O ritmo de abertura de oportunidades de trabalho com carteira assinada está perdendo força. No ano passado, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged), foram criados 2,01 milhões de empregos formais, 29,5% menos do que no ano anterior. A freada deve ser mais forte em 2023: já há banco que preveja a geração de apenas 500 mil vagas com carteira ao longo do ano.
O principal responsável por esse cenário é a desaceleração da atividade econômica, iniciada ainda no segundo semestre do ano passado. Entre julho – o melhor momento de 2022 – e dezembro, o nível de atividade econômica no país caiu 2,5%, segundo o índice IBC-Br, calculado pelo Banco Central.
As expectativas do mercado para o Produto Interno Bruto (PIB) também refletem essa freada. Se para 2022 a projeção mediana indica alta de 3% (o dado oficial, do IBGE, sai na próxima quinta-feira), para 2023 o consenso de mercado aponta para crescimento econômico de 0,84%, apenas.
Essa perda de vigor é motivada pelo menor espaço fiscal para ampliação de gastos do governo, pelo nível elevado da taxa de juros e pela conjuntura mais adversa em termos globais – refletindo a piora das condições financeiras e a expectativa de redução dos preços das commodities.
Desaceleração ganhou força no último trimestre
O Bradesco aponta que o ritmo de contratações formais perdeu mais força no último trimestre de 2022. A tendência é de que esse cenário se repita neste ano.
A expectativa é de que o ritmo de criação líquida de postos de trabalho fique abaixo do observado entre 2021 e 2022, mas ainda em território positivo. O banco projeta a geração líquida de 500 mil postos de trabalho com carteira assinada.
A acomodação no mercado de trabalho também é prevista pela Tendências Consultoria. O analista Lucas Assis diz que o crescimento menos expressivo da economia brasileira deve reduzir o ímpeto das contratações.
O crescimento da população ocupada perdeu dinamismo nos últimos meses, principalmente entre os informais. O número de trabalhadores por conta própria caiu de 25,9 milhões, no trimestre móvel encerrado em agosto, para 25,5 milhões, em novembro. Situação similar aconteceu entre os trabalhadores auxiliares familiares. O número de ocupados caiu, nesse período, de 1,8 milhão para 1,6 milhão.
“Em meio ao esgotamento do impulso gerado pela normalização dos serviços presenciais, o nível da ocupação manteve-se em 57,4% no trimestre encerrado em novembro, inferior ao patamar vigente antes da crise do biênio 2015-16 (58,4% na média entre 2012-2014 para o mesmo trimestre), sugerindo certa ociosidade no mercado de trabalho”, diz Assis.
Cenários para a taxa de desemprego
A taxa de desemprego vem caindo desde fevereiro de 2022, quando estava em 11,2%, segundo a pesquisa Pnad Contínua, do IBGE. O último dado disponível, de novembro, mostra que ela caiu para 8,1%, o menor nível desde abril de 2015.
Mas as razões da queda mudaram. “Diferentemente do verificado ao longo do processo de retomada, iniciado em meados de 2021, sua queda recente não tem sido proporcionada pela expansão da ocupação, mas sim por uma retração da força de trabalho”, destaca Assis, da Tendências.
O índice de desemprego é medido a partir da força de trabalho, ou seja, do total de pessoas que estão trabalhando ou procurando ocupação. Se uma grande quantidade de pessoas desiste de procurar emprego, isso acaba reduzindo a força de trabalho – e, assim, a taxa de desemprego pode cair mesmo que não haja um aumento nas contratações.
Uma série de fatores pesa para a retração da força de trabalho, aponta o analista. Entre eles, a saída de pessoas mais velhas do mercado de trabalho e o desincentivo à busca de ocupação provocado por transferências de renda do governo.
Ele avalia que no curto prazo, mesmo diante da perda de dinamismo na ocupação, a taxa de desocupação ainda deve ter uma ligeira queda, beneficiada pelo desempenho modesto da força de trabalho. Mas, diante das projeções de desaceleração da atividade econômica até o fim do ano, a sinalização é de um aumento no desemprego.
“A geração de vagas no setor privado está desacelerando”, aponta a equipe de análise econômica do Itaú.
Segundo o Focus, a mediana das projeções para a taxa de desemprego ao fim de 2023 é de 8,7%, acima do ponto médio das previsões para dezembro de 2022 (8%) e do último dado apurado pelo IBGE, o já citado índice de 8,1% em novembro.
Onde estarão as vagas em 2023?
Menos oportunidades de trabalho com carteira assinada devem ser abertas em 2023, depois de dois anos seguidos com a criação líquida de mais de 2 milhões de empregos formais em cada ano.
Embora o saldo deva ser mais discreto neste ano, ele ainda será positivo e as contratações devem ser disseminadas entre as principais atividades econômicas. O destaque deve ser, novamente, o setor de serviços. A Tendências avalia que a expectativa é de manutenção do crescimento no volume prestado às famílias, um dos segmentos mais relevantes. Entre janeiro e novembro de 2022, a expansão foi de 8,5%, comparativamente ao ano anterior, aponta o IBGE.
“A expectativa é de manutenção do crescimento de serviços às famílias, captando tanto a elevação da renda do mercado de trabalho (embora limitada pelos primeiros sinais negativos da ocupação) e, do ponto de vista de classes, pelas famílias de maior renda, seja pelo desempenho positivo de seus rendimentos, seja pela possibilidade de uso das poupanças”, diz Assis, da Tendências.
A evolução de trabalho no setor industrial – que criou 252 mil oportunidades no ano passado, segundo o Novo Caged – deve permanecer limitada. Segundo o analista, a explicação está no baixo fôlego da produção de bens duráveis e de capital, devido ao cenário restritivo influenciado por juros altos e incertezas em relação à política econômica.
Outro fator que reforça a perda de dinamismo do setor industrial é a expectativa de um crescimento mais baixo da economia mundial. O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que o PIB mundial terá um incremento de 2,9% em 2023, após alta estimada de 3,4% em 2022.
O cenário relativamente positivo para o rendimento das famílias, em 2023, deve beneficiar o segmento de bens menos sensíveis a crédito, como é o caso de alimentos e bens não duráveis.
Um setor que deve registrar arrefecimento no mercado de trabalho formal é o da construção civil. Isto, segundo Assis, já aconteceu no mercado de autoconstrução e é esperado para os segmentos de médio e alto padrão.
Tendências para o mercado de trabalho nos próximos anos
Assis avalia que, nos próximos anos, a formalização do mercado de trabalho pode ser beneficiada pelos efeitos tardios da reforma trabalhista de 2017. Ele exemplifica mostrando que alguns resultados já foram coletados no ano passado, com a abertura líquida de 84,2 mil empregos na modalidade intermitente e outros 30,8 mil em regime parcial.
O cenário da consultoria para o novo governo contempla a não reversão das boas agendas encaminhadas desde 2016 no âmbito microeconômico.
“A avaliação é de que, embora existam riscos de retrocessos – como em temas de trabalho intermitente e terceirização –, há também elementos de contenção, dados pelos movimentos do mercado financeiro, institucionalidades criadas desde então e a própria heterogeneidade da base de apoio do governo”, diz.
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