A nacionalização do setor de petróleo e gás na Bolívia, oficializada nesta terça-feira (1º) pelo presidente do país, Evo Morales, não afetará o Brasil no curto prazo, de acordo com o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau. O ministro diz que o ato de nacionalização previsto para a manhã desta quarta-feira (2) é tão somente a concretização dos decretos de estatização assinados por Morales em outubro de 2006 e com os quais a Petrobras já havia concordado.
Segundo ele, as negociações com a Bolívia agora estão focadas na questão do ressarcimento pela nacionalização das duas refinarias que a Petrobras tem no país. "A situação na Bolívia está normal, sem inquietação", frisou Rondeau.
Ele lembrou que o ministro boliviano dos Hidrocarbonetos, Carlos Villegas, está disposto a negociar o preço da transferência dos ativos da Petrobras para a Bolívia - o desacordo, até agora, reside no fato de os bolivianos estarem dispotos a pagar o preço contábil das refinarias, enquanto os brasileiros querem receber o valor de mercado.
Novas mudanças?
O ministro também afirmou que os executivos da Petrobras não têm indícios de que uma nova mudança de regras na participação de empresas estrangeiras no mercado de petróleo e gás da Bolívia esteja a caminho. "Não temos qualquer indicação de medida unilateral da Bolívia", ressalta. "No curto prazo, não há risco de desabastecimento de gás natural", afirma.
Haverá um desligamento simbólico das exportações de gás às 6h desta sexta-feira (horário de Brasília), informou a estatal boliviana YPFB, mas tanto membros do governo brasileiro quanto do governo boliviano afirmam que isso não afetará o abastecimento do produto nos países importadores.
O presidente Evo Morales anunciou as nacionalizações em discurso feito em praça pública - ele afirmou que, além do setor de petróleo e gás, as medidas também afetarão o setor de telefonia - com a nacionalização de uma companhia administrada pela Telecom Italia - e a criação de um banco de fomento no estilo do BNDES.
Entretanto, por conta de questões burocráticas, o presidente da YPFB, Guillermo Aruquipa, admitiu que nem todos os 44 contratos envolvendo empresas privadas puderam ser efetivados até o Dia do Trabalho. Três acordos que ainda não foram concretizados envolvem negociações com a Petrobras. O motivo, segundo a YPFB, seria um erro na formulação dos documentos.
Petrobras
A Petrobras negocia atualmente com a YPFB o preço do ressarcimento de duas refinarias que a Bolívia nacionalizou: os bolivianos querem pagar o valor contábil dos ativos, enquanto o lado brasileiro quer receber o valor de mercado.
Entretanto, a empresa não deve ser afetada diretamente pela nacionalização desta quarta-feira, uma vez que já concordou com a reestatização dos ativos de petróleo e gás na Bolívia no fim do ano passado. A nacionalização afetará multinacionais de outros países, como a espanhola Repsol-YPF, a francesa Total e a britânica British Gas.
O especialista em energia Adriano Pires, que acompanha de perto a questão Brasil-Bolívia, afirmou que as mudanças não atingem diretamente a Petrobras, pois estão inseridos dentro de um contexto já aceito pela empresa. Segundo Pires, a "instabilidade regulatória" boliviana continuará a existir, o que pode significar riscos de mudanças de regras sem aviso prévio.
Sem pressa
Embora o governo boliviano, por causa das comemorações do Dia do Trabalho, quisesse fechar o acordo com a Petrobras ainda nesta terça-feira, a Petrobras não está interessada em acelerar as negociações - até o presidente Lula inteveio para garantir que as negociações não fossem apressadas. O diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, afirmou em Nova York que não há uma data-limite para o fim das conversas com a Bolívia.
Ele disse também que a Petrobras pode inclusive continuar a operar as refinarias. "Há um interesse em manter a operação nos padrões que elas têm hoje", disse. O diretor informou ainda que nesta fase das conversas estão sendo definidas as formas de compensação pelos ativos da empresa brasileira. "Não estamos impondo nenhuma condição de pagamento. Estamos sendo bastante flexíveis", disse.
Cerveró disse ainda que, caso a Bolívia tomasse uma decisão unilateral, as negociações seriam interrompidas e o governo brasileiro poderia usar mecanismos de arbitragem para evitar prejuízos.