortalecimento da indústria nacional para exportação e competição internacional.
A cerimônia, realizada na sede do banco no Rio de Janeiro, teve a presença do próprio presidente Lula e da primeira-dama Rosângela Lula da Silva, do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), além de ministros como Marina Silva (Rede), Rui Costa (PT), Anielle Franco (PT), entre outras autoridades do governo e do setor privado.
Durante a apresentação das novas políticas do banco, Mercadante criticou as devoluções de recursos que o BNDES faz ao Tesouro Nacional, que somaram R$ 678 bilhões desde 2015 “sob a forma de pagamento de principal, juros, liquidação antecipada da dívida e dividendos”.
“Esse é um valor 54% maior que as transferências do Tesouro para o BNDES, de 2008 a 2014. Essa página precisa ser virada. Se quisermos ter futuro, precisaremos de um BNDES mais presente e atuante, e de uma relação de equilíbrio com o Tesouro Nacional”, disse.
Afirmou, ainda, que não pretende concorrer com a iniciativa privada, mas atuar em segmentos específicos e na construção de parcerias em que o BNDES pode contribuir para reduzir risco, abrir novos mercados, alongar prazos e elaborar bons projetos para os investimentos.
“Somente na infraestrutura, nosso hiato de investimentos é, hoje, de cerca de R$ 226 bilhões, ou seja, 2,6 % do PIB, ao ano. O investimento privado de infraestrutura, que foi, em 2022, de R$ 131 bilhões precisará ser alavancado fortemente com o suporte do BNDES”, completou.
Pouco depois, o presidente Lula discursou e afirmou que os desembolsos do banco para investimentos passaram de R$ 37 bilhões em 2002, quando assumiu a presidência, para R$ 168 bilhões ao fim da sua segunda gestão. E, em 2021, caiu para R$ 64 bilhões.
“Se o BNDES é um banco de desenvolvimento e a gente percebe que, quando ele investe, a economia cresce, e quando não investe, a economia não cresce, eu fico me perguntando como é que vamos fazer voltar os investimentos em obra de infraestrutura nesse país”, questionou.
Indústrias para exportação e apoio às MPMEs
Um dos principais focos de financiamento do BNDES será o de tornar as indústrias brasileiras mais competitivas para o mercado internacional, mas sem repetir políticas do passado, como a dos “campeões nacionais” que privilegiou apenas algumas empresas brasileiras. Durante os últimos anos do segundo governo Lula e o primeiro de Dilma, o banco injetou R$ 18 bilhões sem ter o retorno esperado.
Mercadante relembrou da trajetória do BNDES no financiamento da industrialização nacional para ir além da produção de commodities (alimentos e recursos minerais), e citou exemplos de empresas que ganharam escala, como a Embraer, que exporta aviões para todo o mundo.
“Para sermos competitivos, as empresas brasileiras precisam disputar esse mercado [internacional], ganhar escala, competitividade, eficiência. Essa é uma pauta fundamental para o futuro do BNDES, da indústria e do Brasil. Precisamos exportar, ganhar escala e se integrar às cadeias globais de valor”, disse reforçando que há uma “janela de oportunidades” para o Brasil no comércio exterior, em que o país precisa atuar em parceria com os países da América Latina e com países do “Sul Global”.
Apesar da intenção de fortalecer as indústrias brasileiras para a exportação de bens de alto valor agregado, Mercadante disse que o banco vai trabalhar também no desenvolvimento do setor produtivo nacional com as micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) “que são grandes geradoras de emprego e renda”, com foco na digitalização e modernização das operações.
O BNDES prevê destinar R$ 65 bilhões em recursos para estes negócios, que abrangem também as cooperativas, economia solidária, incentivo ao empreendedorismo de mulheres e negros, entre outros.
Sustentabilidade e infraestrutura na região amazônica
Outra linha que o BNDES prevê atuar fortemente é com o incentivo e financiamento da indústria de baixo carbono, inovação e sustentabilidade para o desenvolvimento e geração de emprego e renda na região amazônica. Mercadante enfatizou esse compromisso da instituição com a presença da ministra Marina Silva, do Meio Ambiente.
“Transitar para uma economia de baixo carbono, com empregos verdes e de baixa emissão é um imperativo que orientará a estratégia do Banco. Mas, precisamos fazer mais. Não existirá futuro sem preservar a Amazônia e outros biomas. Esta será a prioridade do BNDES do futuro”, disse.
Essa questão é alicerçada em três pilares, segundo o economista: reconstruir as condições para enfrentar o desmatamento através das operações de comando e controle; viabilizar projetos estruturais e com escala que gerem desenvolvimento sustentável e mantenham a floresta em pé, protegendo e atendendo de forma emergencial os mais vulneráveis, especialmente os Yanomami; e desenvolver a infraestrutura, a indústria limpa e a pesquisa científica, gerando novas oportunidades de emprego e renda para 28 milhões de habitantes da região.
Novas estratégias e trabalho conjunto com Caixa e BB
O novo presidente aproveitou a cerimônia para anunciar a criação da Comissão de Estudos Estratégicos, com a coordenação do economista André Lara Resende, que já presidiu o BNDES no passado integrou a equipe de transição de Lula, e pelo servidor José Roberto Afonso.
Também fazem parte da comissão o ex-presidente do Conselho Federal de Economia, Antônio Correia de Lacerda, a servidora Lavínia Barros de Castro, o ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, o ex-reitor da Universidade Federal de Viçosa e ex-ministro interino da educação Luiz Claudio Costa, e a Élida Graziane, procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo e especialista em orçamento público.
“Esta comissão irá abrir o debate e convidar mais especialistas, intelectuais, pesquisadores e lideranças, resgatando o papel do BNDES sobre políticas de desenvolvimento para o Brasil”, disse Mercadante ressaltando, ainda, que as novas estratégias do banco serão conduzidas em sinergia com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal.
“Caixa preta” do BNDES ficou no passado
Mercadante lembrou, ainda, que o BNDES e seus servidores passaram por “situações de extrema injustiça”, quando surgiram questionamentos sobre os financiamentos concedidos a empresas brasileiras que atuam em outros países. Na sequência, o presidente Lula afirmou que a auditoria internacional realizada no banco custou R$ 48 milhões sem revelar nenhuma irregularidade.
“O BNDES nunca deu dinheiro para ‘países amigos do governo’. O banco financiou o serviço de engenharia de empresas brasileiras em nada menos que 15 países da América Latina e do Caribe entre 1998 e 2017”, disse.
Apesar disso, Lula reconheceu que há alguns contratos em atraso, como os firmados para obras na Venezuela e Cuba. No entanto, ele afirma que são “cobertos por garantia”, mas que o saldo do banco ainda é positivo.
Lula aproveitou a posse de Mercadante para voltar a criticar o Banco Central por conta da alta taxa de juros que, segundo a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), não deve voltar a cair como o mercado financeiro projetava, para o começo do segundo semestre.
Segundo Lula, “não existe nenhuma justificativa para que a taxa de juros esteja, neste momento, a treze e meio por cento (sic). É só ver a carta [ata] do Copom [Comitê de Política Monetária do Banco Central] pra gente saber que é uma vergonha esse aumento de juros e a explicação que eles deram pra sociedade brasileira”, disse.
A taxa básica de juros está em 13,75% desde agosto do ano passado, sendo que há um ano era de 10,75% de acordo com o Banco Central. Lula também alfinetou os membros da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) presentes na cerimônia, de que era constantemente cobrado a cada aumento da Selic e que, desde o governo passado, não se pronunciam a cada elevação da taxa.
“Quando o Banco Central era dependente de mim, todo mundo reclamava. O único dia que a Fiesp falava era quando aumentava os juros. Agora não fala. No meu tempo, 10% era muito, e hoje treze e meio (sic) é pouco”, afirmou.
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