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Na noite desta terça-feira (14) chegava ao fim uma queda de braço que se alongou pelos últimos meses dentro do governo federal. No gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em Brasília, Jean Paul Prates foi demitido da presidência da Petrobras, a maior estatal brasileira.
A decisão sobre qual o lado que o presidente estava foi simbólica: o desligamento ocorreu na presença dos maiores desafetos de Prates, os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o da Casa Civil, Rui Costa - aqueles que pediram a cabeça dele nos últimos meses.
A decisão e a forma como ela foi conduzida são um retrato do rumo que o presidente quer para a estatal e reforçam a influência sobre Lula, principalmente de Silveira, o ministro "nacionalista", que defende ampliar os investimentos da Petrobras.
Silveira segue uma agenda populista, embora seus críticos digam que sem muito resultado para a transição energética. Sua visão está alinhada à de Lula em almejar uma "Petrobras maior". Ambos desejam agigantar a empresa e ampliar áreas que vinham sendo abandonadas, como a naval e de fertilizantes, além de implementar um olhar mais social, com a redução de preços dos combustíveis, o que, à primeira vista, seria benéfico para a população. Mas, na análise mais detalhada de economistas, a conta não fecha e pode evocar motivações eleitorais.
Faz tempo que ambos os ministros pediam a cadeira de Prates. Os motivos - aparentes - foram os preços dos combustíveis, a meta de produção de biodiesel, e a reinjeção de gás natural extraído de poços petrolíferos. A distribuição dos dividendos extraordinários aos acionistas no início de março ecoou como mais um ponto de atrito.
Enquanto Prates era a favor da distribuição de 50% dos recursos, os outros dois defenderam a retenção do montante para aumentar a capacidade de investimento da empresa. A posição de Prates culminou na perda de R$ 55,3 bilhões em valor de mercado no dia 8 de março.
O impasse sobre os dividendos só acabou no último dia 25, quando a companhia aprovou a distribuição de 50% dos dividendos extraordinários, o que corresponde a cerca de R$ 22 bilhões.
Mas nada disso é tão relevante quanto o fato de o governo querer expandir seu poder na maior empresa pública do país e investir em grandes obras, como construção naval e refinarias – inclusive a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, também conhecida como “a refinaria mais cara do mundo”, como atestou a Operação Lava Jato.
Depois da demissão na presença daqueles que pediram sua cabeça, Prates escreveu para colegas, segundo a colunista do jornal O Globo, Malu Gaspar: “Minha missão foi precocemente abreviada na presença regozijada de Alexandre Silveira e Rui Costa. Não creio que haja chance de reconsideração. Vão anunciar daqui a pouco”.
Oficialmente, a empresa informou por fato relevante, ainda na noite de terça, que Prates renunciaria à presidência e ao cargo de membro do Conselho de Administração da Petrobras. Nesta quarta-feira, confirmou a saída: “O Conselho de Administração da Petrobras aprovou o encerramento antecipado do mandato de Jean Paul Prates como Presidente da Petrobras de forma negociada. Com o encerramento de seu mandato como Presidente da Companhia, Jean Paul apresentou sua renúncia ao cargo de membro do Conselho de Administração da Petrobras”, diz o comunicado.
Decisão reforça influência e foco nacionalista na Petrobras
Embora tenha conseguido cumprir alguns dos desejos de Lula, como a mudança na política de dividendos e o fim da política de preço de paridade de importação (PPI), Prates era considerado por uma ala do governo petista como muito “pró-mercado”. Diante disso, o temor do mercado financeiro é de que a Petrobras passe a sofrer com interferências políticas da gestão Lula. E isso já resultou na queda de 8% nas ações da Petrobras na manhã de quarta na B3, a Bolsa de Valores.
Tecnicamente, o ex-CEO era bem-visto pelo mercado nacional e internacional. Mas, internamente, não estava atendendo às expectativas do governo, que quer investir em grandes obras, como a construção de navios e refinarias.
Por isso, entra em cena a engenheira Magda Chambriard. A substituta de Prates tem um perfil mais desenvolvimentista e alinhado com o atual governo.
Funcionária de carreira da Petrobras, por 22 anos, atuou como diretora-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP) no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Seu nome será analisado, mas sua aceitação já é dada como certa. Não só pela ligação ao partido do presidente, mas por ter trabalhado na Petrobras.
O processo de eleição demora entre 45 e 60 dias. Durante esse período, quem assume interinamente a presidência é a diretora de Assuntos Corporativos, Clarice Copetti.
Magda não era a primeira opção. O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante, foi cotado, mas recusou, assim como outros. A decisão final foi endossada pelo ex-presidente da Petrobras Sergio Gabrielli e por Dilma Rousseff, que atualmente é presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o "Banco dos Brics". Rui Costa e outros líderes baianos também fizeram campanha por Magda.
O desafio dela é conseguir conciliar o mercado - que está bastante receoso que a ingerência política do PT aumente -, especialmente dado ao seu histórico, com a visão desenvolvimentista.
Oito presidentes em oito anos: incerteza para investimentos
Para economistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o anúncio repentino da saíde de Prates traz incertezas para investimentos e aumenta a percepção de risco dos investidores.
A Federação Única dos Petroleiros (FUP), entidade sindical filiada à Central Única dos Trabalhadores (CUT), reforça a expectativa: “Esperamos que a nova presidente ajude a cumprir o programa do presidente Lula, enfrentando os desafios que há junto ao mercado e a uma parte da corporação da Petrobras, que joga contra a implementação desse programa que foi aprovado pela população nas urnas”, declarou Deyvid Bacelar, coordenador-geral da FUP, em comunicado.
Para o Instituto Acende Brasil, a indicação da nova presidente da estatal foi interpretada como uma imposição que embute “risco de interferência do governo e de potencial uso da estatal para objetivos politico-eleitorais que destruirão valor da empresa e, consequentemente, de seus acionistas”.
“A saída de Prates já reflete negativamente nas ações da empresa na B3 e na Bolsa de Nova York, indicando a preocupação dos analistas para o risco de intervenção política na operação da empresa”, disse a entidade por nota.
“A cadeira de presidente da Petrobras parece uma cadeira elétrica", escreveu Adriano Pires, sócio-diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) em sua coluna no jornal O Estado de S.Paulo, se referindo ao fato de Magda ser a oitava pessoa a assumir o cargo em oito anos.
Pires quase foi uma dessas oito pessoas. No governo anterior, ele foi convidado para a posição, mas não assumiu por conflito de interesses com sua empresa. Para ele, a privatização da Petrobras deve ser discutida, para que se possa fugir de interesses políticos na troca de comando da petrolífera.
Na tarde de terça-feira, antes da demissão do CEO da companhia, Pires disse em um evento que seria “um horror” se a Petrobras se preocupar mais com o aumento dos investimentos da companhia, inclusive em refinarias, do que com a exploração e produção de petróleo, seu principal negócio:
“Não vai dar certo. Vai ser um horror outra vez”, afirmou, segundo a Folha de S. Paulo, no Tag Summit 2024, evento com investidores em São Paulo. “O governo olha para esse modelo de economia mista e acha que a Petrobras é do governo de plantão. O presidente Lula só falta passar para o Imposto de Renda dele a Petrobras. Porque ele acha que é dele. O Bolsonaro também achava”, criticou.