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Apesar de não ser exatamente uma novidade, o mercado de carbono ainda é incipiente no Brasil. Previsto em importantes convenções internacionais, como o Protocolo de Quioto e o Acordo de Paris, dos quais o país é signatário, a coisa ainda não deslanchou por aqui, inclusive por falta de regulamentação desses artigos. Porém, o país decidiu entrar no mercado voluntário de carbono, com a expectativa de movimentar até R$ 5 bilhões por ano e melhorar a imagem no exterior.
Essas são as perspectivas que o secretário da Amazônia e Serviços Ambientais do Ministério do Meio Ambiente, Joaquim Álvaro Pereira Leite, têm para o Floresta + Carbono, uma modalidade do programa Floresta + que prevê a geração de créditos de carbono por meio da conservação e recuperação de áreas de mata nativa. “O foco sai de estudar quanto vale a árvore para quanto vale cuidar de árvore”, destaca o secretário, que conversou com a Gazeta do Povo por telefone.
Por convenção, foi estabelecido que uma tonelada de dióxido de carbono (CO²) equivale a um crédito de carbono, que pode ser negociado no mercado internacional e usado por empresas para compensar suas emissões.
A iniciativa do governo brasileiro, instituída em outubro, é totalmente focada no mercado voluntário e precede acordos bilaterais e o Acordo de Paris, que ainda carece de regulamentação sobre esse mercado, explica Leite.
“Ele é um mercado completamente livre e voluntário, gerado por uma demanda mundial de compromissos corporativos e individuais de compensar emissões”, diz. Ele frisa que, em alguns casos, evitar as emissões de carbono pode ser “fisicamente impossível” e “economicamente inviável”, por isso a instituição do mercado voluntário – também chamado de livre – é relevante.
Mercado voluntário de carbono tem potencial bilionário
A iniciativa do governo não é tão nova assim. Basicamente, quem preservar sua área de floresta nativa será remunerado por isso. “Baseado nesse serviço ambiental de aumentar e manter o estoque de carbono, você consegue emitir crédito de carbono no mercado voluntário e negociar isso voluntariamente, por manter e recuperar esse território”, explica Leite.
A expectativa do ministério é de que esse mercado voluntário movimente entre R$ 1 bilhão e R$ 5 bilhões anuais, que são repassados diretamente para quem protege floresta, sem intermediação. O valor é pouco, comparado ao potencial que esse setor pode movimentar – só em créditos oriundos de financiamento internacional de clima, o Brasil já tem reconhecidos US$ 38 bilhões para receber, dos quais US$ 6 bilhões para o Cerrado e US$ 32 bilhões para Amazônia.
A avaliação do secretário é de que historicamente o Brasil se posicionava contrário à participação da iniciativa privada no mercado voluntário de carbono, e é por isso que outros países estão à frente nesse mercado, sobretudo outras nações da América Latina e Ásia, que também têm áreas de floresta tropical.
Para Leite, já existe uma demanda importante de empresas do setor de petróleo, tecnologia e transporte por esse mercado, que ainda será impulsionado: “No pós-pandemia, o engajamento no tema meio ambiente e mudança no clima vai gerar uma demanda significativa para absorver os créditos voluntários”.
O governo também trabalha para lançar uma plataforma digital que criará o banco de dados do projeto para que, no futuro, seja possível harmonizar ou aderir a programas internacionais de redução de emissões, estes regulados. Atualmente, de acordo com o Ministério, já há iniciativas do Floresta + Carbono sendo desenvolvidas em todos os biomas.
Foco em preservação pode ajudar a melhorar imagem do Brasil no exterior
Entrar no mercado voluntário de carbono com o Floresta + Carbono seria, na avaliação do secretário, uma solução mais imediata, que poderá auxiliar quem não está cumprindo as metas definidas pelo Acordo de Paris, e que traz benefícios econômicos e para a imagem do Brasil no exterior.
“[O programa] tem a possibilidade de engajar setores da economia que queiram contribuir para a preservação de floresta em todo o território. Trouxemos segurança jurídica e credibilidade para que possa acontecer de forma transparente, pagando a quem protege floresta”, diz.
Para ele, a solução para esses problemas ambientais é econômica. “A partir do momento em que você tiver uma remuneração, um pagamento dos serviços ambientais de proteção, vamos criar uma nova economia verde”, diz, citando a possibilidade de criação de empregos, inclusive.
Questionado sobre o desgaste da imagem do país no exterior – sobretudo pelo avanço de casos de queimadas e desmatamento em vários biomas e declarações do presidente Jair Bolsonaro e outros integrantes do governo –, o secretário admitiu que a nova iniciativa terá “o benefício de melhorar a imagem do Brasil em relação a conservação florestal”.
Mas Leite logo mudou de assunto e emendou que o programa “poderá trazer a participação de empresas para atuar nesse tema”. Vale lembrar que o Brasil já sofre com a pressão de vários parceiros comerciais, que cobram melhores práticas e a preservação ambiental.